O Conselho de Estado decidiu autorizar o primeiro-ministro, António Costa, a depor por escrito na qualidade de testemunha no processo de Tancos, depois de ouvido o próprio, anunciou hoje a Presidência da República.
Segundo uma nota publicada no portal da Presidência da República na Internet, “a totalidade das respostas recebidas dos conselheiros de Estado traduz uma autorização unânime no sentido indicado”.
O pedido do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) para ouvir o primeiro-ministro, António Costa, como testemunha no processo de Tancos chegou ao Conselho de Estado no dia 16 de dezembro. “O Conselho de Estado, depois de ouvido o interessado, deliberou autorizar o primeiro-ministro a depor, por escrito, na qualidade de testemunha, no processo 661/17.1TELSB, que corre termos na Secção Única do TCIC de Lisboa”, lê-se na nota hoje divulgada pela Presidência da República.
De acordo com o artigo 15.º do Estatuto dos Membros do Conselho de Estado, os membros deste órgão político de consulta do Presidente da República, que o primeiro-ministro integra por inerência do cargo, “não podem ser peritos, testemunhas ou declarantes sem autorização do Conselho”.
O Regimento do Conselho de Estado determina que esta autorização “será necessariamente precedida de audiência do membro do Conselho em causa, efetuada pelo Presidente da República ou pelo próprio Conselho, podendo neste caso a vontade do órgão ser apurada através de consulta escrita dirigida a cada um dos seus membros”.
Depois dessa audiência, é possível “a vontade do órgão ser apurada através de consulta escrita dirigida a cada um dos seus membros”, sendo que nestas decisões “o membro do Conselho de Estado a que respeitem não poderá votar”, estabelece a mesma lei, no artigo 12.º.
Por outro lado, nos termos dos artigos 503.º do Código de Processo Civil e 139.º do Código de Processo Penal, “gozam de prerrogativa de depor primeiro por escrito, se preferirem”, entre outros, “os membros do Conselho de Estado”.
O pedido do TCIC é para que o primeiro-ministro, António Costa, possa depor como testemunha do ex-ministro da Defesa José Azeredo Lopes, que é arguido no processo de furto e recuperação de material furtado de Tancos, em 2017.
Antes de este pedido chegar ao Palácio de Belém, foi tornado público que o juiz de instrução do processo de Tancos, Carlos Alexandre, quer que o primeiro-ministro, indicado como testemunha por Azeredo Lopes, deponha presencialmente no TCIC, e não por escrito.
Azeredo Lopes, que o Ministério Público acusa de abuso de poder, denegação de justiça e prevaricação, será ouvido na fase de instrução no dia 03 de fevereiro. Entre membros por inerência dos cargos que ocupam e nomeados pelo Presidente da República e pela Assembleia da República, o Conselho de Estado tem 19 conselheiros.
PR pede rapidez no caso de Tancos para evitar “suspeição na opinião pública”
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, afirmou este sábado que está preocupado com a rapidez da investigação ao caso de Tancos para evitar “uma indecisão, uma hesitação, uma suspeição na opinião pública”.
Em declarações aos jornalistas, no final de uma sessão comemorativa do 40.º aniversário da União Geral dos Trabalhadores (UGT), na sede desta central sindical, em Lisboa, o chefe de Estado escusou-se a comentar as notícias e os desenvolvimentos deste processo judicial.
“A mim o que me preocupa, como Presidente da República e Comandante Supremo das Forças Armadas, é que tudo seja apurado. Tenho-o dito desde há um ano e meio. E que seja o mais rápido possível, para que não haja uma indecisão, uma hesitação, uma suspeição na opinião pública, isto é, nos portugueses”, afirmou.
Questionado se considera que existe já suspeição na opinião pública, Marcelo Rebelo de Sousa não respondeu diretamente, mas reafirmou a sua posição de que “tem de se investigar”, acrescentando: “Tudo o que seja necessário fazer para investigar, que se faça”.
O Presidente da República foi interrogado, em particular, sobre a disponibilidade manifestada hoje pela ex-procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, para prestar esclarecimentos “no local próprio” sobre se falou ou não com o ex-ministro da Defesa Nacional, José Azeredo Lopes, sobre a atuação da Polícia Judiciária Militar (PJM) neste caso. “Isso é o curso da investigação, que não vou comentar”, retorquiu.
Marcelo Rebelo de Sousa também não quis comentar as notícias sobre o conhecimento imputado ao ex-ministro da Defesa de um memorando sobre o reaparecimento do material militar desaparecido do paiol militar de Tancos.
Instado a conjeturar o que teria feito caso tivesse tido acesso a esse documento, o chefe de Estado repetiu: “Não tenho mais nada a comentar”. “Agora o que importa é investigar exaustivamente tudo o que há para investigar e, respeitando a autonomia do Ministério Público, quanto mais depressa, melhor”, insistiu.
André Ventura reage a decisão do Conselho de Estado sobre depoimento de António Costa no caso Tancos
Na opinião de André Ventura, são este tipo de decisões que fazem com que nasça “o défice das instituições democráticas e a descrença das pessoas nos políticos, que dão a ideia de se proteger uns aos outros”.
Depois de o Conselho de Estado ter anunciado que o primeiro-ministro, António Costa, tem autorização para depor por escrito, no âmbito do caso Tancos, o deputado do Chega, André Ventura, veio a público contestar a decisão.
“A notícia foi colocada no site da presidência da República como se fosse algo positivo: os conselheiros teriam autorizado de forma unânime o depoimento de Costa em tribunal sobre o caso Tancos. Porém, lá no meio viria o verdadeiro e vergonhoso estratagema: o depoimento seria por escrito” começa por dizer Ventura ao SOL.
“Mas com que fundamentos o Conselho de Estado contorna o pedido do juiz Carlos Alexandre para um depoimento presencial? Com que objetivos? Terá porventura mais informação do que o Tribunal de instrução criminal acerca do processo e das necessidades de inquirição do mesmo? É o Conselho de Estado que define as estratégias processuais a utilizar?” questiona o deputado. “O tribunal e a justiça pedem uma coisa, o conselho de Estado dá outra. De forma velada, como sempre”, acrescenta.
Na opinião de André Ventura, são este tipo de decisões que fazem com que nasça “o défice das instituições democráticas e a descrença das pessoas nos políticos, que dão a ideia de se proteger uns aos outros”.
TPT com: Sol//Sapo24//DinheiroVivo/Lusa//José Coelho/ Lusa//António Cotrim/Lusa//26 de Dezembro de 2019