Ted Cruz o candidato presidencial que venceu o caucus republicano no Iowa

Ted Cruz tem tanto de libertário como de conservador — e terá sido essa a razão da sua vitória inesperada no Iowa. Em 2013, ficou conhecido depois de ter discursado 21 horas contra o “Obamacare”.

 

 

Quando soube que venceu o caucus do Partido Republicano no Iowa com 27,6% dos votos — contrariando as sondagens, que o colocavam em segundo lugar, atrás de Donald Trump –, Ted Cruz subiu ao palco da sua sede de campanha naquele estado e começou a falar. Foi o discurso mais longo da noite: 32 minutos. E, lá para o meio, disse algumas palavras ao público que caracterizam, de uma penada, a sua candidatura e as suas ideias:

 

 

Sabem o que é que assusta o cartel de Washington? Assusta mesmo, não é pouco… Eu não os assusto nem um pouco. O que os assusta é esta antiga coligação de conservadores ao estilo de Reagan a unir-se novamente. Estamos a ver conservadores, evangelistas, libertários e democratas de Reagan, todos a juntarem-se num só. Isso aterroriza Washington D.C..”

 

 

Cada um daqueles epítetos caracteriza bem Cruz. Conservador, por ser contra o aborto, a favor da pena de morte, um opositor acérrimo do casamento entre casais do mesmo sexo. Evangelista, por ser um cristão fervoroso, defensor da reversão da separação do Estado e da Igreja, chegando a dizer aos seus apoiantes para se preparem para os tempos vindouros e “vestirem a armadura de Deus”. Libertário, porque é uma das caras do movimento Tea Party, que defende a todo o custo o Estado mínimo — o discurso de 21 horas que Cruz fez em 2013 no Senado contra o plano de saúde pública de Barack Obama tornou-o numa celebridade, com especial ênfase para a parte em que aproveitou para ler um livro infantil às filhas, que estariam a assistir ao discurso do pai em direto na televisão. E Reagan, o ex-Presidente que serve de bengala retórica à maioria dos republicanos que pretendem chegar à Casa Branca, e à qual este texano de 45 anos recorre frequentemente. É a um retrato do homem que liderou os EUA entre 1981 e 1989 que Cruz reserva a maior parede do seu escritório.

 

 

Existe, porém, outra referência ainda maior para o homem que venceu ocaucus republicano no Iowa: o seu pai, Rafael Cruz. Nascido em Cuba, o ancião fugiu aos 18 anos para os EUA depois de ter sido torturado pelo regime de Fulgencio Batista — mais tarde deposto pela revolução liderada por Fidel Castro, contra o qual acabou por formar uma aversão ainda maior, quando voltou a Cuba em 1959 durante um mês. Regressou aos EUA e a partir de então começou a embrenhar-se em movimentos conservadores e evangelistas, tornando-se pastor.

 

 

“Se perdermos as nossas liberdades aqui, para onde é que vamos?”

 

 

 

Pouco demorou até as afiliações do pai Rafael passarem para o filho Ted, conforme contou à revista New Yorker o chefe de família. “Começou tudo em 1980, quando o Ted tinha nove anos.” Nessa altura, Rafael Cruz estava envolvido com um grupo de cristãos que faziam campanha por Reagan, que mais tarde viria a derrotar Jimmy Carter, que se candidatava então a um segundo mandato. “Durante aquele ano, falávamos todas as noites sobre a importância de nos livramos daquele socialista-esquerdista Presidente Carter e de substituí-lo por um conservador constitucional, Ronald Reagan. Eu devo ter dito ao Ted uma dúzia de vezes: ‘Quando eu estava em Cuba e eles nos tiraram as liberdades, eu tinha um lugar para onde ir. Se perdermos as nossas liberdades aqui, para onde é que vamos?’.”

 

 

O passado do pai acabou por se tornar um tema recorrente de Ted Cruz para se referir ao presente. No tal discurso de 21 horas, em que se opôs ao programa de saúde pública ao qual os republicanos, pejorativamente, se referem como “Obamacare”, o então senador e agora candidato republicano deu graças a Deus pelo facto do pai não ter encontrado no seu percurso “um liberal cheio de boas intenções” quando chegou aos EUA:

 

 

Eu vejo isto de uma perspetiva pessoal, porque há 55 anos o meu pai veio de Cuba, tinha 18 anos, não tinha dinheiro e não sabia falar inglês (…). Graças a Deus que quando o meu pai era um imigrante adolescente no Texas, há 55 anos, que não veio um liberal cheio de boas intenções meter-lhe o braço por cima e dizer-lhe: ‘Deixa-me tomar conta de ti. Deixa-me dar-te um cheque com dinheiro do Governo. Deixa-me tornar-te dependente do Governo. Não te dês ao trabalho de ir lavar pratos. Não te dês ao trabalho de trabalhar.”

