À semelhança de outras assembleias gerais (AG), Isabel dos Santos voltou esta quinta-feira a travar várias decisões do BPI, com destaque para a alteração de estatutos que deveria permitir a continuação de Fernando Ulrich na presidência executiva do banco.
A blindagem de estatutos do BPI, que limita os direitos de voto ao máximo de 20%, trava assim a continuação de Ulrich, que tem sido apontado como aliado do maior accionista, o Caixabank.
Sem a blindagem de estatutos, a proposta seria aprovada por mais de 75% do capital presente na AG.
Em conferência de imprensa, Fernando Ulrich fez questão de referir que o actual mandato só termina em Abril de 2017 e que a alteração dos estatutos não era dirigida a ele.
Os actuais estatutos impedem que Fernando Ulrich possa ser reconduzido para mais um mandato, por ter ultrapassado o limite de 62 anos. Com a alteração, que poderá avançar depois da desblindagem de estatutos, que se admite para breve, deixará de haver limite de idade para exercer esse cargo.
A posição de Isabel dos Santos acontece numa altura em que foram retomadas as negociaçõs com o Caixabank, com vista a ultrapassar o braço-de-ferro que mantém há longos meses por causa de várias decisões estratégicas, com destaque para a resolução da exposição a Angola, que o banco tem de reduzir por imposição do Banco Central Europeu ( BCE).
O impasse gerado sobre esta questão levou o Governo a avançar com um decreto-lei que vai facilitar a desblindagem de estatutos.
Entretanto, o Caixabank avançõu com uma oferta pública de aquisição de acções do BPI com vista a tentar obter o controlo da instituição. É a segunda tentativa, através de uma OPA, com que os espanhóis tentam garantir o domínio do banco, já que, devido aos estatutos, apesar de terem 44% do capital só votam com 20%.
O outro ponto travado foi o que permitiria ao conselho de administração deliberar sobre aumentos de capital até 500 milhões de euros.
Os accionistas aprovaram o relatório e contas de 2015 e a proposta de aplicação de resultados.
A habitual conferência de imprensa que se seguiu à AG já não contou com a presença do administrador António Domingues, entretanto escolhido para presidir à Caixa Geral de Depósitos.
Caixabank acredita em sucesso da OPA sobre BPI
O Caixabank acredita que a OPA sobre o BPI estará concluída no terceiro trimestre deste ano, uma vez que o novo decreto-lei que permite a desblindagem dos estatutos do banco português apenas entra em vigor a 1 de Julho.
O Caixabank é o maior acionista do BPI, com 44,1% do capital, e lançou nas últimas semanas uma Oferta Pública de Venda (OPA) sobre o restante capital do banco português, condicionada à eliminação dos estatutos de bloqueio na entidade financeira portuguesa, que lhe limitam os direitos de voto a 20%. Entretanto, foi publicado a 20 de Abril em Diário da República um diploma que abre caminho à desblindagem dos estatutos no BPI.
Em conferência de imprensa de apresentação de resultados do primeiro trimestre, o administrador-delegado do Caixabank, Gonzalo Gortázar, considerou este novo decreto fundamental para toda a operação. “Em algum momento terá de haver uma assembleia-geral de accionistas do BPI para decidir se levanta ou não as limitações estatutárias. De acordo com o novo decreto-lei aprovado pelo Governo português, o Caixabank não estará limitado no nosso direito de voto, portanto será uma assembleia-geral diferente da do ano passado”, disse o responsável.
Em Fevereiro do ano passado, o banco catalão já tinha apresentado uma OPA com condições semelhantes, mas que falhou quando os restantes accionistas do BPI votaram contra o levantamento do bloqueio aos direitos de voto.
“Estamos confiantes de que [desta vez] o resultado será positivo. O decreto-lei entra em vigor a 1 de Julho, portanto estamos a falar de um processo que vai levar o seu tempo. O nosso objectivo é que a operação se possa concluir no terceiro trimestre [até Setembro], mas estas operações dependem de muitos factores pelo que não se pode ser taxativo”, ressalvou.
