O antigo presidente do MPLA e ex-chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos, morreu hoje aos 79 anos, internado numa clínica em Barcelona. “Zedu”, como era conhecido, foi presidente de Angola entre 1979 e 2017.
O antigo Presidente de Angola José Eduardo dos Santos morreu hoje aos 79 anos, anunciou a Presidência da República angolana.
“O Executivo da República de Angola leva ao conhecimento da opinião pública nacional e internacional, com um sentimento de grande dor e consternação, o falecimento de Sua Excelência o ex-Presidente da República, Engenheiro José Eduardo dos Santos, ocorrido hoje às 11h10 [10:10 em Lisboa], (…) após prolongada doença”, pode ler-se no comunicado.
O executivo angolano, que apresenta “profundos sentimentos de pesar” à família, apela ainda “à serenidade de todos neste momento de dor e consternação”.
“O Executivo da República de Angola inclina-se, com o maior respeito e consideração, perante a figura de um Estadista de grande dimensão histórica, que regeu durante muitos anos com clarividência e humanismo os destinos da Nação Angolana, em momentos muito difíceis”, acrescenta o comunicado.
O ex-Presidente sofria de problemas de saúde há vários anos e vinha sendo acompanhado desde 2006 no Centro Médico Tekon, em Barcelona.
Internado em estado grave desde 23 de junho nessa mesma clínica, foi noticiado cinco dias depois que a sua saúde se tinha degradado drasticamente, tendo uma fonte do seu gabinete adiantado que o ex-chefe de Estado estava “nas últimas”.
Segundo a mesma fonte, no dia anterior haviam sido realizados exames de tomografia que detetaram graves lesões isquémicas no cérebro. “De ontem para hoje a situação agravou-se consideravelmente e sendo a sua situação praticamente irreversível, devemos agora estar preparados para o pior”, disse essa fonte ao semanário.
Eduardo dos Santos governou Angola entre 1979 e 2017, tendo sido um dos presidentes a ocupar por mais tempo o poder no mundo e era regularmente acusado por organizações internacionais de corrupção e nepotismo.
Em 2017, renunciou a recandidatar-se e o atual Presidente, João Lourenço, sucedeu-lhe no cargo, tendo sido eleito também pelo Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), que governa no país desde a independência de Portugal, em 1975.
José Eduardo dos Santos, ou ‘Zedu’ como era tratado em Angola, começou a sua experiência governativa a 11 de novembro de 1975, com o primeiro Governo do país, então ministro das Relações Exteriores.
Em mais de 40 anos em funções, em 1979 sucedendo a António Agostinho Neto, primeiro Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos apenas governou em período de paz durante menos de uma década e meia e encarou diretamente apenas duas eleições (1992 e 2012), além de umas eleições legislativas (2008).
Nascido a 28 de agosto de 1942 em Luanda, José Eduardo dos Santos viveu até à juventude no bairro do Sambizanga, na capital angolana, mas aos 19 anos deixou o país, quando já integrava grupos clandestinos de oposição ao regime colonial português.
É um dos fundadores da Juventude do MPLA, que chegou a coordenar no exterior, e em 1962 integrou o Exército Popular de Libertação de Angola (EPLA), até que no ano seguinte se tornou no primeiro representante do partido em Brazzaville, capital da República do Congo.
Em setembro de 1975 entra para a elite do partido, sendo eleito membro do Comité Central e do Bureau Político do MPLA, avançando com naturalidade para o Governo de Agostinho Neto, depois da proclamação da independência.
Foi como chefe da diplomacia angolana que conseguiu o primeiro objetivo nacional para a então República Popular de Angola, em guerra. Conseguiu em 1976 o reconhecimento do país, após intensa luta diplomática, como membro de pleno direito da Organização da Unidade Africana (OUA) e da Organização das Nações Unidas (ONU).
Entretanto, exerceu, no Governo, o cargo de primeiro vice-primeiro-ministro, até dezembro de 1978, altura em que foi nomeado ministro do Plano, antecedendo a sua chamada para a Presidência do país, funções em que se manteve durante os 38 anos seguintes.
