A recente descoberta de uma rede de corrupção política envolvendo altas figuras do Estado Português volta a chamar a atenção para a articulação entre o crime organizado e responsáveis da administração pública do Estado Português. Mas Portugal nem é dos piores, na lista negra da corrupção europeia…
A corrupção é responsável por um rombo anual de 120 mil milhões de euros na economia europeia – concluiu o mais recente Eurobarómetro dedicado às más práticas no espaço da UE. A generalidade dos países-membros tem em vigor legislação punitiva das práticas corruptas, mas os principais responsáveis acabam muitas vezes por escapar entre os intervalos da chuva.
A nível europeu, a corrupção preocupa mais de três quartos dos cidadãos, enquanto mais de metade considera que o número de casos aumentou significativamente nos últimos três anos. Quer se trate de corrupção política, corrupção por grupos criminosos organizados, corrupção entre privados, corrupção local e regional ou abuso de poder para obtenção de vantagens pessoais, o fenómeno está hoje generalizado na Europa. E, para além de constituir um cancro ético-moral inaceitável, tem sérias consequências na economia da UE.
Quatro em cada cinco cidadãos da Europa consideram que a corrupção é um dos problemas mais sérios dos seus países. “Esta realidade sublinha a necessidade de se restaurar a confiança na força efectiva das políticas anti-corrupção”, reconhece o Eurobarómetro.
As práticas corruptas na Europa têm muitas vezes um escopo transnacional e encontram-se directamente ligadas a outras formas de crime, como o tráfico de drogas ou até de pessoas, o que reforça a convicção de que leis anti-corrupção com carácter apenas nacional não conseguirão atacar eficazmente o problema.
O estudo do Eurobarómetro serviu de preparação ao Relatório Anti-Corrupção da União Europeia, elaborado pela Comissão de Bruxelas e entretanto entregue ao Parlamento de Estrasburgo para debate e adopção de medidas legislativas urgentes.
SUBORNOS E “CUNHAS”
Tanto no que se refere à percepção dos actos de corrupção como à prática corrente de suborno, as Monarquias do Norte da Europa são, segundo o Eurobarómetro, as “mais limpas” da União. O estudo confirma que na Dinamarca e na Suécia (bem como no Luxemburgo e na Finlândia) menos de 1% dos inquiridos admite ter de pagar subornos. Nestes países, a consciência da existência de corrupção é de, respectivamente, 20%, 44 %, 42 % e 29% – bem abaixo da média da União Europeia, que se cifra em 74%.
A meio da tabela surgem a Alemanha, Holanda, Bélgica, Estónia e França, com o dobro dos casos de suborno (2%) mas com apenas 50% dos cidadãos convencidos de que a corrupção é uma prática generalizada.
A expectativa de suborno sobe aos 5% na Áustria, aos 13% na Hungria, aos 14% na Eslováquia e aos 15% na Polónia. Em alguns destes países, a maioria dos casos de suborno verifica-se no sector dos cuidados de saúde, onde, para se ser atendido, é essencial “meter empenhos”. Em Portugal (que ombreia com a Eslovénia, Espanha e Itália), o pagamento de subornos directos é considerado “raro” (pouco mais de 1%), mas as práticas de corrupção em geral são referidas por 90% dos inquiridos.
A lista negra dos países onde o suborno é frequente e significativo tem à cabeça a Lituânia, Bulgária, Roménia e Grécia, onde os índices alcançam 29%. Nestes mesmos países, a generalização da corrupção é atestada por 99% dos inquiridos. No conjunto da União Europeia, 76% dos cidadãos reconhecem que a corrupção é generalizada e 73% admitem que o suborno e o uso de “cunhas” é vulgar nos serviços públicos.
O DINHEIRO DOS PARTIDOS
O financiamento das actividades dos partidos políticos é um dos campos onde a corrupção se revela recorrente. Cerca de dois em cada três europeus (67%) reconhecem que esse financiamento “não é suficientemente transparente ou suficientemente controlado” pelas autoridades.
Este problema assume proporções mais preocupantes em Espanha (87%), Grécia (86%) e República Checa (81%). Pelo contrário, nos países escandinavos o financiamento irregular ou ilegal dos partidos políticos preocupa 56% dos finlandeses, 55% dos suecos e 47% dos dinamarqueses.
