Na tomada de posse do XX Governo constitucional, Presidente afirmou que não lhe foi apresentada pela esquerda “uma alternativa estável, coerente e credível”. Apelou ao diálogo e à “responsabilidade” de todos e avisou que “sem estabilidade política, Portugal tornar-se-á um país ingovernável”.
O Presidente da República iniciou o seu discurso na tomada de posse do XX governo constitucional repetindo uma frase que disse quando deu posse ao segundo Governo, minoritário, de José Sócrates em 2009: “O Governo que hoje toma posse tem plena legitimidade constitucional para governar.” E terminou da mesma forma, afirmando que “a ausência de um apoio maioritário no Parlamento não é, por si só, um elemento perturbador da governabilidade” e que o horizonte temporal de acção de qualquer Governo “deve ser sempre a legislatura”.
Cavaco Silva justificou esta legitimidade com dois argumentos fundamentais: “É a força que ganhou as eleições que deve formar governo.” E porque “até ao momento da indigitação do primeiro-ministro [a 22 de Outubro] não me foi apresentada, pelas outras forças políticas, uma solução alternativa de Governo estável, coerente e credível”.
Com estes três adjectivos, o Chefe de Estado balizou as condições pelas quais poderá aceitar um governo liderado por António Costa se se confirmar a queda do executivo de Passos Coelho recém-empossado quando apresentar o seu programa no Parlamento, nos próximos dias 9 e 10, com a eventual aprovação de uma moção de rejeição.
Apesar de não ter apoio maioritário no Parlamento, a nova equipa governativa “deve prosseguir o esforço de diálogo e compromisso com as demais forças partidárias, buscando os entendimentos necessários à salvaguarda do superior interesse nacional”, avisou o Presidente da República, tendo em mente as duas primeiras tentativas de diálogo entre PSD/CDS e PS.
Cavaco Silva avisou que os tempos actuais são de “grande exigência” e requerem “de todos um elevado sentido de responsabilidade. Ninguém está excluído do dever de actuar de forma responsável, sendo esta uma obrigação que a todos vincula, seja qual for o seu quadrante político ou a sua orientação ideológica”.
“Ao longo da nossa História, só conhecemos verdadeiro progresso económico e social quando existiu estabilidade política. Sem estabilidade política, Portugal tornar-se-á um país ingovernável. E, como é evidente, ninguém confia num país ingovernável”, vincou o Presidente da República.
“A opção europeia”
Voltando à mensagem à esquerda que deixou no anúncio da indigitação de Passos Coelho, há uma semana, Cavaco Silva disse que os portugueses se manifestaram “de forma clara e inequívoca” nas eleições, “apoiando por esmagadora maioria a opção europeia com todas as implicações que daí decorrem”, numa alusão à votação da direita e do PS, todos pró-europeus.
Por isso, “perante os portugueses e perante os nossos parceiros da União Europeia, os agentes políticos não devem deixar dúvidas quanto à adesão de Portugal às opções fundamentais constantes do Tratado de Lisboa, do Tratado Orçamental e do Mecanismo Europeu de Estabilidade, aprovados por maioria esmagadora dos deputados à Assembleia da República”, insistiu.
Lembrou até que, se Portugal não pertencesse à União Europeia, não poderia ter contado com a “solidariedade das instituições” que emprestaram em 2011 os 78 mil milhões de euros para “evitar o colapso da economia”.
Cavaco Silva foi até mais longe nesta sua exigência europeísta do que na comunicação de 22 de Outubro, e não se cansou de advertir que é “imprescindível que não subsistam quaisquer dúvidas sobre a fidelidade do Estado português aos compromissos internacionais” e às “grandes opções estratégicas”. Fez mesmo a lista desses compromissos, enumerando o pacto de estabilidade, os pacotes legislativos six pack e two pack, o tratado orçamental, a união bancária, a negociação da parceira transatlântica de comércio e investimento, a que acrescentou as “organizações internacionais de defesa e segurança colectiva de que fazemos parte”.
O Presidente da República deixou ainda as linhas fundamentais de acção do Governo, porque é preciso, disse, “encarar a situação do país com realismo, de forma serena e objectiva”, mas também é indispensável “manter a linha de rumo”. E desenhou uma espécie de caderno de encargos para o novo Executivo baseado no “superior interesse nacional”: consolidar a trajectória de crescimento económico, preservar a credibilidade externa; fazer a consolidação orçamental; concretizar uma estratégia de combate ao desemprego e promoção de justiça social dando particular atenção “aos mais carenciados”; apoiar a actividade exportadora assente na iniciativa privada; garantir o acesso ao financiamento para o Estado, a banca e as empresas; estimular a articulação entre os parceiros sociais.
As promessas de Passos
Por seu lado, Passos Coelho reiterou que Portugal tem de cumprir as obrigações internacionais, nomeadamente as da união económica e monetária, como indispensáveis para a criação de “mais emprego e justiça social”. Compromissos que “ninguém” deve pôr em causa, “em nome de uma agenda ideológica ou de ambições políticas ou pessoais”.
O primeiro-ministro recém-empossado defendeu a necessidade de fortalecer o “diálogo e a abertura para os compromissos”, mas deixou um alerta para os “desvios precipitados” que “poderiam deitar tudo a perder”. Esses desvios são relativos às “contas certas” e ao défice que o líder do PSD pretende ver abaixo dos 3%.
O XX Governo Constitucional, liderado por Passos Coelho, tomou posse esta sexta-feira, numa cerimónia que decorreu com normalidade. Este Executivo com 17 ministros, oito dos quais transitaram do anterior elenco governativo, pode vir a ser o mais curto da democracia se PS, BE, PCP e BE vierem a chumbar o programa de Governo.
O Presidente da República Cavaco Silva deu posse ao primeiro-ministro, vice-primeiro-ministro e a 15 ministros, dois dos quais independentes: Rui Medeiros, constitucionalista, na pasta da Modernização Administrativa, e Margarida Mano, vice-reitora da Universidade de Coimbra, na Educação. Do elenco governativo, oito são caras novas.
Nas secretarias de Estado, a maioria dos titulares mantém-se. São 36 nomes, menos dois que no Governo anterior, 22 dos quais continuam nas mesmas funções, nas pastas onde se mantém o ministro, e apenas um muda de lugar: Pedro Lomba passa de secretário de Estado adjunto do ministro adjunto e do Desenvolvimento Regional para os Assuntos Parlamentares.
Maria Lopes/PUB/30/10/2015