 

 

Ted Cruz estudou nas prestigiadas universidades de Princeton e de Harvard. Na primeira, fez parte da equipa de debate, onde tinha prestações ímpares, ao ponto de um antigo colega desses anos dizer que “o Ted era o melhor a debater em todo o país, sem dúvida”. Na segunda, especializou-se em direito constitucional, algo de que se faz valer diariamente — a maior parte das suas ideias são sustentadas por uma leitura literal da constituição.

 

 

Em 2000, aproximou-se ainda mais da política e foi conselheiro de George W. Bush para assuntos domésticos na campanha de 2000 — entretanto, o ex-Presidente, que tem feito campanha pelo seu irmão Jeb Bush, também candidato nestas eleições, desconsiderou Ted Cruz dizendo: “Simplesmente não gosto daquele tipo”.

 

 

O primeiro cargo de importância pública de Ted Cruz foi o de solicitador-geral do Estado do Texas (um cargo abaixo do de procurador-geral), o que o levou a vencer cinco em nove processos que levantou contra o Supremo Tribunal. Esteve nestas funções entre 2003 e 2008. Mais tarde, em 2013, foi eleito senador pelo Partido Republicano para o estado do Texas. Alguns meses depois, em setembro, viria a tornar-se uma cara incontornável do movimento Tea Party, com o já referido discurso contra o plano de saúde pública.

 

 

Ajoelhado perante Deus contra o casamento gay

 

 

Ted Cruz demonstrou habilidade ao conseguir trazer para si duas facetas do Partido Republicano: a libertária e a conservadora. Para a primeira, não é por acaso que confessa a sua falta de afeição a Washington D.C., capital e sede administrativa dos EUA. Uma vez, num discurso no Texas, disse aos presentes: “Passei a semana inteira em Washington D.C. e posso dizer que é ótimo estar de regresso à América”. A este discurso anti-Washington, Ted Cruz junta a sua postura conservadora. Aí, a oposição ao casamento homossexual é a bandeira que mais vezes levanta. Num discurso feito na sua pré-campanha (Cruz fez uma ronda do país antes de assumir que era candidato), Cruz apelou tanto ao conservadorismo como à religião dos presentes:

 

 

“Quero encorajar todos os homens e mulheres aqui presentes para rezarem. Se alguma vez houve um problema para o qual nos devemos ajoelhar perante Deus, é a preservação do casamento entre um homem e uma mulher. E isto é um problema para o qual vamos precisar de tantos guerreiros da oração quantos forem precisos para inverter esta maré.”

 

 

Foi esta doutrina libertária e conservadora que lhe garantiu a vitória no Iowa, um estado onde o eleitorado republicano tem uma particularidade: o número de libertários e de evangelistas é grande e bastante acima da média. A prova disso foram os resultados do caucus de 2012, no qual Ron Paul, o mais libertário dos candidatos republicanos de então, conseguiu 21,5% dos votos — bem acima dos 10,9% que acabou por ter no final das primárias — e também os 24,6% de Rick Santorum, o mais conservador dos candidatos em 2012 que, apesar de ser católico, conseguiu convencer o eleitorado evangélico.

 

 

Ciente disto, a equipa de campanha de Ted Cruz tentou implementar o seu candidato no estado a partir de várias frentes. Um dos triunfos foi o apoio do congressista do Iowa, Steve King. Outro, foi feito num intensivo trabalho de porta a porta, no qual a contribuição direta do pai de Ted Cruz, pastor evangélico, foi essencial — a angariação do voto dos eleitores profundamente religiosos.

 

 

Assim, Cruz conseguiu sair por cima no Iowa, apesar de as sondagens não preverem tal cenário. Mesmo assim, a sua vitória não conseguiu esconder um facto: a pulverização de votos destas primárias republicanas. Para isto, terão sido essenciais os 11 candidatos por onde escolher (acima dos sete que havia nesta fase em 2012) e o elemento surpresa que Donald Trump introduziu na campanha, tomando o debate para si — à exceção de no último confronto televisivo, do qual escolheu ficar de fora.

