O histórico socialista faleceu na noite de hoje, segunda-feira. Almeida Santos tinha 89 anos e era atualmente presidente honorário do partido.
Para além de candidato da oposição ao regime salazarista, ministro dos quatro primeiros governos provisórios e desenhou os processos de descolonização e independência dos territórios coloniais. Filiou-se no PS e foi candidato a primeiro-ministro nas legislativas de 1985.
António de Almeida Santos nasceu na aldeia de Cabeça, no concelho de Seia, em 15 de fevereiro de 1926. Filho de um casal do mesmo concelho, a mãe era natural de Loriga, e o pai de Vide, terra onde António passou parte da sua infância. Concluídos os estudos liceais, António de Almeida Santos entrou na faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em 1944, terminando o curso em 1950. Dois anos mais tarde concluiu o sexto ano de Ciências Jurídicas na mesma faculdade, seguindo para Moçambique em 1953, onde passou a exercer a atividade de advogado.
Na Universidade de Coimbra, António de Almeida Santos foi um estudante muito ativo, conhecido não só pela sua participação em várias iniciativas de caráter eminentemente político, mas também como intérprete do canto e da guitarra de Coimbra, legando à geração do seu tempo e aos vindouros fadistas da “cidade dos doutores” as bem conhecidas “variações em ré menor” de que se tornou um exímio executante.
Na capital moçambicana, onde viveu durante 21 anos (1953-1974) tornou-se conhecido no mundo da advocacia, nunca deixando de ter intensa atividade cívica e política. Integrou o designado Grupo dos Democratas de Moçambique, e foi o representante da candidatura à presidência do general Humberto Delgado. Por duas vezes foi candidato à Assembleia Nacional em listas da oposição ao regime salazaristas, mas em ambos os casos a sua candidatura foi anulada pela administração colonial.
Logo após a Revolução de abril, em 1974, regressou a Portugal a convite do então Presidente da República, general António de Spínola, integrando, como independente, os quatro primeiros governos provisórios como ministro da Coordenação Interterritorial, pasta que desenhou e coordenou os processos de descolonização e independência dos territórios coloniais.
Foi no âmbito destas funções governativas que António de Almeida Santos passou a ser conhecido como o “arquiteto da descolonização”, sendo-lhe atribuída a responsabilidade pelo êxodo dos portugueses que abandonaram as ex-colónias, regressando ao continente no chamado processo dos “retornados”. No VI Governo Provisório foi ministro da Comunicação Social, cujas empresas tinham sido maioritariamente nacionalizadas ou intervencionadas em 11 de março de 1975.
Obreiro das revisões constitucionais
Foi com o I Governo Constitucional, de que fez parte como ministro da Justiça, liderado por Mário Soares, que Almeida Santos se filiou no PS. A partir de então tornou-se num peso pesado da máquina socialista, estando sempre ativamente presente em todas as grandes decisões da política nacional. Foi deputado ininterruptamente da primeira à nona legislatura. Transitou para o II Governo Constitucional como ministro-adjunto do Primeiro-Ministro, e foi determinante nas negociações com o PSD para a viabilização parlamentar que possibilitou a primeira revisão constitucional em 1982.
Foi ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares no Governo do Bloco Central, PS/PSD, que viria a ser derrubado por uma moção de censura parlamentar na sequência da eleição de Aníbal Cavaco Silva para a liderança do PSD. Após a vitória do PSD nas eleições intercalares, que levou Cavaco Silva a Primeiro-Ministro, Almeida Santos tornou-se presidente do Grupo Parlamentar do PS, e nas eleições legislativas de 1985 candidatou-se a Primeiro-Ministro, como líder do seu partido, averbando uma pesada derrota com a primeira maioria absoluta dos social-democratas.
Apesar daquele revés, António de Almeida Santos foi novamente determinante no processo da segunda revisão constitucional de 1988/89. A partir de 1990 voltou a destacar-se na direção do PS, integrando o Secretariado Nacional. Com o regresso ao poder dos socialistas, nas eleições legislativas de 1995, tornou-se na segunda figura da hierarquia do Estado, ao ser eleito Presidente da Assembleia da República. De 1985 a 2002 fez parte do Conselho de Estado, e foi presidente do Partido Socialista desde 1992 a 2011, passando então a presidente honorário.
Almeida Santos é autor de mais de uma dezena de obras, quer de matriz política quer de natureza jurídica. Em 2006 publicou uma autobiografia em dois volumes – “Quase Memórias” – na qual deu particular relevo ao processo da descolonização, processo em que teve particular intervenção. No livro “Que Nova Ordem Mundial?”, publicado em 2009, defendeu a nova ordem de uma economia globalizada, e propôs que o conceito da globalização envolva não apenas as relações comerciais, económicas e financeiras, mas também a própria política como instrumento primordial da gestão dos povos.
Membro da Maçonaria Portuguesa (Grande Oriente Lusitano), com o grau máximo, António de Almeida Santos é comendador da Ordem de Mérito da Costa do Marfim, Grã-Cruz da Ordem do Mérito da Polónia, Grã-Cruz da Ordem da Liberdade, e Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo. Em 2003 ganhou o Prémio Norte-Sul do Conselho da Europa, galardão atribuído a personalidades que tenham mostrado um empenho de excelência na defesa e promoção dos Direitos Humanos, pluralidade democrática, desenvolvimento do diálogo intercultural e reforço da solidariedade entre norte e sul.
TSF/TPT/18/1/2016