Malditas Dores de Cabeça

23/02/2015

 
Não têm cura mas as atitudes e os comportamentos certos permitem controlá-las. Saiba como!

 
São o grande pesadelo de grande parte da população. De mansinho, quase sem dar por isso, a dor vai-se instalando.

 
Ainda tem esperança que seja só um incómodo passageiro e que não seja preciso tomar um comprimido.

 
Erro fatal, a dor começa a dominar a cabeça e dentro de pouco tempo terá dificuldade em concentrar-se no que quer que seja.

 
A culpa, como em tantos outros aspectos, é difícil de atribuir. Pode ter sido aquela refeição mais condimentada, o stress para enfrentar a fila de trânsito ou então um pouco de tudo e de nada. A verdade é que, embora sejam poucos os que se podem gabar de nunca ter tido uma cefaleia (estima-se que 90 por cento da população mundial já teve uma dor de cabeça em alguma altura da vida), a ciência médica ainda não encontrou uma cura para o problema. Mas não desanime, é possível, se não extingui-las, pelo menos minimizá-las. Com a ajuda de Sara Vieira, neurologista no Hospital de São João, no Porto, a saber viver explica-lhe como.

 

 
Doença ou sintoma

 

 
É frequente ouvir-se dizer que as dores de cabeça não são uma doença mas sim um sintoma, o que não corresponde bem à verdade. O facto é que existem cefaleias primárias, que não traduzem outros problemas de saúde, constituindo por si só uma patologia; e existem cefaleias secundárias, que representam um sintoma de doenças do sistema nervoso e de outros órgãos (como por exemplo gripe, hipoglicemia ou pequenos traumatismos cranianos) ou de outras mais graves, como meningites, tumores ou hemorragias por ruptura de aneurismas.

 
«Felizmente, mesmo que tenha um impacto negativo na vida do doente, pela frequência e intensi-dade, a cefaleia só raramente (quatro por cento dos casos) corresponde a lesão grave intracraniana ou a outra doença que implique cuidados médicos céleres», esclarece Sara Vieira, neurologista. Mas atenção, «quando o doente tem recorrentemente episódios de dor de cabeça, que lhe causam desconforto e angústia, interferindo na qualidade da sua vida, deverá recorrer ao médico assistente», aconselha.

 
Sentimentos reprimidos

 
Segundo a Classificação Internacional de Cefaleias, existem mais de 14 tipos de dores de cabeça, divididos, também eles, em mais de 200 manifestações diferentes. Aquelas que mais atingem a população mundial são as denominadas cefaleias de tipo tensão. Como o próprio nome indica, são originadas por situações de stress que contribuem para a acumulação de tensão nos músculos do pescoço, ombros e cabeça.

 
«Geralmente, a pessoa relaciona a dor com a privação de sono, com a omissão de alguma refeição ou do habitual café ou com o stress diário (a pressa em executar tarefas do dia-a-dia, como levar os filhos à escola)», informa Sara Vieira. A dor é moderada sobre os olhos ou a nuca, ou então uma sensação de pressão forte (como uma fita apertada à volta da cabeça), tende a manifestar-se de manhã ou às primeiras horas da tarde e piora ao longo do dia. «Quando é mais frequente ou crónica, pode estar associada a ansiedade ou depressão, que terão de ser tratadas», alerta a médica.

 
Temíveis enxaquecas

 

 

Para além de uma dor forte que surge muitas vezes sem aviso prévio, a enxaqueca faz-se acompanhar de outros sintomas altamente incapacitantes. É comum quem sofre de enxaqueca ter de se refugiar num local calmo e até deitar-se durante umas horas, dada a «associação a intolerância à luz, barulho, certos cheiros, náuseas e/ou vómitos», refere a neurologista. «É mais frequente na mulher, na idade reprodutiva, sabendo-se que há relação com as variações hormonais das diferentes fases do ciclo menstrual», continua Sara Vieira.

 

 
Embora não se conheça o que a origina, sabe-se que resulta da activação dos receptores da dor após a contracção, seguida da dilatação das artérias que irrigam o cérebro. As pessoas com enxaqueca serão mais sensíveis a certos estímulos (ambientais ou do seu próprio organismo). Daí que seja comum falar-se em cefaleia ou dor de cabeça de fim-de-semana ou do orgasmo. No entanto, importa referir que este tipo de dor de cabeça tem um carácter hereditário e só se manifesta em pessoas susceptíveis.

 
Os homens também sofrem

 

 

Versão masculina

 

 
Há uma categoria específica de cefaleias que atinge mais o sexo masculino, as cefaleias em salva.

 
Descritas como o tipo de dor de cabeça mais forte, parecem estar relacionadas com uma disfunção no núcleo do hipotálamo e há estudos que as associam aos distúrbios do sono, como a apneia e o ressonar.

 
Não reagem aos analgésicos comuns, pelo que é importante aconselhar-se com o especialista sobre a melhor forma de proceder.

 
A inalação de oxigénio garante uma melhoria da dor em 90 por cento dos casos, mas é necessário o tratamento preventivo simultâneo com medicamentos apropriados, que pode prolongar-se por dois a quatro meses, ou seja, enquanto durarem as crises.