 

 

A importância do Iowa para os republicanos

 

 

 

O Iowa tem apenas 3 milhões de habitantes — menos de 1% da população total dos EUA. Mesmo assim, de quatro em quatro anos, é por ali que começa o calendário eleitoral norte-americano. E não é por acaso que todos os candidatos que querem ser escolhidos dentro do próprio partido para as eleições gerais investem em larga escala na campanha. É que, tanto no Partido Democrata como no Partido Republicano, os resultados que saem do caucus do Iowa funcionam como indicador forte para determinar quem vencerá a corrida das primárias.

 

 

Já escrevemos noutro texto que, no caso dos democratas, 67% dos candidatos que ali vencem as primárias acabam por ir às eleições para Presidente. No caso dos republicanos, que adotaram o sistema de caucusno Iowa em 1976, só em três ocasiões de num total de sete é que isso se verificou — Gerald Ford (1976), Bob Dole (1996) e George W. Bush (2000). Porém, houve dois anos em que o segundo classificado no Iowa, que ficou praticamente colado ao primeiro, chegou ao final da corrida. Foi assim com Ronald Reagan em 1980 (29,5%, atrás dos 31,6% de George H. W. Bush) e com Mitt Romney em 2012 (que com 24,6%, ficou apenas 34 votos atrás de Rick Santorum).

 

 

Assim, pode dizer-se que em 71% das ocasiões, aqueles que venceram ocaucus republicano do Iowa ou estiveram muito perto de o vencer, conseguiram a nomeação do partido para concorrerem à Casa Branca. Uma pretensão que Cruz agora tem como mais real do que nunca. Assim o deixou claro, já no fim do seu discurso de 32 minutos:

 

 

“Se ficarmos juntos, como um só, se o povo americano ficar junto e disser ‘nós queremos o nosso país de volta’, não há força em Washington que consiga aguentar contra o povo americano.”

 

 

 

João de Almeida Dias/OBS/3/2/2016

 

 

 

 

 

Empresários José Veiga e Paulo Santana Lopes detidos por corrupção em negócios internacionais

O empresário de futebol, José Veiga, e o irmão do ex-primeiro ministro Santana Lopes, Paulo Santana Lopes, foram detidos pela Polícia Judiciária por suspeitas de corrupção no comércio internacional. Em causa estarão negócios no Congo, cujo dinheiro foi depois aplicado em Portugal na compra de vários bens. Foi ainda detida uma advogada que terá ajudado na concretização dos negócios, apurou o Observador.

 

 

Segundo o comunicado da Polícia Judiciária, os três suspeitos, entre os 53 e os 57 anos, foram detidos no âmbito de uma operação com o nome de código “Rota do Atlântico”. Foram feitas 35 buscas nas zonas de Lisboa, Braga e Fátima e envolvidos cerca de cento e vinte elementos da PJ e dez magistrados. O Observador apurou que ainda estão a decorrer buscas para recolha de mais prova. Entretanto o Ministério Público, em comunicado, acrescenta que foram feitas buscas a um banco, a três escritórios de advogados, em casas e sedes de empresas. O Diário Económico diz que as buscas foram feitas no Novo Banco.

 

 

A Polícia Judiciária, através da Unidade Nacional de Combate à Corrupção, e numa investigação dirigida pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) iniciada ainda em 2014,  refere que os detidos celebravam contratos de fornecimentos de bens e serviços – entre os quais obras públicas, construção civil e venda de combustível a várias entidades provadas e estatais do Congo. Os lucros destes negócios eram “utilizados na aquisição de imóveis, veículos de gama alta, sociedades não residentes e outros negócios, utilizando para o efeito pessoas com conhecimentos especiais e colocadas em lugares privilegiados, ocultando a origem do dinheiro e integrando-o na atividade económica licita”.

 

 

Já o comunicado do Ministério Público acrescenta que os suspeitos estão também indiciados pela prática dos crimes de tráfico de influência e de participação económica em negócio na compra e venda de ações de uma instituição financeira estrangeira, ações, essas, detidas por instituição de crédito nacional”. Mais. Que a investigação tanto toca no continente africano, como no europeu e no americano.

