Quem é Alexander Dvornikov, considerado o “carniceiro da Síria” e o novo comandante das forças militares russas na Ucrânia?

A invasão da Ucrânia parece não estar a correr como Vladimir Putin pretendia. De modo a virar o rumo, o Presidente russo apontou o general Alexander Dvornikov, que tem um historial de brutalidade desde os seus tempos a lutar ao lado do Presidente sírio Bashar al-Assad, como o novo comandante do exército da Rússia na Ucrânia

 

 

A recente decisão de oferecer ao General Alexander Dvornikov a chefia das tropas russas na Ucrânia foi entendida por muitos como uma admissão tácita por parte de Vladimir Putin, Presidente da Rússia, que a guerra não está a correr como pretendido. Putin terá subestimado não só o nível de resistência do povo e exército ucranianos, mas também a resposta das grandes potências ocidentais, que rapidamente, e de uma forma conjunta, impuseram a Moscovo sanções económicas a uma escala inédita na Europa, visando asfixiar o sistema financeiro russo e infligir o máximo de dor possível à cúpula política do Kremlin.

 

 

Mas Putin aposta que Alexander Dvornikov pode alterar o rumo da sua “operação militar especial”. Após ter tido ordens para recuar do teatro de guerra de Kiev, a capital ucraniana, o exército russo reajustou o propósito da sua invasão e concentra agora grande parte dos seus esforços na região do Donbass, no este da Ucrânia, onde se encontram as repúblicas separatistas pró-russas de Donetsk e Lugansk. Dvornikov conta com mais de 40 anos de carreira na máquina de guerra russa, 6 deles ao comando do Distrito Militar do Sul – que lidera desde 2016 –, precisamente a secção administrativa que supervisiona os conflitos na Ucrânia, como a anexação da Crimeia ou a prolongada guerra no Donbass. O coronel-general liderou também umas das mais bem-sucedidas campanhas militares do Kremlin nos últimos anos, quando, em 2015, dirigiu as tropas russas na Síria e transfigurou por completo a guerra a favor de Bashar al-Assad, o presidente sírio, que acabaria por permanecer no poder.

 

 

A intervenção da Rússia na Síria foi caracterizada por um grau de violência extremamente acentuado, com ataques aéreos indiscriminados que mataram milhares de civis e arrasaram áreas inteiras. A destruição da cidade de Alepo é especialmente paradigmática e tem sido muito citada na esfera pública por ilustrar na perfeição a indiferença de Putin perante as consequências das ofensivas demolidoras dos seus exércitos. John Kirby, o porta-voz do Pentágono, a sede do departamento de defesa dos Estados Unidos, manifestou-se preocupado pela ascensão de Alexander Dvornikov ao comando das manobras militares na Ucrânia, temendo uma réplica das táticas usadas em território sírio, mas agora em pleno continente europeu.

 

 

“Ele [Dvornikov] e outros altos dirigentes russos mostraram no passado, e a Síria é um bom exemplo, demonstraram claramente no passado o seu desrespeito por evitar danos civis…Por isso, penso que todos podemos esperar que essas mesmas táticas brutais, o mesmo desrespeito pela vida civil e pelas infraestruturas civis, provavelmente venham a continuar quando as tropas russas se concentrarem numa zona mais restrita geograficamente no Donbass”, disse Kirby esta segunda-feira, dia 11, numa conferência de imprensa.

 

 

 

 

Carreira preenchida

 

 

 

Dvornikov nasceu em 1961 na cidade de Ussuriysk, perto da costa oriental russa e próxima da fronteira com a China. Aos 17 anos alistou-se no exército russo e foi escalando a hierarquia do Distrito Militar do Extremo Oriente, a secção administrativa que, na altura, se preocupava sobretudo com potenciais incursões bélicas das forças chinesas.

 

 

Nos anos 90, foi vice-comandante de batalhão do Grupo Ocidental de Forças, o contingente militar instituído na Alemanha Oriental depois da II Guerra Mundial. À semelhança de Vladimir Putin, a experiência profissional de Dvornikov ficou imensamente marcada pelo colapso da União Soviética, o eventual estabelecimento da Federação da Rússia e a retirada da Alemanha Oriental.

 

 

Depois disso, seguiram-se várias posições nos regimentos da Sibéria, Norte do Cáucaso e Moscovo. Ao longo da carreira, participou na segunda guerra da Chechénia e especializou-se na liderança e coordenação de forças militares terrestres. Em abril de 2012, tornou-se vice-comandante do Distrito Militar Central e em 2014 alcançou a patente de coronel-general. A sua aptidão para a logística e comunicação militares e a sua provada capacidade de articular múltiplas forças no mesmo campo de batalha terá sido particularmente importante para Putin lhe confiar a atual invasão da Ucrânia – que tem sofrido sérias dificuldades de coordenação operacional.

 

 

 

Campanha militar síria

                      

 

 

Em 2015, Alexander Dvornikov foi promovido a primeiro-comandante do exército russo na Síria, tendo à sua disposição um batalhão compacto com dezenas de milhares de elementos (em 2018, Sergei Shoigu disse que, desde 2015, mais de 63 mil soldados russos já teriam combatido em território sírio).

 

 

Quando a Rússia decidiu intervir no conflito, a guerra civil síria já se estendia há quatro anos e as forças leais ao Presidente Bashar al-Assad, obrigadas a lutar em várias frentes e defender largas extensões de território, sofriam de graves problemas de moral e desgaste físico. A chegada das tropas russas foi, por isso, decisiva, e garantiu a vitória ao regime de al-Assad em alguns pontos estratégicos.

 

 

Muitos analistas militares apontaram para a brutalidade que permeou toda a campanha liderada por Dvornikov, que não hesitou em bombardear civis para alcançar os seus objetivos no terreno. Segundo um relatório do Center for Strategic and International Studies, um ‘think-tank’ americano dedicado às áreas da defesa e política externa, “o elemento mais visível desta campanha de punição foi marcado por ataques em larga escala contra infraestruturas civis e humanitárias, numa tentativa de negar recursos — incluindo comida, combustível e ajuda médica — à oposição, que tentavam, em simultâneo, corroer a vontade dos civis de apoiar grupos da oposição”. De acordo com dados do Syrian Observatory for Human Rights, uma organização humanitária baseada no Reino Unido, os bombardeamentos russos foram responsáveis pela morte de mais de 7 mil civis e 10 mil combatentes.

 

 

Pelo seu papel na Síria, o coronel-general recebeu do Kremlin o título de Herói da Federação Russa, uma das maiores honras do país, e foi consequentemente promovido a comandante do Distrito Militar do Sul, cargo que ainda ocupa até hoje e através do qual tem conduzido as operações de consolidação da anexação da península da Crimeia – que, em 2019, levaram a União Europeia a impor-lhe sanções pessoais.

 

 

Uma amostra do que pode estar para vir nos próximos dias de guerra na Ucrânia chegou na última sexta-feira, dia 8, quando um míssil atingiu uma estação ferroviária na cidade de Kramatorsk, em Donetsk. O ataque terá morto 52 pessoas e terá sido ordenado por Alexander Dvornikov.

 

 

 

TPT com: AFP//José Gonçalves Neves/Visão// Sapo// 20 de Abril de 2022

 

 

 

 

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