O caso de Angola
Questionado pela Lusa sobre se o Caixabank manteve negociações com representantes do Governo português sobre este novo decreto-lei, que os accionistas angolanos da Santoro Finance descrevem como um decreto “à medida” do banco espanhol, Gonzalo Gortázar preferiu não comentar. “Prefiro não responder”, disse o responsável, acrescentando que “tem o maior respeito pelo executivo português e por Portugal, também pelo de Angola”. O Caixabank assumiu hoje que “já não é tempo de negociar com outros acionistas do BPI sobre a estrutura de capital”, uma vez que apresentou uma OPA, admitindo apenas dialogar sobre o problema da exposição ao risco de Angola.
O BPI continua exposto ao risco de Angola, uma vez que detém mais de 50% do Banco Fomento e Angola, que Gonzalo Gortázar descreveu como “uma jóia”. Caso o BPI não reduzisse a exposição a Angola até 10 de Abril, arriscava-se a pagar uma multa diária de 160 mil euros. Essa sanção foi suspensa – mas ainda sem uma decisão definitiva – com o anúncio de um pré-acordo e com a apresentação da OPA.
PSD tem dúvidas sobre diploma “feito à medida” do BPI
O vice-presidente da bancada do PSD, António Leitão Amaro, expressou “estranheza” e “dúvidas” sobre o decreto.lei da desblindagem dos estatutos da banca que “serve aparentemente a resolução de um caso concreto”, ou seja, do BPI.
“Estranhamos as palavras do primeiro-ministro sobre um acordo que não chegou a acontecer”, começou por dizer aos jornalistas Leitão Amaro, no Parlamento, referindo-se ao fracasso do entendimento entre a holding da empresária angolana Isabel dos Santos e o Caixabank, ambos accionistas do BPI.
O social-democrata disse ter as “maiores dúvidas” da situação em que o Governo “aprove uma lei para um caso concreto” e que a solução seja “suficiente” para a situação do BPI, que precisa de deixar de ter exposição a Angola.
Publicado em Diário da República esta quarta-feira, o diploma permite permite aos bancos a reavaliação periódica dos estatutos no que diz respeito a detenção e direitos de voto e entra em vigor a 1 de Julho. A lei estabelece um regime transitório que dá mais seis meses às entidades de crédito com limites de voto nos estatutos para realizarem assembleias-gerais e decidirem sobre a manutenção ou revogação desses limites.
O deputado nunca se referiu directamente ao BPI nem à empresária angolana, mas lembrou que têm vindo a ser colocadas dúvidas sobre a “imparcialidade” do Governo neste caso. Foi a própria Isabel dos Santos que acusou o executivo de ser “parcial” neste processo.
Leitão Amaro reiterou que o PSD condena a “interferência” do Governo na relação entre accionistas privados.
BPI e BCP têm até ao final do ano para decidir desblindagem de estatutos
O decreto-lei que permite uma solução para o BPI, mas que se aplica também ao Millennium bcp, foi publicado esta quarta-feira em Diário da República. O diploma que permite aos bancos a reavaliação periódica dos estatutos no que diz respeito à detenção e direitos de voto só entra em vigor a 1 de Julho e estabelece um regime transitório que dá mais seis meses às entidades de crédito, que tenham limites de voto nos estatutos, para realizarem assembleias gerais e decidirem sobre a manutenção ou revogação desses tectos. Assim, o BPI e o BCP têm de se pronunciar até ao dia 31 de Dezembro.
Este novo decreto-lei, que, tal como o PÚBLICO noticiou, criou tensão no Governo, estabelece ainda que, caso não exista “uma deliberação válida e eficaz” em assembleia geral sobre a questão da blindagem dos direitos de voto até ao final deste ano “caducam automaticamente, nessa data, salvo decisão judicial, os limites à detenção ou ao exercício dos direitos de voto em vigor”. Ou seja, a desblindagem é aplicada por ausência de decisão.
