O ministro da Saúde decidiu demitir Paulo Campos da presidência do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM). Adalberto Campos Fernandes “homologou a proposta de cessação de comissão de serviço”, na sequência de uma recomendação do “relatório final do processo disciplinar instruído pela Inspecção-Geral das Actividades em Saúde” (IGAS) ao dirigente, esclarece uma nota da tutela. No mesmo comunicado, o Ministério da Saúde “reitera a confiança na instituição INEM, sublinhando o elevado profissionalismo dos seus trabalhadores e a qualidade do seu desempenho operacional”.
A IGAS investigou a actuação de Paulo Campos na alegada interferência que este terá tido no transporte de uma doente, em helicóptero do INEM, do Hospital de Cascais para o de Abrantes. Segundo a agência Lusa, Paulo Campos foi informado da decisão nesta segunda-feira através de Adalberto Campos Fernandes.
Luís Meira, designado em regime de substituição com efeitos a 16 de Outubro de 2015 para a liderança do INEM, “manter-se-á em funções até à conclusão do procedimento concursal que será aberto oportunamente”, esclarece a nota de Adalberto Campos Fernandes.
Paulo Campos estava suspenso de funções desde Outubro, enquanto decorria o processo disciplinar que lhe tinha instaurado o então ministro da Saúde, Paulo Macedo, e que implicava a suspensão temporária de funções. O processo foi aberto na sequência de recomendações da IGAS, que concluiu que a sua actuação foi ilegal e contrária ao interesse público no caso do accionamento de um helicóptero para transporte de uma doente.
Numa nota à comunicação social divulgada na altura, Paulo Campos saudou “a tomada de uma decisão, ao fim de largos meses de invenções, desinformações, especulações e fugas de informação que apenas visaram este resultado” e assegurou: “Todo este processo radica numa mentira ignóbil, como a seu tempo ficará provado.”
Em anexo a essa nota, Paulo Campos tornava pública uma carta que tinha escrito a Paulo Macedo, após a divulgação de notícias sobre o relatório da IGAS. Nesse texto com três páginas, o presidente do INEM frisava que apenas quis salvar uma doente “perdida” num serviço de urgência de um hospital do SNS “incapaz de dar resposta às necessidades da população que devia servir adequadamente”. Uma doente que não estava em estado terminal, ao contrário do que tem sido afirmado, acentuava.
No entanto, para a IGAS, a conduta do presidente do INEM foi “contrária aos princípios gerais da ética e da boa gestão”. E isto, porque, enfatizava a inspecção, “em função de um apelo particular, foi privilegiada uma doente sem que tal excepção fosse devidamente fundamentada e autorizada”.
Paulo Campos visitou em Janeiro de 2015 a doente em questão na qualidade de amigo da família e pediu o seu transporte de helicóptero. Por isso, a IGAS considerou que “foram disponibilizados bens públicos/meios de emergência/recursos escassos e altamente diferenciados, com prejuízo do interesse público, e com custos associados ao accionamento do heli-transporte e equipas”. Por tudo isto, a conduta de Paulo Campos “é determinante de procedimento disciplinar por ser contrária aos princípios gerais da ética, da boa gestão, por violação do princípio do interesse público, bem como por violação do princípio da especialidade”.
À frente do INEM desde Março de 2014, Paulo Campos incompatibilizou-se com vários profissionais, alguns dos quais pediram a demissão, e as denúncias de situações polémicas foram-se sucedendo. O caso do helicóptero originou o segundo processo de averiguações que lhe foi instaurado no espaço de poucas semanas.
Em Agosto passado, soube-se que a inspecção não detectou irregularidades e arquivou, por falta de provas e porque o socorro não foi posto em causa, o inquérito sobre o alegado desvio de uma ambulância para que a mulher de Paulo Campos (que faz turnos como enfermeira da viatura de emergência de Gaia) conseguisse chegar a horas ao hospital em que trabalha. Nessa altura, a IGAS alegava não ter sido possível recolher uma série de de informações sobre o caso do transporte de helicóptero e o ministro Paulo Macedo anunciou então que tinha ordenado que a investigação prosseguisse para poder decidir o que fazer.