Um líder discreto com poder absoluto. Os momentos que marcaram a vida de José Eduardo dos Santos
José Eduardo dos Santos, que morreu hoje em Barcelona, foi sempre um líder que primou pela discrição, mas o exercício do poder foi considerado por organizações internacionais como absolutista.
Em 20 de setembro de 1979, com a morte do primeiro Presidente de Angola, Agostinho Neto, José Eduardo Santos, visto então como um tecnocrata com pouco brilho – a que se juntava uma expressão impassível e, por vezes, inescrutável – foi eleito secretário-geral do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), assumindo, no dia seguinte, o cargo de Presidente de Angola e Comandante-Chefe das Forças Armadas Angolanas. Seguiram-se 38 anos no poder.
Aqui, todavia, fica uma cronologia dos principais acontecimentos da vida de José Eduardo dos Santos, que hoje morreu em Barcelona, aos 79 anos.
José Eduardo dos Santos, filho de Eduardo Avelino dos Santos, pedreiro reformado, e de Jacinta José Paulino, doméstica, nasce no bairro de Sambizanga, em Luanda.
- Inícios da década de 1950
Frequenta o Liceu Nacional Salvador Correia, atual Mutu-ya-Kevela, em Luanda.
A fusão de vários grupos dá origem ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). Nessa altura, José Eduardo dos Santos teve um papel ativo na organização de grupos clandestinos nos arredores de Luanda, algo que viria a intensificar-se a partir de 1961.
1961
José Eduardo dos Santos sai de forma clandestina de Angola e viaja para Leopoldville (atual Brazzaville), no então Congo Belga (atual República do Congo).
Acumula as funções de vice-secretário da JMPLA (juventude do MPLA) e de representante do MPLA.
José Eduardo dos Santos tem uma breve passagem pela guerrilha na luta contra o colonialismo português.
Nesse mesmo ano recebe uma bolsa de estudo para estudar no Instituto de Gás e Petróleo de Baku, Azerbaijão, na antiga União Soviética, onde se formou como engenheiro industrial (setor petrolífero) em junho de 1969.
Durante a sua formação, joga futebol no Neftchi (Azerbaijão), equipa de futebol da primeira liga soviética.
Após terminar a tese, é enviado para uma academia militar soviética para receber instrução como operador de comunicações militares. A formação fê-lo subir na hierarquia militar do MPLA.
Assume a chefia do centro de comunicações da Frente Norte e, mais tarde, ocupa o cargo de chefe-adjunto do serviço de comunicações da segunda região político-militar do MPLA, Cabinda. Membro da Comissão Provisória de Reorganização da Frente Norte e chefe dos serviços financeiros do segundo distrito político-militar.
Setembro de 1975
Por indicação do Presidente Agostinho Neto, José Eduardo dos Santos foi escolhido para integrar o Comité Central e o Bureau Político do MPLA, na Conferência Inter-Regional do partido que se realiza no Moxico. Passa a coordenador dos departamentos de Relações Públicas e de Saúde e de Relações Exteriores do MPLA.
11 de novembro de 1975
Dia da independência de Angola e José Eduardo dos Santos torna-se o primeiro chefe da diplomacia do novo país.
Nomeado vice-primeiro-ministro e, a partir de dezembro de 1978, ministro do Plano; a nível partidário, foi secretário do Comité Central do MPLA para diversas áreas, como a Educação, Reconstrução Nacional e Desenvolvimento Económico e Planificação.
José Eduardo dos Santos, nomeado por Agostinho Neto, primeiro Presidente de Angola, chefia a comissão de inquérito à alegada tentativa de golpe de Estado conduzida por Nito Alves.
No primeiro congresso do agora designado MPLA – Partido do Trabalho, José Eduardo dos Santos manteve-se como membro do Comité Central e do Comité Político.
Com a morte do primeiro Presidente de Angola, Agostinho Neto, em 20 de setembro, José Eduardo Santos é eleito secretário-geral do MPLA e assume o cargo de Presidente de Angola e de Comandante-Chefe das Forças Armadas Angolanas.
Reunião extraordinária do MPLA, em dezembro, decide continuidade de José Eduardo dos Santos na Presidência; Institucionalizada a Assembleia do Povo, formalmente o órgão máximo do poder do Estado, sob presidência do chefe de Estado.