Segundo o diploma, se a convocação da votação for feita pelo conselho de administração, a proposta deixa de estar sujeita às limitações de voto em vigor. Isto é, no momento de decisão sobre a desblindagem deixa de haver restrições, podendo cada accionista votar de acordo com o seu peso no capital. No caso do BPI, isso significa que o Caixabank iria votar com 44% do capital, deixando de estar limitado à blindagem de 20% que está em vigor. Actualmente, devido aos estatutos, o maior accionista tem tanto peso como a Santoro, de Isabel dos Santos, que controla 21% do banco, directa e indirectamente (18,6% via Santoro e 2,7% via BIC Angola).
O conselho de administração do BPI já tinha anunciado, a 4 de Fevereiro, que aprovara uma iniciativa da comissão executiva, liderada por Fernando Ulrich, de submeter à assembleia geral uma proposta de alteração dos estatutos do banco “com vista à eliminação do limite estatutário à contagem dos votos”. A referida reunião magna de accionistas ficou sem data marcada. Conforme explicou então o conselho de administração, liderado por Artur Santos Silva, “a existência de uma limitação estatutária à contagem de votos” poderia condicionar o “envolvimento de actuais ou futuros accionistas”.
Mesmo sem blindagem, uma decisão sobre alterações aos estatutos requer uma maioria qualificada, ou seja, de dois terços. Mas este universo refere-se ao capital presente na assembleia geral.
Nesta altura, e num momento em que está a lançar uma nova OPA sobre o BPI, bastava apenas ao Caixabank ter a Allianz do seu lado para somar 52,4% do total de votos que marcariam presença nessa assembleia geral.
O sucesso da operação do Caixabank depende de factores como a detenção da maioria do capital e a eliminação da limitação ao exercício dos direitos de voto “na data de encerramento da oferta”. De acordo com o calendário indicativo do Caixabank, a OPA deverá ter as devidas autorizações dos reguladores em Agosto e Setembro, para depois se proceder ao seu registo oficial. A expectativa do grupo catalão é de concluir a operação até ao final de Setembro.
A Santoro já se pronunciou sobre esta iniciativa do Governo (aprovada em Conselho de Ministros na passada quinta-feira, sem que tal fosse comunicado), que foi depois promulgada pelo Presidente da República. A nota da empresa de Isabel dos Santos, divulgada já depois do anúncio da ruptura nas negociações com o Caixabank sobre o futuro do BPI e a exposição a Angola (que o BCE diz ser excessiva), afirmava que o diploma era uma “medida historicamente sem precedentes e declaradamente parcial”.
Quanto ao caso do BCP, este também tem os estatutos blindados a 20%, mas nenhum accionista tem uma posição acima desse valor. O maior investidor é a Sonangol, com 17,8%. Esta quarta-feira, as acções do BPI continuaram com o preço abaixo do oferecido pelo Caixabank (1,113 euros) ao descer 0,45% para 1,095 euros. Já o BCP subiu 11,17% para 0,038 euros.
No diploma em causa, o Governo defende estar a tomar uma “solução de equilíbrio” que “atribui aos accionistas de instituições de crédito a possibilidade de periodicamente reavaliarem a justificação dos limites estatutários em matéria de detenção e exercício dos direitos de voto”. E estabelece um período de reavaliação “de cinco em cinco anos”. Esta proposta de revisão temporal já tinha sido feita pelo regulador do mercado de capitais, a CMVM, mas aplicava-se a todas as empresas e não apenas às sociedades financeiras.
Hoje, o vice-presidente da bancada do PSD, António Leitão Amaro, disse ter as “maiores dúvidas” da situação em que o Governo “aprove uma lei para um caso concreto” e que a solução seja “suficiente” para a situação do BPI.
Marcelo promulgou diploma que facilitará desblindagem de estatutos do BPI
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, já deu luz “verde” ao diploma do Governo que vai facilitar as desblindagens de estatutos das empresas cotadas, uma iniciativa legislativa de âmbito abrangente, mas que pretende resolver a situação do BPI, depois da ruptura das negociações entre os dois maiores accionistas.
