O jornalista norte-americano Michael Rezendes, que ganhou o prémio Pulitzer de Serviço Público em 2003 pelo trabalho de investigação no The Boston Globe sobre padres pedófilos, e retratada no filme “Spotlight”, afirmou que o jornalismo de investigação “vai sobreviver”.
“O jornalismo de investigação vai sobreviver”, afirmou o jornalista, conhecido pela sua investigação sobre os crimes de pedofilia praticado por padres, quando falava no 4.º Congresso dos Jornalistas, que esta quinta-feira arrancou no cinema São Jorge, em Lisboa, sob o mote “Afirmar o jornalismo”, e que termina no próximo domingo.
“Há um apetite forte” por notícias de investigação, afirmou, salientando que há estudos que apontam que os leitores querem notícias curtas, mas também histórias mais aprofundadas, acrescentou Michael Rezendes.
Segundo o jornalista, que é lusodescendente, para fazer jornalismo de investigação “é preciso sair da redação e falar com pessoas”, acrescentando que o jornalismo ‘old fashion’ [tradicional] “é muito, muito importante”.
Na sua apresentação inicial, Michael Rezendes começou por dizer que nunca tinha seguido a política em Portugal “como deveria”, mas confessou sentir admiração pelo antigo Presidente da República Mário Soares, falecido no sábado, aos 92 anos, pelo seu papel na democracia do país.
“O jornalismo é essencial para a democracia”, salientou.
Relativamente às características que um jornalista deve ter para fazer investigação, Michael Rezendes afirmou que é necessário “ser bom ouvinte”. O profissional “tem saber o que as pessoas querem dizer, estar lá porque sinceramente quer saber” e “ter curiosidade natural”, que classificou de “muito importante”.
Sobre como é que os media vão lidar com o novo Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, Rezendes disse que “ainda é cedo” para saber, mas que “será um grande desafio” cobrir o seu mandato.
Presidente do Sindicato dos Jornalistas diz que “não há jornalismo sem jornalistas”
A presidente do Sindicato dos Jornalistas, Sofia Branco, defendeu que “não há jornalismo sem jornalistas”, sublinhando que a “liberdade de imprensa é uma causa dos cidadãos”.
A presidente do Sindicato dos Jornalistas, Sofia Branco, defendeu esta quinta-feira que “não há jornalismo sem jornalistas”, sublinhando que a “liberdade de imprensa é uma causa dos cidadãos”.
Sofia Branco falava na sessão de abertura do quarto Congresso dos Jornalistas, que acontece após um hiato de quase 20 anos, sob o mote “Afirmar o Jornalismo”, que decorre entre esta quinta-feira e domingo no cinema São Jorge, em Lisboa.
Na sua intervenção, Sofia Branco considerou que os salários dos jornalistas “são indignos para a responsabilidade social que a profissão tem”, no dia em que foi conhecido que a maioria destes profissionais recebe menos de 1.000 euros líquidos por mês e um terço trabalha com vínculo precário, de acordo com o resultado do inquérito do ISCTE hoje divulgado.
A presidente sublinhou ainda que a “liberdade de imprensa é uma causa dos cidadãos” e não somente dos jornalistas.
“Estamos na mais grave crise das nossas vidas profissionais”, afirmou, por sua vez, Goulart Machado, presidente da Casa de Imprensa, salientando ainda que nos últimos 18 anos “muitos jornalistas abandonaram a sua profissão”.
A tecnologia que nos dá extraordinárias ferramentas cria a ilusão disparatada de que somos, em certa medida, dispensáveis”, sublinhou.
Goulart Machado referiu ainda que o Congresso dos Jornalistas “não é um momento de catarse”, esperando que as conclusões resultem num mapa que “indique o caminho”.
Mário Zambujal, presidente do Clube de Jornalistas, recordou, na sua intervenção, o antigo Presidente da República Mário Soares, falecido no sábado, aos 92 anos, que gerou uma forte salva de palmas por parte da audiência.
“Também ele [Mário Soares] fez questão de estar presente no congresso de 1986”, afirmou, salientando que “tanto Soares como Marcelo (Rebelo de Sousa, presente na sessão de abertura] representam a liberdade de imprensa”.