Recebe o Grande-Colar da Ordem do Infante D. Henrique de Portugal.
José Eduardo dos Santos, pelo MPLA, assina com Jonas Savimbi, líder da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), o Acordo de Bicesse que contemplava um cessar-fogo, a constituição do exército único e realização de eleições gerais, sob a supervisão das Nações Unidas.
Eleições presidenciais e legislativas. O MPLA ganha com maioria absoluta, com a UNITA em segundo lugar. José Eduardo dos Santos foi o mais votado, com 49%, na primeira volta das presidenciais. Mantém-se em funções, com o processo eleitoral por concluir.
02 de outubro de 1992
Savimbi declara as eleições fraudulentas e ameaça regressar à guerra. Duas semanas depois, a ONU valida eleições, considerando-as “genericamente livres e justas”.
Começam confrontos violentos em Luanda, que duram três dias. Vários altos dirigentes da UNITA são mortos, entre os quais o vice-presidente, Jeremias Chitunda, e o chefe da representação do movimento do “Galo Negro” na Comissão Conjunta Político-Militar e sobrinho de Savimbi, Elias Salupeto Pena. A escalada de guerra torna-se incontrolável, refugiando-se a UNITA no Huambo, onde tinha concentrado o quartel-general.
Reconhecimento do Governo angolano pelos Estados Unidos, seguido pela maioria da comunidade internacional.
20 de novembro de 1994
Assinatura do protocolo de Lusaca para a desmobilização das tropas do MPLA e da UNITA, formação de um Governo de unidade e de reconciliação nacional.
Recebe o Grande-Colar da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada de Portugal.
Morte de Jonas Savimbi. O Governo anuncia que as forças governamentais abateram o líder da UNITA na província do Moxico.
Marcando o fim de 27 anos de guerra civil, assiste no Palácio dos Congressos, em Luanda, à assinatura do acordo geral de Paz no Luena, entre o general Abreu Muengo Ucuachitembo “Kamorteiro” (UNITA) e o chefe de Estado-Maior das Forças Armadas Angolanas, general Armando da Cruz Neto, na presença do corpo diplomático, líderes religiosos e personalidades da sociedade civil.
Anuncia a realização de eleições legislativas em 2008 e presidenciais em 2009.
Eleições legislativas em Angola, naquela que é a primeira consulta popular após o fim da guerra civil. José Eduardo dos Santos é indicado para Presidente pelo MPLA, que obteve 82% dos votos, que valeram 191 dos 220 lugares da Assembleia Nacional.
Encontra-se com Bento XVI em Luanda, durante a visita do papa ao país.
27 de janeiro de 2010
Adoção de nova Constituição, que consagra o regime presidencialista. O Presidente passa a ser o cabeça-de-lista do partido mais votado no círculo nacional, em eleições gerais, passando a ser eleito por via indireta.
Mais de 20 mil pessoas participam numa manifestação de apoio a José Eduardo dos Santos em resposta a protestos inéditos contra o regime.
O MPLA, liderado por José Eduardo dos Santos, vence as eleições gerais com 72% dos votos.
MPLA vence eleições gerais de 2017 com 61% dos votos, permitindo a nomeação de João Lourenço como terceiro Presidente da República de Angola desde a independência. No mês seguinte, José Eduardo dos Santos deixa o poder.
José Eduardo dos Santos passa a viver na cidade catalã de Barcelona, para realizar com maior facilidade tratamentos no Centro Médico Teknon, uma das melhores unidades hospitalares europeias na valência de oncologia, que já tratava o ex-Presidente angolano há cerca de oito anos – a partir da altura em que esta unidade catalã foi recomendada a José Eduardo dos Santos por especialistas brasileiros no Rio de Janeiro.
José Eduardo dos Santos acaba por falecer, aos 79 anos, após um agravamento do seu estado de saúde. Internado em estado grave desde 23 de junho numa clínica em Barcelona, é noticiado cinco dias depois que a sua saúde se tinha degradado drasticamente. Mais tarde, as notícias dão conta de danos cerebrais irreversíveis. A morte viria a confirmar-se a 8 de julho.
Reacções à morte de José Eduardo dos Santos
“Consternado”com óbito de Eduardo dos Santos, MPLA suspende todas as atividades políticas até fim do luto nacional.