 

 

Foram apreendidos vários imóveis como veículos automóveis de gama alta e saldos bancários. Os detidos vão ser sujeitos a primeiro interrogatório judicial, para eventual aplicação das medidas de coação tidas por adequadas. Mais uma vez, será o juiz Carlos Alexandre a ouvir os detidos. E o processo está em segredo de justiça.

 

 

Proposta de compra de banco investigada pela PJ. Apreendido dinheiro do sinal

 

 

Ainda segundo o que o Observador apurou, a proposta de compra do Banco Internacional de Cabo Verde, do Grupo Espírito Santo, feita por Veiga estará também debaixo de olho da Polícia Judiciária. A informação foi avançada há duas semanas pelo Diário Económico que dava conta do interesse do empresário, que mantinha negócios em África – onde se refugiou como consultor, gestor e empresário, depois da saída da estrutura diretiva do Benfica, em 2007.

 

 

Na proposta de compra, Veiga representa um grupo luso-africano (sobretudo com interesses do Congo) que quer comprar o Banco Internacional de Cabo Verde (BICV), ativo do Novo Banco, avaliado em 14 milhões de euros, noticiou o Diário de Notícias e o Diário Económico. Mas já há dois anos Veiga tinha mostrado interesse nos negócios da banca, ao negociar com o Grupo Espírito Santo uma participação na holding Es Control, também num consórcio com investidores africanos. Noticiou o Económico que o negócio não se concretizou, mas envolvia 150 milhões de euros que poderiam ter ajudado o GES então em dificuldades.

 

 

De acordo com o Diário Económico, na sequência da operação da Polícia Judiciária coordenada pelo Ministério Público, foram apreendidos 11 milhões de euros – o valor já dado como sinal. Aliás, o empresário não podia sequer entrar neste negócio uma vez que surge na lista de devedores ao Fisco.

 

 

Veiga mudou-se para África em 2009 e tornou-se consultor na área do futebol para a África e América do Sul. A partir de 2011 passou a ter residência fixa no Congo e a mudar o seus interesses para outras áreas, da banca à saúde, do ambiente ao imobiliário.

 

 

Paulo Santana Lopes foi administrador da Tetris, uma sociedade imobiliária comprada pela empresa Marquês de Pombal por indicação da Sociedade Lusa de Negócios (SLN), e o seu nome foi mencionado durante a comissão de inquérito ao BPN. Em 2010, foi notícia novamente por ter alegadamente recebido um cheque de Manuel Godinho. o empresário de Ovar que foi constituído arguido no âmbito do processo Face Oculta.

 

 

O emigrante do Luxemburgo que foi empresário de Figo, Ronaldo e Zidane

 

José Veiga chegou a ser o maior empresário do futebol português, tendo-se destacado sobretudo com a transferência de Luís Figo. Mas deteve também os passes de Ronaldo e Quaresma, por exemplo. Manteve um ‘duelo’ no mundo das comissões de transferências de jogadores, que chegou a liderar, com Jorge Mendes, até que foi perdendo influência e jogadores importantes na sua carteira.

 

 

Chegou depois a fazer parte da estrutura administrativa do Benfica, como diretor-geral da SAD entre 2004 e 2007. Problemas fiscais, que envolveram o banco Dexia no Luxemburgo e incluíram o arresto de bens, levaram-no a sair do clube.

 

 

A sua história começou no Luxemburgo onde era emigrante (trabalhava num stand a pintar carros) e presidente da casa do FC Porto do país. Conta a história que conseguiu atrair ao local alguns dos grandes do futebol para cerimónias importantes, que por sua vez lhe retribuíam com convites para eventos desportivos. À medida que a exposição foi crescendo, foi aparecendo nos mais importantes acontecimentos e fazia questão de se fazer fotografar ao lado dos maiores do futebol mundial. Assim ganhou fama.

 

 

Daí a agenciar jogadores, uma prática ainda não muito comum nos anos 90, foi um passo. Fundou com o filho de Pinto da Costa, Alexandre, a Superfute, empresa que chegou a mediar as maiores transferências mundiais. Atém de Figo para o Barcelona, também Zidane para o Real Madrid, Paulo Sousa para a Juventus ou Fernando Couto para o Parma.

 

 

À medida que perdeu influência, perdeu jogadores.  E perdeu-os para o seu maior rival, Jorge Mendes, atualmente o maior empresário do futebol mundial. A maior perda foi, obviamente, a de Ronaldo .