Maria Flor Pedroso, presidente do quarto Congresso dos Jornalistas, sublinhou que a independência, credibilidade, rigor, pluralidade, isenção “não podem ser substantivos” usados pelos profissionais sem estes se interrogarem sobre o seu significado.
O jornalismo não pode, em contexto algum, deixar de ser serviço público”, afirmou.
Lembrou ainda os resultados de dois estudos sobre o setor e apontou: “Somos uma profissão de desgaste rápido”. Algo que considerou “perturbador”.
Deu ainda exemplo que o ano ainda mal começou, mas que dois títulos ‘online’ – Diário Digital e Setúbal Na Rede – fecharam.
Sobre o evento, adiantou que o “congresso não vai resolver o que não foi resolvido até agora”, mas disse esperar “pistas, soluções” para o setor.
“Pretendemos um A4 de conclusões”, disse Maria Flor Pedroso.
Ao contrário dos três congressos anteriores, o deste ano conta com as três organizações de jornalistas – Sindicato dos Jornalistas, Casa de Imprensa e Clube de Jornalistas.
Os três congressos anteriores tinham sido promovidos exclusivamente pelo Sindicato dos Jornalistas.
Marcelo Rebelo de Sousa: a precariedade enfraquece o jornalismo
Durante o quarto Congresso de jornalistas, o Presidente da República defendeu que sem jornalismo forte e estável não há “democracia sólida e de qualidade em Portugal”.
“Este congresso demorou tempo a mais a chegar” e “a precariedade enfraquece a vossa profissão”. Estas foram algumas das afirmações de Marcelo Rebelo de Sousa que, na tarde de quinta-feira, discursou diante de uma audiência composta por jornalistas. O Presidente da República falou no quarto Congresso dos Jornalistas que, depois de um hiato de quase 20 anos, regressou com o mote “Afirmar o jornalismo” e ocupou o cinema São Jorge, em Lisboa.
As palavras de Marcelo focaram-se essencialmente nos problemas e desafios que a profissão enfrenta, levando-o a reforçar a ideia de que “sem jornalismo estável, forte e independente não há democracia sólida e de qualidade em Portugal ou em qualquer sociedade livre”.
Marcelo afirmou ainda que o efeito da crise económica e financeira “ameaça” a comunicação social, uma situação que tem vindo a repercutir-se tanto na vida dos jornalistas como dos portugueses em geral.
“Quase um terço dos cerca de 7.750 profissionais é constituído por estagiários. A crescente precariedade do seu estatuto traduz os problemas do sector”, continuou, fazendo referência à imprensa local e regional que foi morrendo, às rádios locais que se extinguiram, a alguma “imprensa esvaziada” e ao fotojornalismo, tido como “uma das primeiras vítimas desta crise”.
“Só o digital permitiu atenuar a queda vertiginosa do papel em títulos de referência”, afirmou, para voltar a repetir que sem jornalismo forte e independente — que não se vergue aos poderes políticos, económicos, financeiros e sociais vigentes — “não há democracia sólida.”
Maioria dos jornalistas recebe menos de mil euros e um terço é precário
A maioria dos jornalistas recebe menos de mil euros líquidos por mês e um terço trabalha com vínculo precário, segundo um inquérito do ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa, divulgado esta quinta-feira.
O trabalho, realizado por uma equipa do CIES-IUL (ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa), em parceria com o Sindicato dos Jornalistas e o Obercom, conclui que, no ano passado, 69% dos jornalistas recebiam entre 501 e 1.500 euros líquidos por mês, dos quais 23,3% recebiam entre 1001 e 1.500 euros, 23,9% entre 701 e 1.000 euros e 21,8% menos de 700 euros.
“Se estabelecermos os 1.000 euros como ponto de divisão, verificamos que 57,3% dos jornalistas ganham menos, apesar de o rendimento mensal médio líquido ser de 1.113 euros”, lê-se num sumário do estudo, intitulado ‘Os jornalistas portugueses são bem pagos? Inquérito às condições laborais dos jornalistas em Portugal’.
Porém – acrescenta o estudo a apresentar no sábado durante o 4.º Congresso dos Jornalistas, que decorre de esta quinta-feira a domingo em Lisboa – “11,6% dos jornalistas recebem menos de 500 por mês e, desses, 7% nem sequer recebem 300 euros”.