“Neste momento já suspendemos toda a atividade política do partido. Não vamos realizar qualquer outro ato até que termine o luto nacional”, afirmou, em declarações à Lusa, o porta-voz do MPLA Rui Falcão.
Rui Falcão adiantou que o partido, ” além de acompanhar o programa de Estado” irá ter um programa próprio de homenagem ao ex-presidente, sobre o qual disse não poder adiantar, para já, pormenores.
“O que lhe posso dizer é que é um momento de profunda consternação”, concluiu.
Filha escreve nas redes sociais que “os pais nunca morrem”
Tchizé dos Santos, filha do ex-presidente de Angola José Eduardo dos Santos, escreveu hoje nas redes sociais que “os pais nunca morrem” e “vivem para sempre” nos filhos, minutos após o anúncio da morte do pai.
“Os pais nunca morrem porque são o amor mais verdadeiro que os filhos conhecem em toda a vida. Eles vivem para sempre dentro de nós”, escreveu Tchizé dos Santos na rede social Instagram, numa mensagem acompanhada por uma colagem de fotografias antigas da família.
Chega: “Hoje também não podemos esquecer o ditador”
Em declarações aos jornalistas na Assembleia da República, André Ventura apresentou os seus “sentimentos à família de José Eduardo dos Santos e também ao povo angolano” pela morte de José Eduardo dos Santos, aos 79 anos, após doença prolongada.
“Acompanhamos nesse sentido o luto da família e do povo angolano, que saudamos”, afirmou.
O líder do Chega criticou, no entanto, o ex-Presidente da República, considerando que “que usou o poder do Estado angolano para se prolongar e perpetuar no poder, às vezes com recurso a violência, à morte e à intimidação”.
“Reconhecendo a dor familiar e a dor de muitos cidadãos angolanos, hoje também não podemos esquecer o ditador, o homem que apesar das promessas de democratização, verdadeiramente nunca o conseguiu concretizar”, salientou.
Ventura defendeu igualmente que José Eduardo dos Santos “aglomerou toda a família como uma verdadeira elite de poder, uma cleptocracia, com tiques de nepotismo muito, muito profundos, e que o Estado angolano ainda hoje está a pagar e que a nova presidência angolana ainda hoje está a pagar”.
“José Eduardo dos Santos, se hoje certamente alguns sofrem com a sua perda, é um dos principais responsáveis pelo enorme empobrecimento do povo angolano e a sua morte não apagará isso, por muito que a dor da sua família seja para nós um dado a respeitar e de alguma parte do povo angolano”, declarou.
O líder do partido português de extrema-direita indicou que não é possível esquecer “o mal que foi feito ao povo angolano, o mal que às vezes foi feito nas relações entre Angola e Portugal, cuja deterioração também pontual foi levada a cabo por José Eduardo dos Santos e, sobretudo, o péssimo exemplo de nepotismo e cleptocracia que José Eduardo dos Santos deixa para o futuro e deixa para o continente africano”.
Mira Amaral recorda “comportamento sereno e frio” de antigo Presidente
O antigo ministro e líder do Banco BIC, Luís Mira Amaral, recordou o antigo Presidente angolano José Eduardo dos Santos, que morreu hoje, como uma pessoa com um “comportamento bastante sereno e frio”.
Contactado pela Lusa, Mira Amaral respondeu que apenas esteve com José Eduardo dos Santos uma vez: “Apenas o cumprimentei uma vez, quando ele veio em visita oficial a Portugal, numa receção no Palácio da Ajuda [Lisboa] a convite do então Presidente da República, Cavaco Silva, (…), mas nunca conheci o senhor”.
No entanto, o economista recordou a “longa duração” do mandato do antigo chefe de Estado angolano e reconheceu-lhe um “comportamento bastante sereno e frio”.
“Acho que teve um comportamento bastante sereno e frio quando o líder da UNITA [Jonas Savimbi] desapareceu. Ele foi bastante frio na gestão das coisas em nome da paz. Teve esse comportamento bastante positivo nessa fase”, disse.