 

 

A luta entre os dois, Veiga e Mendes, acabou, literalmente, à pancada: uma cena nas chegadas do aeroporto de Lisboa que Mendes terá ganho, apesar de ser mais peso-leve, terá ganho. E que acabou de forma inusitada. Os três telemóveis que cada um cada um levava consigo espalharam-se pelo chão. E acabaram trocados nos bolsos que ambos entretanto tiveram de ajeitar após a batalha. Terão falado pela última vez nessa altura. Para entregarem o seu a seu dono.

 

 

José Veiga. A história de um homem de quem toda a gente se afastou

 

 

Chegou a mexer nas duas transferências mais caras do futebol mundial. Do auge com Figo e Zidane caiu para a pancadaria com Jorge Mendes e a separação de Cristiano Ronaldo por causa de dinheiro.

 

Empresários José Veiga e Paulo Santana Lopes detidos por corrupção em negócios internacionais 2

Um ano depois de Oliveira lhe dar o cimento e o alcatrão, Veiga constrói a própria estrada. Alexandre Pinto da Costa, filho do presidente portista, vai na conversa e funda com José a Superfute. Aquece o verão de 1993 com Paulo Sousa e Pacheco, que ajuda a tirar do Benfica e a por no Sporting. Anos depois coloca o primeiro na Juventus, em Itália, o mesmo país onde abre a porta do Parma a Fernando Couto, até então central dos dragões. Jorge Nuno Pinto da Costa não gosta e vira-lhe as costas e os ouvidos de qualquer jogador portista.

 

 

À segunda consegue dar boleia a João Vieira Pinto até aos leões, semanas antes de fazer lá chegar Mário Jardel e juntar um pai e um filho que dão o campeonato ao Sporting. No verão de 2000, congemina a maior transferência do planeta (62 milhões de euros), multiplicando reuniões com Florentino Pérez para colocar no Real Madrid o capitão do Barcelona. Luís Figo tornava-se pesetero para os catalães e herói para osmerengues. Na época seguinte, intromete-se entre Juventus e Real Madrid para mediar os 75 milhões que o espanhóis pagam aos italianos pelo francês Zinedine Zidane.

 

 

 

Em 365 dias, José Veiga participa nos dois negócios que mais dinheiro movimentam na história do futebol. Em 2001 está no topo, de peito feito, no ombro dos melhores jogadores e ao ouvido de grande parte dos dirigentes do futebol português. Lá fora não se distrai e mantém sempre um olhar atento às objetivas das câmaras. Faz por ladear as grandes figuras, os presidentes, treinadores e dirigentes que interessam, para estar na sua companhia quando os flashes disparam e as fotografias e as imagens chegam aos jornais e televisões.

 

 

Mas é aí, diz ao Observador uma fonte que foi próxima de Veiga, que se vai pondo a jeito dos problemas. “Começa a meter-se em muita coisa.Tem uma tendência muito grande para se ligar a pessoas que não prestam”, conta quem trabalha durante anos com Veiga até perceber o que, mais tarde ou mais cedo, todos os que lhe são próximos detetam. É por isso que as pessoas próximas de Veiga se começam a afastar. Ou mesmo a cortar relações.

 

 

Os problemas começam e acabam quase sempre no dinheiro. Não se porta bem com muita gente, Luís Figo afasta-se de Veiga antes de Joaquim Oliveira ou Alexandre Pinto da Costa fazerem o mesmo. O empresário vai ficando sem jogadores, muitos deles desconfiados por alegadamente terem contas bancárias no estrangeiro às quais raramente chegavam todos os números do salário que o clube lhes pagava. Um rumor nunca confirmado, mas muito contado. Muitos fogem de Veiga, mas ele pensa que é Jorge Mendes a roubá-los. “O Mendes nem teve muito mérito nisso. Limitava-se a esperar que eles saíssem da empresa do Veiga para ir trabalhar com os jogadores”, refere uma fonte contactada pelo Observador. Até um imberbe Cristiano Ronaldo chega asprintar para longe do empresário.