 
«Embora muitos doentes reconheçam os factores que precipitam ou agravam as cefaleias que têm habitualmente, sejam elas de tipo tensão, enxaquecas ou outras, há situações médicas que contribuem para o aparecimento das mesmas e que devem ser excluídas, como casos de infecções da cavidade oral ou alterações da acuidade visual», revela a neurologista.

 
Hábitos nefastos

 

O estilo de vida tem influência não só na prevenção, como na gestão das crises dos vários tipos de dor de cabeça. Sabe-se que o uso de computadores portáteis pode estimular crises devido à alteração de postura e à consequente sobrecarga ao nível dos músculos do pescoço que esses aparelhos proporcionam. Já os telemóveis, que muitos pensam causarem crises devido às radiações, parecem estar associados a factores desencadeantes psicológicos.

 
O tabagismo é outro aspecto que potencia as dores de cabeça de tensão: um neurologista espanhol constatou que os fumadores têm o dobro da probabilidade de desenvolverem cefaleias, mesmo se só consumirem cinco cigarros por dia. Tentar manter as rotinas também parece ser útil pois, como explica Sara Vieira, «muitas pessoas têm a frustrante cefaleia de fim-de-semana uma vez que, após a semana de trabalho, com pouco tempo para dormir e alimentar-se correctamente, optam por pôr o sono em dia, não tomando o pequeno-almoço e fazendo privação da dose rotineira de cafeína».

 
Sem cura, mas com tratamento

 
A melhor forma de identificar o tipo de dor é através da história clínica do paciente e de um exame neurológico, em que o especialista vai analisar diferentes funções do cérebro (cerebelo, tronco cerebral), medula, raízes e plexos nervosos, placa motora e músculos. Desta forma, o médico conseguirá determinar o tratamento adequado para cada caso específico que, em algumas situações, para além de medidas para actuar durante uma crise, assenta numa estratégia preventiva.

 
No entanto, antes de recorrer ao uso de medicamentos analgésicos que, por vezes, contribuem para agravar o problema, o doente deve «evitar os factores identificados como facilitares ou precipitantes da cefaleia, regularizar os horários de sono e das refeições (não saltar refeições e ter presente que hidratação é importante), realizar actividade física regular (privilegiar as caminhadas, natação e ioga), corrigir posturas incorrectas no local de trabalho, por utilização de mesas e cadeiras desajustadas ou condições de luminosidade insuficientes», aconselha a especialista.

 

 

As dores de cabeça também podem ser estimuladas por alimentos que contêm substâncias vasodilatadoras, como é o caso do vinho tinto, dos ovos, dos produtos lácteos, dos citrinos, da carne, do trigo, da noz e do amendoim, do tomate, da banana, da maçã, do milho, da cebola, do queijo, do morango, do marisco e dos molhos.

 

 

Como identificar se a sua dor de cabeça é uma das mais comuns.

 
Existem mais de 14 tipos de dor de cabeça mas as três principais assumem contornos característicos que as permitem distinguir:

 
Dor de cabeça de tipo tensão

 
Este tipo de dor caracteriza-se por sensação de peso, pressão, aperto ou moinha na zona bilateral, frontal, na nuca ou no topo da cabeça. Surge entre os 20 e os 50 anos.

 

 
Esta deriva frequentemente de factores como o stress e o cansaço e o excesso de trabalho e de esforço muscular pode agravar a dor. Náuseas e fobias à luz ou a ruídos são os sintomas mais comuns. A duração deste tipo de dor pode variar entre algumas horas a dias.

 
Enxaqueca

 
Pode surgir logo na adolescência. A enxaqueca aparece geralmente entre os 15 e os 40 anos e tem história familiar. Caracteriza-se por uma sensação pulsátil unilateral ou bilateral. Existem diversos factores que podem estar na origem desta dor. O stress, a menstruação, o tipo de alimentação, as alterações do ritmo de sono, o tipo de exercício físico praticado ou as mudanças de tempo são alguns exemplos. Movimentos e esforços físicos podem agravar o estado do doente. A frequência deste tipo de dor é variável e pode ir de poucas horas a três dias. Os sintomas mais comuns são as náuseas, os vómitos, a fobia à luz, ao ruído e/ou cheiros.

 
Dor de cabeça em salvas

 

 
Tal como a enxaqueca, a dor de cabeça em salvas caracteriza-se por uma dor pulsátil mas esta actua unilateralmente e num sentido orbital e temporal. Aparece entre os 20 e os 40 anos e não tem história familiar. Este tipo de dor de cabeça decorre somente durante as salvas e pode surgir depois do consumo de álcool. Determinadas épocas do ano como a Primavera e o Outono podem agravar a dor.

 

 
Tem uma duração inferior aos outros tipos de dor de cabeça, durando, geralmente, pouco mais de 30 minutos mas pode ocorrer várias vezes ao dia, durante quatro ou oito semanas. Olhos vermelhos e lacrimejantes, congestão e corrimento nasal, queda da pálpebra do mesmo lado da dor são os principais sintomas.

 

 
Texto: Sandra Diogo com Sara Vieira (neurologista)

 
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