O ministro da Defesa, José Azeredo Lopes, demitiu-se do Governo na sequência da polémica de Tancos

A polémica com Tancos e, em particular, as suspeitas de que o ministro teria conhecimento do encobrimento aumentaram a pressão para a demissão do ministro.

 

 

“Não podia, e digo-o de forma sentida, deixar que, no que de mim dependesse, as mesmas Forças Armadas fossem desgastadas pelo ataque político ao ministro que as tutela”, referiu Azeredo Lopes, na carta enviada ao primeiro-ministro e a que o The Portugal Times teve acesso.

 

 

Na carta, o ministro nega novamente que tenha tido conhecimento “direto ou indireto, sobre uma operação em que o encobrimento se terá destinado a proteger o, ou um dos, autores do furto”.

 

 

Quanto ao momento em que decidiu sair, Azeredo Lopes explicou que quis aguardar pela finalização da proposta de Orçamento do Estado para 2019 para “não perturbar” esse processo com a sua saída.

 

 

António Costa já explicou através de uma nota enviada à comunicação social que o pedido de demissão lhe foi apresentado em termos que não podia recusar: “pela sua dignidade, honra e bom nome e para preservar a importância fundamental das Forças Armadas como traves-mestras da nossa soberania e identidade nacional no quadro de uma sociedade democrática moderna”.

 

 

No comunicado, o primeiro-ministro agradece publicamente “a dedicação e o empenho” com que Azeredo Lopes serviu o país.

 

 

Ao que o Observador apurou, a carta de demissão foi entregue esta sexta-feira ao primeiro-ministro e António Costa aceitou de imediato o pedido. Os dois estiveram juntos ainda esta tarde, na cerimónia de tomada de posse da nova procuradora-geral da República, no Palácio de Belém.

 

 

Foi também nesta tarde que António Costa informou Marcelo Rebelo de Sousa, de acordo com a nota entretanto publicada no site da Presidência da República. “O primeiro-ministro informou esta tarde o Presidente da República do pedido de demissão do Ministro da Defesa Nacional, propondo a sua exoneração”, pode ler-se.

 

 

De acordo com a mesma nota, o nome para substituir Azeredo Lopes não foi ainda comunicado ao Presidente da República, tendo Marcelo Rebelo de Sousa aceitado a proposta de exoneração e ficado a aguardar a proposta de nomeação do sucessor. Costa terá comunicado ao Chefe de Estado que o novo ministro da Defesa será proposto “oportunamente”.

 

 

Apesar de a notícia ter sido avançada por fonte do ministério da Defesa à agência Lusa, de acordo com informações recolhidas pelo Observador, a notícia da demissão de Azeredo Lopes caiu com surpresa no ministério onde, mesmo em plena polémica, se estava a trabalhar com normalidade e já com a agenda da semana seguinte a ser ultimada.

 

De resto, aos orgãos de comunicação social, tinham sido já distribuídos os planos para a próxima segunda-feira, onde Azeredo Lopes era esperado no Regimento de Infantaria 13, em Vila Real, e na Escola dos Serviços, na Póvoa do Varzim. Já não vai cumprir esse ponto na agenda, nem estará presente este sábado no Conselho de ministros extraordinário para aprovar o Orçamento do Estado para 2019, que é entregue na segunda-feira na Assembleia da República.

 

 

Quanto ao novo nome para ocupar a pasta agora deixada vaga no ministério da Defesa, não deverá tomar posse antes da próxima semana, até porque a agenda do governo para sábado está ocupada com o conselho de ministros. A oposição já tinha pedido várias vezes a saída do ministro, mas António Costa tinha até agora segurado Azeredo Lopes.

 

 

 

Partidos advertem que demissão é tardia e não apaga preocupação nem esclarece dúvidas

 

 

 

Marco António continua preocupado e alerta que “ainda não se sabe onde estão todas as armas roubadas”. Bloco alerta que há “muitas perguntas sem resposta”. CDS e PSD dizem que demissão é “tardia”.

