Apenas cinco juízes, que integram as chamadas Equipas Extraordinárias de Juízes Tributários criadas em 2011 para resolverem o avolumar de conflitos fiscais com valor superior a um milhão de euros, tinham nas mãos em Junho passado processos no valor de mais de 5,7 mil milhões de euros, o que representa 3,3% do Produto Interno Bruto português em 2014. O valor sobe até aos 8,1 mil milhões (4,7% do PIB) se contabilizarmos as acções daquele tipo que estavam à espera de decisão já não nos tribunais de primeira instância, os únicos onde actuam as equipas especiais, mas nas instâncias superiores – dois tribunais centrais e ainda o Supremo Tribunal Administrativo.
No Verão passado estavam pendentes nos tribunais de primeira instância 882 processos tributários de valor superior a um milhão de euros, quase mais 14% que no final do primeiro semestre de 2014. Os números são do último relatório de balanço destas equipas, divulgado recentemente pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF). São menos processos do que os 1219 que existiam quando as equipas foram criadas, em Maio de 2011, mas mais que os 782 que ficaram pendentes em Dezembro desse ano, após o primeiro balanço do trabalho destas equipas, então compostas por sete juízes.
Numa primeira fase estas duas equipas – uma no Porto e outra em Lisboa – concentraram-se apenas em resolver grande parte dos processos que já estavam nos tribunais: a do Porto recebia as acções da sua área e as de Aveiro, Braga e Coimbra, enquanto a de Lisboa recebia, além das da sua zona, as de Almada, Leiria e Sintra. Os restantes oito tribunais de primeira instância na área tributária continuavam a resolver os seus casos de valor superior a um milhão, tendo o CSTAF determinado uma movimentação prioritária para estes processos na sequência dos compromissos internacionais assumidos pelo então Governo com a troika.
Contudo, em Dezembro de 2012, o conselho muda a distribuição deste tipo de acções. A partir daí as duas equipas passam a receber os processos de valor superior a um milhão de euros de todo o país. Como a sua capacidade de resposta tem sido um pouco inferior ao volume de processos entrados, as equipas acabaram por não conseguir diminuir as pendências, estando até a acumular serviço – uma realidade transversal a todos os tribunais administrativos e fiscais, a maior parte dos quais vive uma situação bastante mais dramática que estas equipas.
A juíza-secretária do CSTAF, Dora Lucas Neto, lamenta a falta de magistrados nesta jurisdição e diz que estes tribunais “estão a atingir o limite”. A crescente procura que sofreram nos últimos anos tem feito aumentar o congestionamento e o tempo de resposta. No final de 2014 havia quase 48 mil processos pendentes nos tribunais tributários (mais 8,6% do que em 2009) e pouco mais de 20 mil nos administrativos (mais 38% do que seis anos antes).
“A falta de juízes é flagrante em todas as instâncias”, nota Dora Lucas Neto. Num parecer enviado em Junho ao Parlamento a propósito de uma reforma nos estatutos destes tribunais, o conselho considerava “indispensável para resolução de pendências” alargar em mais 65 lugares os quadros destes tribunais, para além de preencher vagas em alguns tribunais onde, dada a falta de juízes, estão por ocupar.
A magistrada lembra que desde Setembro de 2013 que não entram novos magistrados para os tribunais administrativos e fiscais. Mesmo que abra um novo curso para este tipo de magistrados ainda em 2016, só em 2019 os formandos serão colocados nos tribunais como juízes de direito. “Os candidatos do último curso, com 40 vagas, aberto em 2014, só vão chegar aos tribunais em Setembro deste ano, como juízes-estagiários. Só em 2017 passarão a juízes de direito”, exemplifica.
Dora Lucas Neto lembra que está prevista na lei a criação de gabinetes de apoio aos magistrados, com recurso a juristas da administração pública. “Poderia ser uma importante mais-valia na assessoria aos juízes desta jurisdição e uma medida que julgo apta a garantir maior eficiência do serviço”, defende.
Nos primeiros seis meses do ano passado, as duas equipas extraordinárias dos tribunais fiscais proferiram 181 sentenças (mais 43 que no mesmo período de 2014), mas também receberam 198 novos casos (mais 28,5% que no primeiro semestre de 2014). Daí se explique que a 1 de Janeiro de 2015 estivessem pendentes processos com um valor global de mais de 5,4 mil milhões de euros e seis meses mais tarde o montante tenha crescido mais 266 milhões de euros. A 1 de Janeiro de 2013 aquele valor era inferior em mais de mil milhões, totalizando 4,6 mil milhões.
TPT com: Adriano Miranda/Mariana Oliveira/PUB/6 de Abril de 2016