A actividade económica da China contraiu fortemente em abril, face às duras restrições impostas pelas autoridades do país para conter surtos de covid-19, segundo dados divulgados hoje pelo Gabinete Nacional de Estatísticas (GNE).
A produção industrial registou uma queda homóloga de 2,9%, surpreendendo os analistas, que esperavam um ligeiro avanço de 0,4% no quarto mês do ano. Face ao mês anterior, a produção industrial chinesa caiu 7,08%, destacou o GNE.
O setor automóvel registou a maior contração (-43,5%).
Tommy Wu, analista da consultora Oxford Economics, assegurou que a contração da actividade económica na China, em abril, foi a mais severa, desde o primeiro trimestre de 2020, quando o país enfrentou o primeiro surto do coronavírus.
“O bloqueio prolongado de Xangai e o seu efeito cascata na China, combinados com atrasos logísticos, devido ao bloqueio de estradas em partes do país, afetaram severamente as cadeias de fornecimento domésticas”, explicou o especialista.
As vendas a retalho, o principal indicador do consumo doméstico, que já tinha contraído em março, caiu 11,1%, em termos homólogos, em abril, ultrapassando a previsões dos analistas, que apontavam uma queda de 6,6%.
O consumo tinha já contraído 3,5% em março. O valor acumulado para 2022 cai assim para -0,2%, em relação ao mesmo período do ano passado.
A agência de estatísticas não divulgou a evolução homóloga dos ativos fixos, em abril, mas antes uma comparação intermensal, que revelou uma contração de 0,82%.
O setor imobiliário também sofreu, com uma queda de 2,7%, nos primeiros quatro meses do ano.
O desemprego nas áreas urbanas continuou a sofrer com a situação actual e subiu 0,3%, em abril, para 6,1%, uma taxa superior à que Pequim estipulou como limite para este ano (5,5%).
Os dados ilustram o crescente custo económico da estratégia de ‘zero casos’ da China, que procurou extinguir a doença por meio de bloqueios, testes em massa e isolamento de todos os infetados em centros de quarentena. A eliminação de infeções é uma prioridade para o Presidente, Xi Jinping, que procura obter um terceiro mandato este ano.
Nos últimos dois meses, dezenas de cidades e centenas de milhões de pessoas em toda a China foram colocadas sob bloqueios totais ou parciais, como parte de uma política que deve ter profundas ramificações para as cadeias de fornecimento globais.
O GNE assegurou que o “impacto de um ambiente internacional cada vez mais preocupante e complexo e de uma maior perturbação doméstica, devido à pandemia da covid-19, superou obviamente as expetativas”.
Apesar da “crescente pressão negativa” para a economia chinesa, a instituição garantiu que a “tendência geral de desenvolvimento de qualidade” mantém-se intacta e que as medidas adotadas pelas autoridades vão fazer com que as contas nacionais “estabilizem” e “recuperem”.
Wu acredita que as interrupções económicas podem durar até junho, e que a retomada da atividade vai ser “muito gradual” no início, não prevendo uma recuperação realmente significativa até ao segundo semestre.
Impacto económico de actual surto na China é dez vezes superior ao confinamento inicial de Wuhan
O impacto económico das medidas para conter os atuais surtos de covid-19 na China é dez vezes superior ao prejuízo causado pela vaga inicial em Wuhan, no início de 2020, alertou hoje um influente economista chinês.
O prejuízo, causado pelas interrupções na atividade económica, ascende a 18 biliões de yuans (2,54 biliões de euros) e afeta 160 milhões de pessoas, de acordo com Xu Jianguo, professor de Economia na Universidade de Pequim.
Em comparação, o surto inicial em Wuhan, há dois anos, causou 1,7 bilião de yuans em danos económicos e afetou 13 milhões de pessoas, apontou.
“A gravidade dos surtos este ano é mais de 10 vezes superior à de 2020 (…) em termos da população afetada e de custo económico”, apontou num seminário realizado ‘online’.
O especialista considerou que é questionável se a China vai conseguir alcançar a meta de crescimento económico oficial de “cerca de 5,5%”, estabelecida para este ano, ou mesmo igualar o crescimento de 2,3%, registado em 2020.
O país continua a praticar uma política de ‘tolerância zero’ à covid-19, que inclui o isolamento de cidades inteiras e a realização de testes em massa, sempre que um surto é detetado.
O isolamento de Xangai, a “capital” financeira do país, e de importantes cidades industriais como Changchun e Cantão, tiveram forte impacto nos setores serviços, manufatureiro e logístico.
Também Pequim, Suzhou, Shenzhen, Dongguan, que desempenham um importante papel na cadeia industrial do país, foram afetadas por medidas parciais ou totais de confinamento este ano.
Após um declínio acentuado no crescimento das exportações em abril, um número crescente de analistas alertou que vai ser difícil para o país atingir a meta de crescimento de 5,5%.
Mais economistas reduziram as suas previsões para o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) da China, em 2022. Grupos empresariais estrangeiros, incluindo a Câmara de Comércio da União Europeia, advertiram que as medidas de bloqueio estão a tornar o país um destino menos atraente para investimentos.
Xu disse que as políticas de apoio fiscal e monetário são também mais fracas do que as adotadas em 2020. As exportações e o setor imobiliário, os principais impulsionadores da recuperação económica há dois anos, também perderam força.
“Já é difícil alcançar um crescimento de 2,3% este ano e ainda mais difícil ir além dessa taxa”, disse Xu.
As autoridades estão a oferecer estímulos fiscais, por meio de gastos subsidiados em infraestruturas.
Mas Xu lembrou que a “principal razão para o arrefecimento da economia neste momento não está no financiamento social ou nas questões monetárias, mas nas medidas de prevenção e controlo da covid-19”.
O banco central da China reconheceu na segunda-feira que a economia da China está sob crescente pressão e prometeu intensificar o apoio.
Xu Shaoyuan, investigador do Centro de Pesquisa de Desenvolvimento do Conselho de Estado, reconheceu também que o surto deste ano está a causar mais danos económicos do que durante o início da pandemia, há dois anos.
“Fornecer apoio à pequenas empresas e empresas de serviços, que criam muitos empregos, e deixá-las retomar o trabalho o mais rápido possível é a chave para proteger a subsistência das pessoas”, apontou no seminário.
TPT com: AFP//MadreMedia / Lusa//Sapo// 17 de Maio de 2022