Com 138 hectares e cerca de oito mil espécies catalogadas, é um dos 10 mais importantes do mundo. Um verdadeiro regalo para os sentidos descrito por quem nunca se cansa de o visitar.
O Rio de Janeiro continua lindo. Uma deslocação profissional proporcionou-me uma semana de calor no meio do nosso inverno e um mergulho na cidade de encantos mil, agora mais próspera, limpa e arrumada, sem no entanto ter perdido aquele encanto irreverente que a caracteriza. A eterna cidade maravilhosa, cheia de encantos mil, é uma metrópole que nos convida à preguiça durante o dia e à agitação depois do pôr do sol. De dia, é difícil resistir a beber uma ou mais caipirinhas num dos cafezinhos junto à Vieira Souto e pasmar a ver quem passa, como o faziam Vinicius e Jobim, enquanto comentavam «Olha, que coisa mais linda» à tal garota de Ipanema, num êxito que se tornou global.
Deambular sem objetivo pela Visconde de Pirajá (nome extraordinário) ou pela Dias Ferreira são outros dos passeios imperdíveis, tal como dar um mergulhinho nas águas do Leblon. O Rio de Janeiro sufoca-nos com o calor e engole-nos para uma espécie de torpor irresponsável, em que o Mundo nos parece mais sensual e divertido. Consegui, porém, resistir à vontade de nada fazer e dediquei um dia inteiro à visita do mítico jardim botânico, de que já tanto tinha ouvido falar. O decreto da sua criação é elaborado em 13 de junho de 1808, a mando de D. João VI, apenas três meses depois de chegar com toda a corte a terras brasileiras.
Esta pressa de D. João VI em fazer um horto tinha antecedentes. Já desde 1783 que Alexandre Rodrigues Ferreira tinha iniciado, a mando da coroa, as célebres expedições, as famosas viagens filosóficas, para a recolha de novas espécies botânicas, que seguiam depois para estudo nos jardins botânicos de Coimbra e da Ajuda. Buscava-se a aplicação económica das plantas na medicina, alimentação e tecnologia. O local, junto à Lagoa Rodrigo de Freitas, foi escolhido pela sua beleza e abundância de água, fator que levou D. João VI a também mandar construir, mesmo junto ao futuro jardim, uma fábrica de pólvora.
Nessas ruínas, por arte das voltas e contravoltas da história, está atualmente instalado o parque infantil do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Primeiro designado por Real Horto, tendo como o único objetivo a aclimatação das plantas exóticas que poderiam vir a ser úteis, o espaço abre as portas ao público em 1819 e passa a ser também um local de lazer, ostentando a nova designação de Real Jardim Botânico. Desde essa altura, a sua vegetação luxuriante a perder de vista, com uma panóplia surpreendente de verdes e de lagos, já foi admirada por milhões de visitantes.
Vegetação luxuriante a perder de vista
Passear pelo Jardim Botânico do Rio de Janeiro é um verdadeiro regalo. O jardim ocupa atualmente uma área de 137 hectares e conta com cerca de 8 mil espécies catalogadas, o que faz dele um dos 10 jardins botânicos mais importantes do mundo. Muito bem mantido, tem o duplo aliciante de oferecer extraordinárias espécies botânicas e de ser um percurso muito bonito, atravessado pelo Rio dos Macacos, com lagos e pequenas cascatas, fontes e estufas. À entrada do jardim, reina, inequivocamente, o busto de D. João VI, esse génio ou louco que deixou Junot no Cais do Sodré literalmente a ver navios quando transferiu toda a corte através do oceano Atlântico até ao Rio de Janeiro, para aí estabelecer a nova capital do império.
Da impressionante Alameda das Palmeiras Imperiais, a recantos com vistas para o Corcovado, o jardim é muito rico e variado, oferecendo ao visitante um cactário, um canteiro de leguminosas, um orquidário, um bromeliário e um roseiral. A vegetação é luxuriante e agradecida pelo calor e humidade que o clima que o Rio de Janeiro lhe oferece. O nosso olhar europeu, mais habituado a uma vegetação atlântica, não pode deixar de pasmar perante a riqueza, variedade, e, sobretudo, estranheza das espécies, como o Artocarpus heterophylos LAM., que apenas consegui identificar quando consultei o excelente livro «Guia de Árvores notáveis – 200 anos do Jardim Botânico do Rio de Janeiro», que está à venda na livraria do centro de visitantes do jardim.
Nessa noite, fui ver o musical de grande sucesso «Tim Maia – Vale tudo», onde Tiago Abravanel, para celebrar as 500 representações da peça, convidou o público da sala cheia, a dançar e comer um bolo de aniversário no palco. Lá fui viver o «coração do meu Brasil», como diz o poema, esquecendo o cansaço das minhas pernas depois de um dia inteiro a passear pelo Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Voltarei seguramente. Quanto a isso, não tenho a menor das dúvidas.
JARDINS – SAPO VIAGENS E TURISMO
Texto: Vera Nobre da Costa