Em termos globais, apenas cerca de um quarto dos europeus considera que os esforços dos governos nacionais têm tido algum resultado no combate a esta forma de corrupção e que o número de casos em tribunal é satisfatório. Mas 77% pensam exactamente o contrário…
No que se refere, concretamente, a Portugal, a avaliação da União Europeia é moderada. O nosso país, diz o Relatório Anti-Corrupção da UE, “apesar de várias iniciativas anti-corrupção terem sido implementadas na última década, não existe uma estratégia anti-corrupção abrangente”. E recomenda: “Mais acções preventivas de práticas corruptas no financiamento dos partidos devem ser adoptadas, bem como desenvolvidos códigos de conduta para os cidadãos eleitos”.
A Comissão Europeia considera ainda necessárias “medidas adicionais” no que respeita aos conflitos de interesses dos eleitos em Portugal, nomeadamente a nível local e regional, em especial quando estão envolvidas “decisões de planeamento urbano”. Segundo o estudo comunitário, 36% dos portugueses consideram-se pessoalmente afectados pela corrupção no seu dia-a-dia.
JUNCKER EM MAUS LENÇÓIS
No último fim-de-semana, em Brisbane, na Austrália, o novo presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, voltou a ouvir o que não queria a propósito dos extraordinários favores fiscais que prestou a inúmeras multinacionais quando era primeiro-ministro do Grão-Ducado do Luxemburgo, um dos mais prósperos países da União Europeia. Sempre prontos a atacar as fraquezas dos burocratas de Bruxelas, os conservadores ingleses foram os primeiros a aproveitar a presença de Juncker na cimeira do G20 em Brisbane para remexerem a ferida recente – propondo que o ‘big boss’ da Comissão Europeia se submeta a um inquérito formal à sua actuação.
Em causa estão os generosíssimos benefícios fiscais concedidos a 340 empresas multi-nacionais com negócios no Luxemburgo (entre elas a Pepsi e a Ikea), que graças aos favores do amigo Juncker pouparam milhares de milhões de euros em impostos. Juncker nega qualquer procedimento menos correcto, mas a imprensa mundial tem tratado o caso como mais um escândalo de corrupção na Europa.
O caso vai agora ser investigado na União Europeia, mas a generalidade dos observadores considerou já estar-se em presença de um caso inequívoco de evasão fiscal consentida e patrocinada pelo então primeiro-ministro luxemburguês – algo que dificilmente assentará bem ao presidente de uma Comissão que se diz empenhada na moralização da economia europeia e na fiscalização da justiça fiscal dos Estados-membros.
DE BERLUSCONI A SARKOZY
Em Itália e em França, os escândalos de más práticas e corrupção atingem proporções nunca vistas, envolvendo algumas das figuras mais mediáticas da vida política e económica dos dois países. Há apenas duas semanas, o Presidente Giorgio Napolitano respondeu durante três horas perante um tribunal que investiga ligações entre a Máfia e a classe política italiana, num processo que inclui lavagem de dinheiro, extorsão e assassinato – e em que o nome de Silvio Berlusconi, como não podia deixar de ser, voltou a ser mencionado.
Este polémico empresário milanês, que em Outubro de 2011 teve de resignar ao cargo de primeiro-ministro, é geralmente tido como a personificação do pior da política italiana. Ao longo dos últimos anos, teve de responder em tribunal sob acusações de abuso de poder, difamação, extorsão, perjúrio, ligações à Máfia, contabilidade falsificada, desfalque, lavagem de dinheiro, fraude fiscal e suborno – mas, até agora, tem escapado a condenações graças a leis que os seus partidários têm feito aprovar no Parlamento italiano permitindo que os casos prescrevam. Ainda assim, Berlusconi enfrenta ainda quatro julgamentos, um dos quais por abuso de poder enquanto primeiro-ministro.
A empertigada França, que tanto gosta de dar lições ao mundo, não escapa à humilhação de ter alguns dos seus mais destacados dirigentes envolvidos em casos de corrupção nos anos mais recentes.
O mais mediático dos casos é o do ex-Presidente Nicolas Sarkozy, que enfrenta acusações de corrupção e tráfico de influências. Em causa está, nomeadamente, o recebimento ilegítimo de verbas astronómicas para a sua campanha presidencial de 2007, entre elas um “donativo” do então líder líbio Muammar Kaddafi no valor de 68 milhões de dólares.
Humilhação suprema, Sarkozy foi recentemente detido e submetido a um interrogatório policial de 15 horas.
O escândalo segue dentro de momentos…
14/05/2015