No que respeita aos rendimentos na profissão, o trabalho evidencia ainda que só 19,4% dos jornalistas recebem mais de 1.500 euros mensais, sendo que, destes, 10,8% ganham até 2.000 euros, 3,6% até 2.500 euros e só 5% auferem um valor superior.
O estudo – cujos autores garantem ser “o mais recente e abrangente inquérito já realizado em Portugal, respondido por quase 1.500 jornalistas” – conclui também que, destes, 87,5% encontravam-se a trabalhar, enquanto 7,9% estavam em situação de desemprego. Além destes, 2,2% estavam reformados e 2% em estágio (1,5% em estágio profissional e 0,5% em estágio curricular).
Relativamente aos vínculos laborais, o ISCTE nota que, no ano passado, 33,4% dos inquiridos não tinham contrato fixo, trabalhando “em condições contratuais precárias e sujeitos a instabilidade, insegurança e fragilidade”. Neste grupo incluem-se os colaboradores (16,4%), dos quais a maioria (8,8%) tinha uma avença e os restantes (7,6%) trabalhavam à peça, e os 17% de profissionais que se assumiram como ‘freelancers’. Entre os inquiridos, dois terços referiu ter contrato de trabalho, 56,3% dos quais sem termo e 10,5% a termo certo.
Em 2016, os contratos de trabalho dos jornalistas em Portugal eram maioritariamente de 35 a 40 horas semanais (64,7%), mas 27,7% afirmaram não saber a carga horária semanal prevista nos seus contratos e a maioria assumiu trabalhar mais de 40 horas por semana (13,8% têm uma semana laboral de 51 a 60 horas e 9% até trabalham mais de 60 horas).
Apesar da elevada percentagem de jornalistas que trabalha mais horas do que o previsto no seu contrato, apenas 3,9% são remunerados pelas horas extraordinárias e 10,2% são compensados em tempo de descanso pelo trabalho extra, sendo que quase dois terços do total (63,4%) não têm qualquer compensação pelo trabalho extraordinário.
Algo que, sustentam os autores do trabalho, demonstra “uma elevada discrepância entre a carga horária contratualizada, a prática profissional efetiva e a remuneração devida”.
Num mercado descrito como de “elevada concentração”, o ISCTE diz haver 25,8% de jornalistas que prestam serviço para mais de um órgão de comunicação social dentro do mesmo grupo, dos quais mais de dois terços (66,8%) não recebem remuneração extra por esse trabalho.
“A progressão na carreira dos jornalistas inquiridos parece quase impossível, pois mais 80% não têm progressão há mais de quatro anos, mesmo nas empresas de comunicação social onde ela está prevista”, lê-se no sumário, que acrescenta que “28,4% de jornalistas não progridem na carreira há mais de uma década e 29,4% têm a carreira congelada há pelo menos sete anos”.
Por outro lado, são 22,5% os que não progridem há quatro a seis anos e 19,7% os que estão sem progressão na carreira há menos de três anos.
Neste contexto laboral, o trabalho nota que “quase dois terços dos jornalistas inquiridos (64,2%) já pensaram, pelo menos uma vez, abandonar a profissão”, apontando como motivos o baixo rendimento (21%), a degradação da profissão (20,4%) e a precariedade contratual (14,3%).
E, se 39,2% dos jornalistas inquiridos já passou pelo desemprego, estes profissionais estão “muito divididos quando à probabilidade de perderem o emprego no futuro próximo”: “Se 35,1% consideram que ficar desempregado é improvável, 40,9% acham provável, com 15,7% a afirmarem que é extremamente provável a curto prazo”.
“Apesar de a maioria dos jornalistas que já passou pela situação de desemprego ter conseguido regressar à profissão em menos de um ano, a perceção dos inquiridos acerca da probabilidade de voltar a encontrar emprego no jornalismo perante uma situação de desemprego em 2016 é muito pessimista”, acrescenta.
Composto por 78 perguntas, o inquérito do ISCTE foi respondido por quase 1.600 jornalistas entre 01 de maio e 13 de junho de 2016, tendo sido validadas 1.494 respostas.
TPT com: AFP//JUSTIN TALLIS/AFP//MIGUEL A. LOPES/LUSA/Lusa// ENNIO LEANZA/EPA//Ana Cristina Marques//Observador// 12 de Janeiro de 2017