PCP recorda homem que venceu “sobre domínio colonial português”
Em comunicado, o PCP “transmite ao Movimento Popular para a Libertação de Angola [MPLA] e ao povo angolano as sentidas condolências” pela morte de José Eduardo dos Santos.
Os comunistas recordam Eduardo dos Santos como um homem “que conduziu o povo angolano à vitória sobre o domínio colonial português” enquanto presidente do MPLA e que depois de ser eleito Presidente da República travou “duríssimos combates, com dificuldades e complexidades”, pela defesa e consolidação da independência do país, e “contra a agressão imperialista e racista”.
“Recordando a contribuição de José Eduardo dos Santos para o desenvolvimento das tradicionais relações de amizade e solidariedade entre o PCP e o MPLA, assim como para as relações entre o povo português e o povo angolano, o PCP reitera ao MPLA o seu sentido pesar e a sua solidariedade”, lê-se no comunicado.
Durão Barroso evoca o estadista que ficará na História de África
“Recordo alguém de excecional inteligência, que foi capaz de garantir a unidade nacional angolana num contexto geopolítico extraordinariamente difícil, que ficará indelevelmente na História de Angola, de África e também das relações de Angola com Portugal”, escreveu o ex-presidente da Comissão Europeia e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros português, numa declaração enviada à agência Lusa.
José Manuel Durão Barroso, que antes de chefiar o Governo foi mediador, em representação de Portugal, dos Acordos de Paz para Angola, lembrou “com saudade” José Eduardo dos Santos.
“Não posso deixar de lembrar com saudade o patriota angolano e o estadista, com quem tive a honra de trabalhar para a paz e a reconciliação nacional em Angola. Recordo sobretudo que este foi o processo que conduziu às primeiras eleições livres e democráticas em Angola, e como tal reconhecidas pelas Nações Unidas e pela comunidade internacional”, sublinha no texto.
Durão Barroso assinala que “este momento fúnebre e triste não é o adequado para fazer um balanço completo da ação de José Eduardo dos Santos, e das muito complexas situações que Angola teve de enfrentar durante a sua presidência”.
No entanto, o ex-presidente da Comissão Europeia fez questão de “lembrar e reconhecer as palavras amigas” que Eduardo dos Santos “sempre teve em relação a Portugal e a importância que sinceramente dava às relações entre os dois países”.
“À família, aos amigos mais próximos, às autoridades angolanas e a todos aqueles que na nação amiga angolana hoje lamentam o seu desaparecimento, apresento as minhas mais sentidas condolências”, escreve ainda o antigo primeiro-ministro, que antes desempenhou os cargos de ministro dos Negócios Estrangeiros e de secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação de Portugal.
Cabo Verde “perdeu um grande amigo” e está “de luto”
“Cabo Verde perde um grande amigo e um líder africano que sempre contribuiu para o crescimento económico e espiritual destas ilhas, de modo que também estaremos de luto pela morte do Presidente José Eduardo dos Santos”, afirmou o chefe de Estado cabo-verdiano.
José Maria Neves foi primeiro-ministro de Cabo Verde de 2001 a 2016, período em que José Eduardo dos Santos, enquanto Presidente de Angola (1979 a 2017), chefiava igualmente o executivo angolano.
João Soares lamenta morte do “chefe da nomenclatura” angolana
“Teve os melhores cuidados médicos, sobretudo fora de Angola, porque infelizmente a Angola que ele e o João Lourenço deixam, eles são inseparáveis apesar do drama ‘shakespeariano’ entre eles, é uma Angola onde ninguém pode ter um tratamento médico decente, nem sequer a nomenclatura cleptocrática que governa Angola há 48 anos”, disse à agência Lusa João Soares.
Segundo o socialista, José Eduardo dos Santos foi “o chefe desta nomenclatura durante muitos anos” que passou o poder a João Lourenço, atual Presidente, uma vez que “nunca houve eleições livres em Angola”.
João Soares criticou também a educação em Angola ao considerar que “é uma desgraça” e lamentar que “a maior parte da nomenclatura” venha estudar para o estrangeiro, nomeadamente para Portugal.
O antigo ministro da Cultura disse igualmente que “não há o mínimo de segurança social em Angola”, frisando que “basta lá ir por uma semana para perceber o desastre de país que é”, apesar de ter “todas as condições para ser um dos mais produtivos”.