 

 

A história contam-na assim quem dela sabe: em adolescente, o Sporting falha algumas vezes ao pequeno craque e paga-lhe com atraso. Ronaldo ainda ganhava uma ninharia em comparação à fortuna à qual hoje perde a conta e, quando os leões, alegadamente, se atrasavam no pagamento desses trocos, Cristiano pediria ajuda à carteira do seu agente. Dinheiro adiantado de José Veiga, mas com um senão. “Por cada 500 euros que lhe pedia, só recebia 150”, diz quem conheceu o processo. Quem estava no clube na altura sabia que o empresário dava o dinheiro “sempre com desdém”, até ao dia em que Ronaldo “precisou mesmo” dos “mil e tal euros” que ganhava e Veiga apenas lhe adiantou cerca de 200. Cristiano terá levado a mal e foi trabalhar com Jorge Mendes, o amigo que hoje lhe é como família e o levou a fazer escala em Manchester no caminho até Madrid.

 

 

Os grandes nomes que jogam bem à bola vão-se afastando, mas, em Portugal, o empresário faz-se valer das amizades para, por exemplo, chegar a ter 24 jogadores do plantel do Benfica. Essa amizade é com Luís Filipe Vieira, que o convida em 2004 para ser diretor-geral da SADencarnada. É campeão logo na primeira época, mas as candeias de ambos vão ficando às avessas até 2007, ano em que o presidente se chateia com o empresário e Veiga abandona o clube. Na altura já com um processo em cima, devido a um caso no Luxemburgo, com arresto de bens pelo meio. “As pessoas que se davam bem com ele foram-se afastando. Todas as amizades tornaram-se, com o tempo, inimigos dele”, resume uma dessas pessoas, ao Observador.

 

 

 

José Veiga zangou-se com muita gente, ou muitos se zangaram com ele: Pinto da Costa, Joaquim Oliveira, Luís Figo, Simão Sabrosa e Luís Filipe Vieira são exemplos.

 

 

 

É quando sai do Benfica que entra em vários negócios com Paulo Santana Lopes, irmão do ex-primeiro-ministro, que também foi detido, esta quarta-feira, pela Polícia Judiciária. A bola do futebol rola para longe e José Veiga começa a lidar mais no ramo do petróleo e dos diamantes, mas também do imobiliário. Sai do radar, mas a essência do negociador não terá mudado muito. A apetência para lidar com as pessoas erradas ter-se-á mantido, tal e qual manteve, há anos, a intenção de entrar na bolsa do Euronext de Paris com a Superfute, contra avisos e conselhos de quem ainda seu amigo era. A empresa chegou a estar cotada, mas os prejuízos foram de milhões — “O melhor mercado teria sido o de Londres, mas como não falava inglês, ligou-se a uns tipos em Paris para meter a empresa lá na bolsa. Depois foi tudo um flop”.

 

 

Falam sobre José Veiga e ligam-lhe o nome a esquemas e negócios estranhos. Descrevem o empresário como uma pessoa “que se julgava acima da lei” e agora foi detida por suspeitas de a violar. Há duas semanas já se ouvira falar dele, por representar um grupo luso-africano candidato a adquirir o Banco Internacional de Cabo Verde — ativo não-estratégico do Novo Banco. Após a pintura de carros, casa do FC Porto de Luxemburgo, transferências de milhões e direção do Benfica, José Veiga volta a ser notícia.

 

 

Um dos negócios que está na mira dos investigadores, como o Observador noticiou,  é a tentativa de compra do Banco Internacional de Cabo Verde (BICV) por parte de José Veiga.

 

 

Segundo notícia do Diário Económico de 20 de janeiro, a proposta de 14 milhões de euros foi apresentada por Veiga em nome de um consórcio que incluía diversos investidores africanos. O mesmo jornal afirmou que o DCIAP apreendeu nas buscas realizadas na quarta-feira cerca de 11 milhões de euros pagos ao Novo Banco (o banco que detém o BICV) como sinal pela realização do negócio. Recorde-se que o negócio ainda não tinha sido autorizado pelo Banco de Portugal.

 

 

José Veiga e Paulo Santana Lopes, juntamente com a advogada igualmente detida, serão ouvidos esta quinta-feira pelo juiz de instrução criminal Carlos Alexandre.

 

 

 

Uma lei de Sócrates

 

 

 

A lei que estipula o crime de corrupção activa do comércio internacional, cuja primeira versão foi assinada pelo primeiro-ministro José Sócrates e deriva da transposição de legislação da União Europeia, é precisamente aplicada a quem alegadamente der ou prometer a “funcionário estrangeiro ou nacional (…) ou a titular de cargo político, nacional ou estrangeiro, (…) vantagem patrimonial ou não patrimonial que não lhe seja devida para obter ou conservar um negócio, um contrato ou outra vantagem indevida no comércio internacional”. Ao que o Observador apurou, no inquérito em apreço não estarão a ser investigadas suspeitas de corrupção relacionadas com titulares de cargos políticos portugueses. A pena de prisão prevista para o crime em causa é de um a oito anos.