A blindagem de estatutos limita os direitos de voto a uma determinada percentagem do capital social, que no caso do BPI é de 20%. Mesmo que um accionista tenha 44% do capital social do banco, como é o caso dos espanhóis do CaixaBank, só pode votar com os 20%. Já Isabel dos Santos, com uma participação de 18,6%, tem conseguido travar várias propostas do maior accionista e da gestão do banco.
Na falta de acordo, o Caixabank anunciou esta segunda-feira uma Oferta Pública de Aquisição (OPA) sobre as acções do BPI que ainda não controla, que está condicionada à desblindagem de estatutos.
O diploma aprovado no Conselho de Ministros da última quinta-feira seguiu em segredo (já não constava do comunicado oficial daquele órgão) para o Presidente da República, que não atrasou a sua aprovação, o que facilita a vida ao Governo, que quer a legislação em vigor a 1 de Julho. O decreto-lei deverá ser publicado em Diário da República nos próximos dias, permitindo conhecer melhor os contornos da alteração, designadamente o período em que tem de ocorrer a reavaliação dos accionistas.
Numa nota publicada no seu site, a Presidência da República justifica a promulgação do diploma atendendo à sua razão de ser, “em particular o reforço da solidez do sistema financeiro” e “ao facto de corresponder à solução defendida pelas duas entidades reguladoras”, o Banco de Portugal e a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).
A nota acrescenta ainda que entre a última pronúncia dos reguladores e a concretização da iniciativa legislativa decorreu “tempo suficiente para não interferir em eventual operação em curso” e destaca a circunstância “de só entrar em vigor em 1 de Julho e a deliberação das assembleias gerais poder ocorrer até 31 de Dezembro”.
Assim, “tendo presente o interesse nacional”, Marcelo Rebelo de Sousa “acabou de promulgar o Decreto-lei que procede à 41.ª alteração do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (…), visando conferir aos accionistas de instituições de crédito a possibilidade de reavaliarem periodicamente a justificação dos limites estatutários em matéria de detenção e exercício dos direitos de voto”.
O Presidente da República, que tem acompanhado de perto a situação do BPI, ainda manifesta alguma esperança em novo entendimento entre os dois maiores accionistas. Segundo a Lusa, durante uma visita à Escola José Gomes Ferreira, em Lisboa, Marcelo afirmou aos jornalistas que o diploma “foi retido” durante um mês porque o Governo e a Presidência da República quiseram primeiro tentar que houvesse acordo entre accionistas. Acrescentando que esta legislação tem, ainda assim, uma vantagem, que é a de só entrar em vigor no dia 1 de Julho deste ano, o que “ainda dá um tempo” que pode ser aproveitado para “haver uma solução”.
O aspecto mais importante da reavaliação periódica dos limites, em assembleia geral de accionistas (AG), pende-se com o facto de, nessa votação, deixar de existir qualquer limitação de direitos. Ou seja, mesmo que os estatutos já se encontrem blindados, nessa AG cada acção corresponde a um voto. Será, ao contrário do que acontece agora, uma AG desblindada.
Com esta alteração, que já tinha sido proposta pela CMVM, os accionistas poderão continuar a manter a blindagem dos estatutos, se esse for o interesse de uma maioria qualificada.
No sector financeiro, e tal como o BPI, também o BCP tem os direitos de voto limitados a 20%.
A decisão de blindagem é normalmente acordada entre grandes accionistas para defenderem os seus interesses, designadamente o de poder travar Ofertas Públicas (OPA) hostis.
Em Portugal e para além dos dois bancos, há mais quatro empresas cotadas com estatutos blindados. Trata-se da Compta (10%), da Inapa (33%) e ainda da EDP (25%) e da REN (25%). Nestes dois últimos casos, as limitações decorrem de constrangimentos resultantes do quadro da privatização de empresas prestadoras de serviços públicos.
TPT com: Albert Gea/Reuters/Lusa/AFP/Rosa Soares/ Rui Gaudêncio/Sofia Rodrigues/ Liliana Valente e Sofia Rodrigues/ Público/Patrícia de Melo Nogueira/ Rosa Soares/Raquel Martins/Cristina Ferreira/AFP// 28 de Abril de 2016