 

Para os partidos da oposição e parceiros de “geringonça” do executivo socialista a demissão de Azeredo Lopes não resolve os problemas de Tancos, embora muitos a tenham considerado “inevitável” e registem o facto de o Governo assumir as responsabilidades políticas do que correu mal. Apesar da saída do ministro da Defesa, os partidos advertem que há armas roubadas dos paióis que ainda não apareceram e que persistem muitas dúvidas sobre a forma como decorreu o processo.

 

 

 

A carta de demissão do ministro da Defesa na íntegra

 

 

 

Hoje, sexta-feira, dia 12 de Outubro, Azeredo Lopes entregou ao Primeiro-Ministro a carta de demissão onde explica os argumentos que o levaram a tomar esta decisão. O The Portugal Times revela-lhe a carta na íntegra.

 

 

Senhor Primeiro-Ministro,

 

Tem sobejo conhecimento das acusações que me têm sido dirigidas a propósito de informação de que disporia a respeito da forma como foi “achada” ou “recuperada” parte significativa do material militar furtado em Tancos em finais de Junho do ano transato. Desmenti e desminto, categoricamente, qualquer conhecimento, direto ou indireto, sobre uma operação em que o encobrimento se terá destinado a proteger o, ou um dos, autores do furto, numa espécie de contrato de impunidade.

 

 

Desmenti e desminto, categoricamente, qualquer conhecimento, direto ou indireto, sobre uma operação em que o encobrimento se terá destinado a proteger o, ou um dos, autores do furto, numa espécie de contrato de impunidade.

 

 

Acreditou V. Ex.ª na minha palavra, nunca pôs em causa a minha honorabilidade: isso é algo que aqui registo e não esquecerei. Realmente, mais do que qualquer outra coisa, prezo a minha dignidade, honra e bom nome, porque são eles que nos definem, perante nós e perante os outros.

 

 

Senhor Primeiro-Ministro, tenho convicções muito fortes sobre a importância fundamental das Forças Armadas na nossa sociedade, vendo-as como uma das traves-mestras da nossa soberania, identidade nacional e no quadro de uma sociedade democrática moderna. Não podia, e digo-o de forma sentida, deixar que, no que de mim dependesse, as mesmas Forças Armadas fossem desgastadas pelo ataque político ao Ministro que as tutela em virtude da acusação acima referida.

 

 

Não podia, e digo-o de forma sentida, deixar que, no que de mim dependesse, as mesmas Forças Armadas fossem desgastadas pelo ataque político ao Ministro que as tutela em virtude da acusação acima referida.

 

 

Pareceu-me porém que, estando a ser ultimado o processo de elaboração da proposta de Orçamento de Estado, que amanhã se conclui em Conselho de Ministros, era meu dever grave não o perturbar com a minha saída do Governo.

 

Senhor Primeiro-Ministro, foi isso que fiz.

 

 

Posso hoje dizer que, respeitado esse compromisso, saio de consciência tranquila e com a serenidade de quem deu o seu melhor nas funções que exerce, e também com a vívida noção do orgulho de ter podido participar no seu Governo, ao serviço do País e dos nossos concidadãos.

 

 

Assim, pelas razões que sumariamente expus, apresento-lhe formalmente o meu pedido de demissão das minhas funções como Ministro da Defesa Nacional.

 

Lisboa, 12 de Outubro de 2018″

 

 

 

Oficiais das Forças Armadas dizem que demissão de ministro “não resolve os problemas”

 

 

 

O presidente da Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA), António Mota, afirmou esta sexta-feira que a demissão do ministro da Defesa não resolve os problemas, referindo que o seu sucessor terá muitas questões para resolver.

