21/02/2015
O comunicado divulgado pelo grupo dos 19 ministros das Finanças da zona euro está escrito com a habitual linguagem mais ou menos codificada da burocracia europeia. O Económico ajuda o leitor a navegar, em português corrente, pelos parágrafos do texto que define os termos do acordo entre a Grécia e os restantes 18 países do euro.
“The Eurogroup reiterates its appreciation for the remarkable adjustment efforts undertaken by Greece and the Greek people over the last years. During the last few weeks, we have, together with the institutions, engaged in an intensive and constructive dialogue with the new Greek authorities and reached common ground today.”
Tradução: Nós ganhámos. Depois das últimas semanas de anúncios do novo governo grego de fim da ligação à troika, de medidas contrárias às do programa, de fim da austeridade, de renegociação da dívida pública (com obrigações perpétuas e títulos ligados ao crescimento) e de reivindicação de metas mais baixas para o excedente orçamental, nós, 18 dos 19 ministro das Finanças do euro, ganhámos o braço-de-ferro.
“The Eurogroup notes, in the framework of the existing arrangement, the request from the Greek authorities for an extension of the Master Financial Assistance Facility Agreement (MFFA), which is underpinned by a set of commitments. The purpose of the extension is the successful completion of the review on the basis of the conditions in the current arrangement, making best use of the given flexibility which will be considered jointly with the Greek authorities and the institutions. This extension would also bridge the time for discussions on a possible follow-up arrangement between the Eurogroup, the institutions and Greece”.
Tradução: A troika continua. Estendemos o empréstimo actual, mas sob condições: a avaliação do programa da troika tem de ser terminada com sucesso. A eventual flexibilidade para mudar as condições do actual programa será “considerada em conjunto” entre as autoridades gregas e as “instituições”. Na nossa linguagem de Bruxelas, este é um duplo eufemismo – “as instituições” são a troika (palavra que desapareceu do léxico do Eurogrupo) e o trabalho “conjunto” sempre foi a forma a troika e nós, ministros das Finanças do euro, vendemos publicamente o modelo de interacção com os governos nacionais (em Portugal, enquanto a troika limitava o raio de acção do Governo, os seus técnicos diziam que quem decidia e implementava as medidas era o Governo).
“The Greek authorities will present a first list of reform measures, based on the current arrangement, by the end of Monday February 23. The institutions will provide a first view whether this is sufficiently comprehensive to be a valid starting point for a successful conclusion of the review. This list will be further specified and then agreed with the institutions by the end of April.”
Tradução: Nada está garantido. Nós, Eurogrupo, damos-vos só três dias para apresentarem uma lista de medidas de reforma baseadas nos compromissos do actual programa Será a troika a avaliar se a lista é convincente e só depois damos luz verde.
“Only approval of the conclusion of the review of the extended arrangement by the institutions in turn will allow for any disbursement of the outstanding tranche of the current EFSF programme and the transfer of the 2014 SMP profits. Both are again subject to approval by the Eurogroup.”
Tradução: Repetimos, agora mais alto: nada está garantido. Sem lista aprovada pela troika nós, o Eurogrupo, não aprovamos o envio do dinheiro da tranche, nem o repatriamento de lucros do Banco Central Europeu com obrigações gregas.
“In view of the assessment of the institutions the Eurogroup agrees that the funds, so far available in the HFSF buffer, should be held by the EFSF, free of third party rights for the duration of the MFFA extension. The funds continue to be available for the duration of the MFFA extension and can only be used for bank recapitalisation and resolution costs. They will only be released on request by the ECB/SSM.”
Tradução:O dinheiro da banca é para a banca. Não serve para outros fins, como vocês pediram. Por isso, o dinheiro vai passar do fundo helénico de estabilização financeira (designado por HFSF) e vai para o Fundo Europeu de Estabilização Europeia (o EFSF). Continua ao vosso dispor, mas só pode ser usado mediante pedido aprovado pelo Banco Central Europeu.
“In this light, we welcome the commitment by the Greek authorities to work in close agreement with European and international institutions and partners. Against this background we recall the independence of the European Central Bank. We also agreed that the IMF would continue to play its role.”
Tradução: A troika, agora com nomes. Estão aqui o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional. A Comissão Europeia, do presidente Juncker que falou em acabar com a troika, está escondida no bolo das “European institutions”.
“The Greek authorities have expressed their strong commitment to a broader and deeper structural reform process aimed at durably improving growth and employment prospects, ensuring stability and resilience of the financial sector and enhancing social fairness. The authorities commit to implementing long overdue reforms to tackle corruption and tax evasion, and improving the efficiency of the public sector. In this context, the Greek authorities undertake to make best use of the continued provision of technical assistance.”
Tradução: Vocês, Governo grego, vão poder escolher alguma da vossa austeridade (“reformas estruturais” é eufemismo para medidas duras permanentes num determinado sector). Concordamos com a vossa intenção de combater a evasão fiscal e a corrupção, bem como reformar o Estado, algo que já deveria ter sido feito há muito. Mas atenção: os nossos técnicos vão estar de olho na forma como o vocês farão isto.
“The Greek authorities reiterate their unequivocal commitment to honour their financial obligations to all their creditors fully and timely.”
Tradução: A dívida pública é para pagar.
“The Greek authorities have also committed to ensure the appropriate primary fiscal surpluses or financing proceeds required to guarantee debt sustainability in line with the November 2012Eurogroup statement. The institutions will, for the 2015 primary surplus target, take the economic circumstances in 2015 into account.”
Tradução: Percebemos que estão aflitos. Este ano podem vir a contar com uma flexibilização da meta de excedente orçamental primário, que é de 3% do PIB. Mas será uma flexibilização ligeira, cedida pelatroika, que não corresponderá à vossa “linha vermelha” de 1,5%.
“In light of these commitments, we welcome that in a number of areas the Greek policy priorities can contribute to a strengthening and better implementation of the current arrangement. The Greek authorities commit to refrain from any rollback of measures and unilateral changes to the policies and structural reforms that would negatively impact fiscal targets, economic recovery or financial stability, as assessed by the institutions.”
Tradução: A troika manda. Vocês, governo grego, não vão inverter, nem alterar medidas do programa de ajustamento que tenham impacto na economia ou nas finanças públicas – e quem avalia esse impacto é a troika.
“On the basis of the request, the commitments by the Greek authorities, the advice of the institutions, and today’s agreement, we will launch the national procedures with a view to reaching a final decision on the extension of the current EFSF Master Financial Assistance Facility Agreement for up to four months by the EFSF Board of Directors. We also invite the institutions and the Greek authorities to resume immediately the work that would allow the successful conclusion of the review.”
Tradução: Agora nós vamos aprovar isto nos nossos parlamentos. E vocês, a seguir, vão ter de trabalhar no duro. Com a troika.
“We remain committed to provide adequate support to Greece until it has regained full market access as long as it honours its commitments within the agreed framework.”
Tradução: Este acordo é para cumprir.
Bruno Faria Lopes / Económico