 

 

Esta lei permite à Justiça portuguesa investigar crimes que tenham sido alegadamente praticados em território nacional por parte de responsáveis de empresas a funcionar em Portugal e que actuem nos mercados internacionais. Os alegados corruptores passivos (isto é, quem recebe a alegada contrapartida indevida) não são perseguidos criminalmente se esse crime tiver sido praticado noutro país, devido à falta de competência jurisdicional por parte da República Portuguesa.

 

 

Não é a primeira vez que este crime é investigado pelo DCIAP. Recorde-se que, tal como o Observador já noticiou, Paulo Lalanda de Castro, ex-patrão de José Sócrates, foi constituído arguido na Operação Marquês por esse crime devido a alegadas transferências bancárias realizadas para titulares de cargos políticos da Líbia. Segundo o MP, tais transferências seriam alegadas contrapartidas pela adjudicação de um contrato público na área da saúde à empresa Inteligent Life Solutions. Foi extraída certidão para o processo Vistos Gold, mas esta situação não foi apreciada no despacho final de inquérito do caso que envolve o ex-ministro Miguel Macedo.

 

 

O estudo do investimento no Grupo Espírito Santo 

 

 

As alegadas ligações privilegiadas de José Veiga ao Governo da Republica do Congo têm sido noticiadas nos últimos anos na comunicação social portuguesa. Um desses casos está relacionado com a possível entrada de investidores da República do Congo no capital de duas sociedades doGrupo Espírito Santo (GES) que foi discutida no Conselho Superior do GES. Segundo as gravações, que foram reveladas em primeira mão pelo jornal i e noticiadas numa segunda fase pela revista Sábado, a família Espírito Santo discutiu em pormenor o interesse que José Veiga tinha manifestado em intermediar o investimento de entidades da República do Congo no GES – tal como foi recordado a 20 de janeiro pelo Diário Económico e esta quarta-feira pela revista Visão.

 

 

Pedro Mosqueira do Amaral, um dos membros do ramo Mosqueira do Amaral, informou o Conselho Superior do GES na reunião de 27 de janeiro de 2014 do desejo de José Veiga em encontrar-se com Ricardo Salgado. “O Congo Brazzaville tem uns milhões disponíveis e gostava de investir em Portugal. Gostava de ver a nossa estrutura. Estamos interessados nisso?”, perguntou o gestor.

 

 

 

Salgado respondeu afirmativamente, tendo Mosqueira do Amaral acrescentado que Veiga “é o gestor do presidente do Congo Brazaville” (Denis Sassou Nguesso). O mesmo administrador do GES referiu ainda que Nguesso estaria interessado numa parceria com “Gabriel [Lima, ministro das Minas, Indústria e Energia e filho do presidente] da Guiné Equatorial”, segundo a contextualização feita pela revista Sábado.

 

 

Director-geral de empresa brasileira no Congo

 

 

Mosqueira do Amaral também referiu a ligação de José Veiga à empresa brasileira Asperbras. Trata-se de uma sociedade agrícola que nasceu em 1966 no interior do estado de São Paulo e que hoje, além de ter expandido as suas actividades para a industria de PVC para fins agrícolas, está também presente nos sectores alimentar, geológico, mineração e de construção, e tem filiais internacionais em Portugal, Angola, Congo, Uruguai e Áustria.

 

 

José Veiga é, desde há vários anos, director-geral da Asperbras na República do Congo. Um dos projectos que lidera é, por exemplo, a construção da zona industrial e comercial de Maloukou, localizada nos arredores da capital Brazzaville e com uma área de 654 mil hectares. Tal empreendimento faz parte do plano de industrialização que está a ser implementado pelo presidente Denis Sassou Nguesso e tem um custo estimado de 500 milhões de dólares americanos (cerca de 450 milhões de euros).

 

 

 

Luís Rosa/Obs/Mariana Oliveira/PUB/AFP/ Diogo Pombo/Filomena Martins/S.S./Catarina Falcão/OBS/TPT/3/2/2016