 

“O ministro, para tomar uma posição destas que é de força e marcante, terá ponderado muito bem todos os elementos que tem na sua posse. Não nos incomoda a questão da demissão do ministro, porque não temos nada contra o cidadão Azeredo Lopes, temos é contra as políticas que tem vindo a seguir”, começou por dizer, em declarações à agência Lusa, António Mota.

 

 

Segundo o presidente da AOFA, o sucessor de Azeredo Lopes terá de resolver vários problemas.

 

 

“A demissão do ministro não resolve coisa nenhuma, os problemas mantêm-se e têm de ser resolvidos por quem vier a seguir. Estava desgastado politicamente, evidente que sim, mas em muitos casos por culpa própria. Deixou chegar determinadas situações a pontos inacreditáveis”, destacou.

 

 

Sobre o caso de Tancos, António Mota referiu que existem “muitas declarações antagónicas”, salientando que é essencial que sejam apuradas todas as responsabilidades.

 

 

“É obvio que alguém está a faltar à verdade, mas vamos esperar que as instâncias judiciais façam o seu trabalho. Tudo isto está mal contado, existem muitas coisas que não batem certo. A demissão do ministro não resolve coisa nenhuma em tudo o que é importante esclarecer, é quase indiferente ter-se demitido ou não”, frisou.

 

 

António Mota insistiu que é importante esclarecer todas as situações, de modo a que os portugueses possam recuperar “alguma da confiança perdida nas Forças Armadas”, abalada perante a sucessão de casos que têm criado um “clima de suspeição”.

 

 

“Os problemas mantêm-se e vamos continuar a pressionar para ver tudo esclarecido, todas as responsabilidades apuradas, sejam militares ou não, no caso de Tancos e noutros casos que têm ensombrado as Forças Armadas”, afirmou.

 

 

Sobre o sucessor de Azeredo Lopes, o presidente da AOFA afirmou ser importante que tenha capacidade de diálogo.

 

 

“Não sabemos quem vai entrar, mas o que nos importa é que as políticas se alterem, que seja uma pessoa com outro tipo de sensibilidade e que tenha capacidade de diálogo, pois estamos abertos e interessados no diálogo, para tentar resolver os problemas”, explicou, garantindo que os militares querem tudo esclarecido “doa a quem doer”.

 

 

O ministro da Defesa, Azeredo Lopes, demitiu-se hoje do Governo para evitar que as Forças Armadas sejam “desgastadas pelo ataque político” e pelas “acusações” de que disse estar a ser alvo por causa do processo de Tancos, segundo a carta enviada ao primeiro-ministro, António Costa, e a que a agência Lusa teve acesso.

 

 

O furto de material militar dos paióis de Tancos – instalação entretanto desativada – foi revelado no final de junho de 2017.

 

 

Entre o material furtado estavam granadas, incluindo antitanque, explosivos de plástico e uma grande quantidade de munições, tendo sido anunciada a sua recuperação em outubro, na Chamusca, distrito de Santarém.

 

 

A Polícia Judiciária deteve, em 25 de setembro, no âmbito da Operação Húbris, que investiga o caso da recuperação das armas furtadas em Tancos, o diretor e outros três responsáveis da Polícia Judiciária Militar, um civil e três elementos do Núcleo de Investigação Criminal da GNR de Loulé.

 

 

O Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa decretou prisão preventiva para o diretor da Polícia Judiciária Militar, Luís Vieira, e para o civil.

 

 

No dia em foram conhecidas estas detenções, o CDS-PP anunciou a criação de uma comissão parlamentar de inquérito, que vai ser discutida na Assembleia da República em 24 de outubro e votada dois dias depois, tendo a sua aprovação garantida.

 

 

 

TPT com: AFP//Miguel Lopes/Lusa// Pedro Benevides/Pedro Raínho/João Porfírio//Rui Pedro Nunes/José Pedro Mozos//Rita Tavares//Rui Pedro Antunes//Observador// 12 de Outubro de 2018

 

 

 

 

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