“Eles [José Eduardo dos Santos e João Lourenço] são o poder de uma cleptocracia há 50 anos, eles vão ultrapassar o tempo que durou a ditadura do Estado novo em Portugal e foi uma conjugação de métodos entre aquilo que foram os métodos de Salazar e do Marcelo Caetano e os métodos dos países comunistas”, precisou.
João Soares recordou ainda que José Eduardo dos Santos e João Lourenço foram educados “pela escola salazarista no tempo em que eram mais jovens, e pela escola comunista, quando foram para o exílio”.
Martins da Cruz realça transformação de Angola em “potência regional”
“José Eduardo dos Santos foi um grande presidente angolano e africano, porque ganhou a longa guerra civil – de 1975 até 2002 -, mas a seguir soube ganhar a paz, ou seja, integrar os generais e oficiais da Unita nas Forças Armadas de Angola e chamar vários membros da Unita para o seu próprio governo. Transformou Angola numa potência regional e marcou o tempo angolano e o tempo africano”, afirmou.
Em declarações à Lusa, o antigo diplomata assinalou que José Eduardo dos Santos “soube construir uma democracia” e que Angola pode ser “um exemplo” para outras nações africanas.
Enfatizando a criação de “um sistema partidário que funciona” e “eleições que são fiscalizadas por observadores internacionais”, Martins da Cruz recordou as “dezenas de vezes” que esteve com o antigo chefe de Estado angolano, destacando ainda ter sido “o único português convidado para o último aniversário” celebrado durante a sua presidência.
“Tinha um enorme respeito por Portugal. Sabia exatamente qual era o papel que tínhamos desempenhado para a paz em Angola durante as negociações de paz e respeitava muito as relações com Portugal. Soube sair como presidente e saiu de Angola para não se meter no dia a dia da governação. O atual presidente, João Lourenço, foi o seu último ministro da Defesa e creio que até aí teve um papel para preservar o equilíbrio político e a paz”, acrescentou.
José Eduardo dos Santos morreu hoje aos 79 anos em Barcelona, após doença prolongada, anunciou a Presidência da República de Angola.
O antigo Presidente da Angola estava há duas semanas internado nos cuidados intensivos de uma clínica em Barcelona.
Em comunicado, o executivo angolano apresenta “profundos sentimentos de pesar” à família e apela “à serenidade de todos neste momento de dor e consternação”.
José Eduardo dos Santos sucedeu a Agostinho Neto como Presidente de Angola em 1979 e deixou o cargo em 2017, cumprindo uma das mais longas presidências no mundo, sendo era regularmente acusado por organizações internacionais de corrupção e nepotismo.
Em 2017, renunciou a recandidatar-se e o atual Presidente, João Lourenço, sucedeu-lhe no cargo, tendo sido eleito também pelo Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), que governa no país desde a independência de Portugal, em 1975.
Presidente de Angola decreta luto nacional de cinco dias pela morte de José Eduardo dos Santos
“É declarado o luto nacional a ser observado em todo o território nacional e nas missões diplomáticas e consulares”, pode ler-se num decreto presidencial hoje assinado pelo chefe de Estado.
Segundo o decreto, o luto nacional começa às 00:00 de sábado, 09 de julho, e tem a duração de cinco dias, durante os quais a bandeira nacional será colocada a meia haste e serão cancelados todos os espetáculos e manifestações públicas.
O chefe de Estado angolano justifica a homenagem com o facto de o Presidente José Eduardo dos Santos ter sido “uma figura ímpar da Pátria Angolana, à qual se dedicou desde muito cedo, tendo tido relevante participação na luta contra a colonização, na conquista da Independência Nacional, na consolidação da Nação Angolana, na sua afirmação no contexto das Nações, na conquista da Paz e reconstrução e reconciliação nacionais”.
O luto nacional visa por isso “homenagear condignamente a sua figura, a sua obra, os seus feitos e o seu legado”, acrescenta o decreto presidencial.
TPT com: MadreMedia/Lusa//Sapo24//Labour Party (MPLA)// Paulo Novais/ LUSA//Pedro Parente/ANGOP/Lusa// 8 de Julho de 2022