Francisco Pinto Balsemão defende reflexão sobre o estado da democracia no mundo

Lusa | 23 de Junho de 2014

 
Na conferência Estoril Political Forum, o antigo primeiro-ministro e presidente do grupo Impresa disse que os poderes tradicionais não querem adaptar-se às mudanças que a tecnologia veio provocar.
O ex-primeiro-ministro e presidente do grupo Impresa Francisco Pinto Balsemão defendeu hoje, na conferência Estoril Political Forum, a necessidade de uma reflexão urgente sobre o estado da democracia a nível global.

 

“Em 2014, a questão que se levanta é saber se – tendo presente a relevância qualitativa, de alguns dados novos, como a existência de três mil milhões de utilizadores da internet, dos quais dois terços vivem nos países em desenvolvimento, ou a ocorrência de revoluções de aparente sentido libertador, como as da primavera Árabe – estaremos perante uma terceira vaga de democratização ou se, pelo contrário, deveremos reconsiderar a existência dessa terceira vaga e temer um retrocesso da democratização”, questionou Pinto Balsemão.

 

O ex-primeiro-ministro, que participou nos trabalhos do primeiro dia do Estoril Political Forum 2014, afirmou que na Europa e nos Estados Unidos há “claras manchas de desassossego” com o aparecimento de partidos ou “grupos dificilmente catalogáveis” como de direita ou esquerda clássica, referindo-se aos resultados das últimas eleições europeias e nacionais.

 

“Pouco haverá de comum entre o Cinco Estrelas de Beppe Grillo (Itália) e o UKIP (Reino Unido) ou entre o Podemos de Pablo Iglesias (Espanha) e o Front Nacional de Marine Le Pen (França), mas todos eles são sintomas de uma inquietação social e cultural que põe em risco a democracia e as regras até aqui aceites para que esta funcione”, disse Balsemão, sublinhando também o alheamento dos cidadãos traduzido nos elevados números da abstenção eleitoral.

 

Para demonstrar que não há “uma terceira vaga de democratização” Balsemão usou como argumento a aceleração da revolução digital, que pode vir a ter como efeito um “pior” funcionamento da democracia de padrão ocidental.

 

Se, por um lado, apontou a questão ainda sem resposta sobre o alcance das redes sociais cada vez mais implementadas nas sociedades democráticas, Balsemão concluiu, por outro, que os poderes tradicionais não querem adaptar-se às mudanças que a tecnologia veio provocar.

 

“Os poderes democráticos tradicionais são conservadores”

 

“Os poderes democráticos tradicionais são conservadores, não querem mudar porque têm medo de perder o poder, não prestam a atenção devida e não percebem que, se a sociedade se organiza em rede, também a democracia tem de funcionar em rede. A incapacidade de estruturar a União Europeia adequando-a às realidades da globalização é um exemplo desse pernicioso, para não dizer fatal, conservadorismo”, disse Balsemão.

 

Para o ex-primeiro-ministro, são igualmente preocupantes os sistemas de vigilância a nível global, como o da Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos, denunciado em 2013 pelo norte-americano Edward Snowden e que põe em perigo as liberdades e a democracia.

 

“Há conversas que já não temos, por medo de estarmos a ser escutados, há prosas que já não escrevemos, por medo de sermos lidos, há sítios onde já não vamos, por medo de sermos filmados”, alertou Balsemão, condenando os sistemas de vigilância apoiados nas novas tecnologias.

 

O Estoril Political Forum 2014, organizado pelo Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, decorre até quarta-feira, e tem como lema as quatro décadas da revolução portuguesa (1974) e os 25 anos da queda do Muro de Berlim.

 

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