Alberto João Jardim ao seu melhor estilo. Praticamente um mês depois de ter deixado o cargo de presidente do Governo Regional da Madeira, o histórico líder madeirense falou sobre a vida política nacional – e não poupou ninguém: nem “este” PSD desprovido de coração, nem o PS “situacionista”; nem Passos, com quem teve sempre uma relação “difícil”, nem Costa que o “desanimou”.
E também não fugiu à questão das presidenciais: afinal, Jardim avança ou não para Belém? “Se aparecessem as 7500 assinaturas não ia dizer que não às pessoas”, garante. Para já, limita-se a comentar os potenciais candidatos à direita e não escondeu a preferência pelo professor Marcelo Rebelo de Sousa.
Em entrevista , o homem que comandou os destinos da Madeira durante os últimos 40 anos, admitiu que, por “uma razão de amizade” e sem fazer qualquer “avaliação objetiva dos candidatos”, prefere o professor ao economista. “O professor Marcelo é mais político (…) Gosta muito de umas abelhices e é um verdadeiro coscuvilheiro, um intriguista”. Mas não vê com maus olhos a eventual candidatura de Rui Rio: “Tenho a melhor das opiniões de Rui Rio (…) É talvez mais de ruptura com o sistema do que o professor Marcelo (…) Só que também é da área gestionária [do partido], mas é um cínico”, comentou.
Apesar de preferir comentar as eventuais candidaturas do professor Marcelo e do economista Rui Rio, o presidente Alberto João Jardim não exclui a possibilidade de avançar para Belém. Mas garante: “não mexo uma palha para ser candidato”. A menos que:
“[Primeiro], se aparecessem as 7500 assinaturas não ia dizer que não às pessoas; segundo, não tenho ilusões que só ganha quem for apoiado pelos partidos do sistema, mas, terceiro, era uma oportunidade para perguntar aos portugueses se queriam continuar como estão, em pleno socialismo, ou se aceitavam correr o risco democrático da mudança do sistema em busca de uma vida melhor, com mais independência do Estado, mais livres. Mas para tal era preciso mexer na Constituição”, afirmou.
A porta para as presidenciais não está totalmente fechada para o presidente Alberto João Jardim. Mas antes das eleições para Belém, chegam as legislativas que vão definir o próximo Governo português. E, numa altura em que estamos a poucos meses de colocar o voto na urna, o presidente madeirense ainda tem muitas dúvidas. “Não vou votar contra o meu partido. O que posso é não votar no meu partido”.
Muito crítico da atual liderança do partido e deste Governo da metrópole, Jardim revela-se “desiludido” com o rumo que os social-democratas escolheram. O antigo líder do PSD Madeira considera que o PSD perdeu o coração e tornou-se num partido “muito gestionário, e ainda muito socialista”, dominado pelos “números” e pouco preocupado com as pessoas.
“Penso que houve uma tomada de poder. Inscreveram-se pessoas, e a certa altura foi possível organizar uma maioria que tomasse o PSD. Essa maioria não correspondia àquela identidade de raiz sá-carneirista”, mais personalista, muito menos colectivista. O PSD era o partido que mais bem retratava as virtudes e os defeitos da sociedade portuguesa. Era um partido muito nacional. Ao mesmo tempo que se defendia o rigor e a disciplina, também se dizia que as pessoas individualmente não podiam ser abandonadas. E penso que se fugiu a isso”, lamentou.
Mas a maioria das críticas do madeirense tem um nome e um rosto: Pedro Passos Coelho, com quem, admitiu, sempre teve uma relação “difícil”. Mais: os dois não falaram desde que Jardim abandonou a presidência do Governo Regional, confessa.
Por isso, desafiado a comentar se acredita que Passos Coelho vai deixar o partido caso perca as eleições, Jardim não teve dúvidas. “A minha tese é esta: mesmo que não ganhe as eleições, não larga o partido. Porque o grupo que tomou conta do partido não o vai deixar largar o partido”. Mas há interesses instalados? Jardim respondeu, enigmático: “Não faço ideia. Branco é, galinha o põe, já diz o povo”.
Ainda assim, e apesar todas as críticas que faz ao PSD e ao Primeiro Ministro Pedro Passos Coelho isso não o fará optar pela alternativa socialista nas próximas eleições. E, aqui chegados, o alvo passa a ser o oposicionista e socialista António Costa, com quem tem a “melhor relação”, como fez questão de lembrar na entrevista. O problema, no entanto, é que o PS de Costa está a desanimar aqueles que acreditavam numa alternativa sólida, Jardim incluído.
“Aprecio muito o dr. António Costa, fomos colegas no Comité das Regiões, e pessoalmente tenho a ‘melhor relação’ com ele, mas estava tudo à espera que, ao conquistar a liderança, tivesse um grande impulso e que as sondagens fossem desastrosas para a coligação. Mas, pelo contrário, ainda não conseguiu descolar do pelotão como se diz no ciclismo. Ainda não fez a fuga“, comentou.
E como se justifica um arranque tão difícil? Jardim explica: “[A proposta de António Costa] não é muito diferente do atual programa da coligação, por isso digo que isto é o sistema. Gostava que aparecessem programas mais audazes, não radicais extremistas de esquerda ou de direita, mas mais audazes. Que rompessem com esta teia dos três partidos do socialismo democrático (…) [Mas], mais uma vez se confirmou a tese de que o PS, tal como os partidos socialistas europeus, é hoje um partido situacionista”.
Para o presidente Alberto João Jardim estas eleições serão “uma incógnita” e o destino de Passos e Costa, também. Uma eventual derrota de Passos e da coligação não seria “fatal” – Passos continuaria, muito provavelmente, à frente do partido e seria ele a conduzir a reedição do bloco central, hipótese que Jardim acha muito difícil de acontecer. Uma eventual vitória de Costa, colocaria os socialistas no poder e aquele que ainda é o “seu” partido na oposição. Jardim prefere, por isso, empurrar a questão para o futuro.
“Não sei ainda o que vou fazer. Não concordo com o que o PS fez ao país, não vi novidade no que o PS apresentou que me obrigue a uma inflexão de voto, mas também não concordo nada com as políticas dos últimos anos do meu partido“, disse.
MANUEL DE ALMEIDA
LUSA
Miguel Santos
Observador
16/05/2015