Entre exigências e desconfianças, o orçamento de que ninguém gosta vai ser aprovado por alguns

Oitenta e oito dias depois de tomar posse, o PS chega ao Parlamento para discutir o Orçamento do Estado para 2016 com a aprovação na generalidade, cuja votação está marcada para esta terça-feira, já garantida. O Partido Ecologista Os Verdes anunciou o voto favorável no sábado, o Bloco de Esquerda e o PCP juntaram-se-lhe este domingo.

 

 

Este orçamento, feito sobre fino arame do equilíbrio entre os acordos políticos assinados sem público à esquerda e as exigências vincadas por Bruxelas com voz grossa pelos microfones, ameaça ter rapidamente não uma errata – isso até já teve duas  – mas um rectificativo, se for mesmo preciso tomar as “medidas adicionais” com que António Costa se comprometeu em Bruxelas a preparar para ter como bóia de salvação para cumprir o PEC – Pacto de Estabilidade e Crescimento.

 

 

Até porque ainda esta semana se deve ficar a conhecer o relatório da análise aprofundada da Comissão Europeia, no âmbito do Semestre Europeu, conclusões que a equipa de António Costa deve já ter em conta para a elaboração do Plano Nacional de Reformas e do Programa de Estabilidade 2016-2020 que têm que ser elaborados até ao final de Abril. Depois, pegando nesses dois documentos, na execução orçamental até lá e no relatório que será conhecido ainda este mês – por coincidência numa altura em que o OE2016 já está em discussão na especialidade – a Comissão Europeia irá encerrar o ciclo do Semestre Europeu em Julho apresentando recomendações a Portugal. Foram, aliás, as exigências e dúvidas que obrigaram a quase duas semanas de negociações entre Bruxelas e o Governo e que levaram o Executivo a rever a estimativa do impacto do défice orçamental de 2,6% para 2,2% do PIB este ano, e a do crescimento de 2,1 para 1,8%.

 

 

Voltando ao Parlamento e usando a aritmética para falar da votação desta terça-feira, o PS conta com o apoio declarado do Bloco, PCP e PEV. Ou seja, 122 votos sim contra os 107 “não” da direita, juntando PSD e CDS. Apesar dos acordos políticos e do apoio parlamentar, Bloco, PCP e PEV foram repetindo que este “não é” o orçamento que qualquer deles faria. Apontaram “limitações” e “insuficiências”, mas também elogiaram o “esforço” socialista, argumentaram com as imposições de Bruxelas, como que desculpando o Governo pelo aumento, por exemplo, dos impostos nos combustíveis e automóveis, tabaco e álcool. Afinal, há redução no IVA da restauração, maior taxação à banca, aumento das pensões, reposição dos salários da função pública, redução da sobretaxa do IRS – BE e PCP até aproveitaram para chamar a si os louros por estas medidas.

 

 

Os partidos da dita “geringonça” esperam conseguir mais alguma coisa do Governo na especialidade, mas Costa está apenas disposto a aceder à descida da taxa máxima do IMI de 0,5 para 0,4% e o congelamento das propinas exigidos pelo PCP, e ao alargamento da tarifa social de energia proposto pelo Bloco.

 

 

Catarina Martins, porta-voz do Bloco, anunciou este domingo o voto a favor argumentando que “na generalidade” o documento se enquadra no que foram as negociações com o PS, permite a recuperação de rendimentos e alegando que o partido “não falha aos compromissos que assume”. Jerónimo de Sousa, pelo PCP, fez o mesmo (ver texto ao lado).

 

 

Direita contra

 

 

À direita o chumbo está anunciado há pelo menos três meses, quando em meados de Novembro Pedro Passos Coelho avisou que o PS não contaria com o apoio do PSD para governar. Assim que o esboço do orçamento se conheceu, em Janeiro, PSD e CDS apressaram-se a mostrar a sua reprovação à estratégia do Governo, que foram repetindo de cada vez que novas versões do documento foram sendo tornadas públicas.

 

 

No final de Janeiro, Pedro Passos Coelho defendeu perante a sua bancada que o PSD não deveria fazer qualquer proposta de alteração ao OE para que isso não fosse aproveitado pela esquerda para se unir. A estratégia social-democrata, idealizou o presidente do partido, passaria por explorar eventuais desentendimentos entre PS, PCP, BE e PEV em relação ao documento e passar a ideia de que com este OE as finanças públicas vão voltar a afundar-se. Esta decisão seria inédita na história dos últimos anos do partido na oposição. Mas há dias, houve um pequenino recuo: o líder da bancada laranja admitia já que o partido só irá pensar nisso depois da votação na generalidade, precisamente para perceber quais as brechas no muro da esquerda.

 

 

Depois da discussão durante esta tarde e a manhã de terça-feira, o orçamento é votado na generalidade à tarde. Segue depois para a discussão na especialidade nas várias comissões parlamentares onde serão apresentadas as propostas de alteração dos partidos. O debate na especialidade e votação está marcado para os dias 10, 14 e 15 de Março, ao passo que a votação final global é no dia 16, seguindo depois para promulgação já pelo novo Presidente da República. Se Marcelo Rebelo de Sousa for rápido na análise, o orçamento poderá entrar em vigor a 1 de Abril.

 

 

Maria Lopes/PUB/21 de Fevereiro de 2016

 

 

 

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