Luís Meira, director do departamento de formação do INEM, vai substituir Paulo Campos
O ministro da Saúde seguiu as recomendações da Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS), que sugeriu a abertura de um processo disciplinar a Paulo Campos, por ter concluído que a sua actuação foi ilegal e contrária ao interesse público no caso do accionamento de um helicóptero para transporte de uma doente do hospital de Cascais para o de Abrantes, em Janeiro deste ano.
Luís Meira está no INEM há muitos anos, já dirigiu a delegação regional do Norte do instituto e esteve à frente do CODU (Centro de Orientação de Doentes Urgentes). “Se se confirmar que é o Dr. Luís Meira, esperamos que venha com vontade de unir novamente os trabalhadores, de falar com eles e de os respeitar. Ele é uma pessoa da casa e isso é fundamental”, comentou Rui Gonçalves, da Comissão de Trabalhadores do INEM.
“O que queremos é paz na casa, estabilidade para trabalhar e que seja limpa a má imagem criada”, corroborou Ricardo Rocha, presidente do Sindicato dos Técnicos de Ambulância de Emergência, notando que a actual situação é “sui generis”. “O INEM vai ficar com um presidente interino?”, pergunta.
Esta manhã também, o gabinete de marketing e informação do INEM fez saber que a conferência de imprensa marcada para o início da tarde por Paulo Campos foi desmarcada “por motivos imprevistos”. Segundo a assessora de imprensa do INEM, Ivone Ferreira, a meio da tarde ainda não havia a confirmação oficial do nome de Luís Meira para substituir Paulo Campos, que, aliás, também não tinha ainda sido notificado oficialmente da suspensão temporária.
Numa nota à comunicação social divulgada terça-feira à noite, Paulo Campos saudou “a tomada de uma decisão, ao fim de largos meses de invenções, desinformações, especulações e fugas de informação que apenas visaram este resultado” e assegurou que “todo este processo radica numa mentira ignóbil, como a seu tempo ficará provado”.
Em anexo à nota, tornava pública uma carta que escreveu há dias ao ministro da Saúde, após a divulgação de notícias sobre o relatório da IGAS. Nesse texto com três páginas, o presidente do INEM frisa que apenas quis salvar uma doente “perdida” num serviço de urgência de um hospital do SNS “incapaz de dar resposta às necessidades da população que devia servir adequadamente”. Uma doente que não estava em estado terminal, ao contrário do que tem sido afirmado, acentua.
É uma carta extremamente dura. Paulo Campos considera que o episódio do helicóptero é apenas um exemplo das “fragilidades do sistema de saúde” que Paulo Macedo dirige. Fragilidades que, frisa, “colocam em risco várias vidas, designadamente por ineficiência do sistema, nomeadamente nos serviços de urgência”.
Insistindo que não actuou “em benefício pessoal”, nem tem uma relação de amizade com a família da doente, garante que o INEM, as equipas médicas e ele próprio têm “a certeza” de, neste caso concreto, terem “cumprido escrupulosamente a missão” de que estão legalmente incumbidos.
Conta que a doente foi transportada inicialmente por uma viatura de emergência médica do INEM e entrou no sistema “via 112” e explica que foi na sequência de “uma reclamação da família” para o instituto que actuou, tendo outro médico intensivista concordado com a sua estratégia. Na carta, Paulo Campos lamenta, aliás, que nem este médico nem os enfermeiros do INEM que o acompanharam naquele dia tivesse sido ouvidos pela IGAS, tal como a família da doente.
Mas vai mais longe, ao considerar que, se todos tivessem agido “com indiferença e imobilismo”, estariam hoje acusados de homicídio involuntário, “por ter havido atraso irremediável do tratamento configurado no conceito jurídico de ´perda de chance´”, aludindo a um acórdão do Tribunal Cível de Lisboa que condenou um hospital privado a pagar uma indemnização à família de uma doente que ali morreu com uma infecção que terá sido diagnosticada tarde demais.
Para a IGAS, a conduta do presidente do INEM foi “contrária aos princípios gerais da ética e da boa gestão”. E isto porque, enfatiza a inspecção, “em função de um apelo particular, foi privilegiada uma doente sem que tal excepção fosse devidamente fundamentada e autorizada”.
TPT com: Romana Borges-Santos/Alexandra Campos/PUB/15 de Fevereiro de 2016