O presidente do Governo espanhol, Mariano Rajoy, a força política mais votada nas eleições legislativas espanholas de 20 de dezembro, vai falar esta quarta-feira com o secretário-geral do PSOE, Pedro Sánchez, na sede do executivo, para analisar o cenário político que resulta das eleições gerais espanholas de domingo.
De acordo com a presidência do Governo, no palácio da Moncloa, em Madrid, Rajoy e Sánchez encontram-se às 12h para “trocar pontos de vista sobre as alternativas que existem para a investidura de um novo presidente”, que resulta de votação no parlamento e que passa, necessariamente, por acordos entre os partidos.
Os resultados eleitorais obrigam qualquer um dos três partidos mais votados – PP (123 deputados), os socialistas do PSOE (90 deputados) ou o Podemos (esquerda radical, 69 deputados) a acordos de Governo ou de legislatura, não só entre si, mas também com o Ciudadanos (40 deputados) e pequenas forças políticas regionais ou nacionalistas.
O jornal “El País” noticiou que Rajoy pretende propor a Sánchez várias concessões ao PSOE, a começar pela presidência do Congresso (equivalente ao presidente da Mesa da Assembleia em Portugal) e também do Senado (a câmara alta, onde, ao contrário do Congresso, o PP tem maioria absoluta). A tradição política em Espanha é que preside a ambas as câmaras o partido mais votado.
Com os resultados de domingo, caso todas as outras forças se unissem poderiam impor um presidente do Congresso que não do PP.
Rajoy, segundo o jornal, também estaria disposto a aceitar uma reforma constitucional, algo que faz parte do programa do PSOE (e também do Podemos, que considera condição essencial para um eventual acordo com os socialistas).
Também o Ciudadanos propunha mudar a constituição, pelo que só o PP não o queria. No entanto, os 123 deputados que o PP somou nas eleições deram ao partido a prerrogativa de bloquear qualquer reforma constitucional (que requer maioria de três quintos no Congresso ou maioria absoluta no Senado).
Outro dos pontos, escreve o diário madrileno (conotado com a esquerda), seria a discussão do artigo 135.º da Constituição, alterado em 2011 para impor limites constitucionais ao défice público e ao endividamento. Pedro Sánchez propunha em campanha modificar esse artigo – e não simplesmente acabar com ele – para que os serviços públicos básicos se sobrepusessem ao pagamento da dívida.
PP também estaria disposto a discutir com Sánchez sobre impostos, sobretudo relacionando-os com serviços sociais, desde que não coloquem em risco o cumprimento das metas do défice.
Numa nota enviada após a publicação da notícia do “El País”, o Governo desmentiu que tenha oferecido ao PSOE uma reforma da Constituição e a presidência do Congresso dos Deputados em troca da abstenção dos socialistas na futura sessão de investidura do presidente do Governo.
PP venceu mas dificilmente formará Governo
A vitória sem maioria absoluta do PP e o pior resultado alguma vez alcançado pelo PSOE abre um cenário de incerteza no panorama político espanhol. É o fim do bipartidarismo no país. Alcançar acordos torna-se vital.
Pela primeira vez na democracia de Espanha, os espanhóis vão deitar-se este domingo sem saber quem será o próximo chefe do Governo, após umas eleições que fizeram entrar em força no parlamento novos partidos como o Podemos e o Ciudadanos.
Os resultados das eleições gerais em Espanha, realizadas no domingo, abrem um cenário de incerteza sobre quem será o próximo chefe do executivo e mesmo de que ala política (esquerda ou direita) sairá.
A vitória sem maioria absoluta do PP (menos 3,6 milhões de votos, passando de 186 para 123 deputados), conjugada com o pior resultado da história do PSOE (90 deputados e menos 1,4 milhões de votos), tornam essencial avançar com acordos.
O cenário matematicamente mais simples (mas politicamente inédito e complicado) é um acordo entre PP e PSOE, para formar um Governo improvável, um acordo de legislatura e/ou um acordo para investir Mariano Rajoy (atual líder do executivo) como presidente de um Governo minoritário.
Os outros cenários passam por acordos com os emergentes Podemos (que passa de zero a 69 assentos no parlamento espanhol, contando com as formações “irmãs” En Comú Podem, En Mareas e Compromís) e Ciudadanos (que também se estreia no Congresso dos deputados com 40 assentos). No entanto, um acordo do PP ou do PSOE com estes dois partidos não é suficiente: cada um dos partidos terá de contar também com pequenos partidos regionais e nacionalistas.
Neste ponto, as opções complicam-se ainda mais: os partidos nacionalistas com mais votos são os catalães Esquerra Republicana Catalana (ERC, nove assentos) e DL (Democràcia i Libertat, oito), ambos a favor da independência da Catalunha.
PP, PSOE e Ciudadanos estão contra a independência e um referendo só para a Catalunha sobre essa possibilidade. Só o Podemos o aceita.
Nas declarações de final da noite de eleições, Pedro Sánchez (PSOE) e Mariano Rajoy coincidiram que cabe ao partido mais votado, o PP, “tentar formar Governo”, enquanto Albert Rivera insistiu que os deputados do Ciudadanos bloquearão qualquer tentativa de Governo que integre o Podemos e que poderão abster-se para viabilizar o novo presidente do Governo.
Já Pablo Iglesias, do Podemos, disse que Espanha optou por uma mudança de sistema e declarou o “fim do bipartidismo” e do “sistema de porta giratória” entre PP e PSOE. Também afirmou que pretende uma reforma constitucional que altere a lei eleitoral em Espanha e consagre direitos sociais como a habitação e a possibilidade de moções de censura ao presidente de um Governo que não cumpra o seu programa eleitoral.
A lei que regula as eleições gerais em Espanha indica que, uma vez formado o novo parlamento, escolhem-se os líderes das várias formações com assento parlamentar – que apresentam candidatos a presidente – e marca-se uma votação. Na primeira votação para a investidura do presidente, este precisa de maioria absoluta (ou seja, 176 deputados). Na segunda, basta-lhe uma maioria simples, ou seja, ser o mais votado.
É neste segundo cenário que poderão apostar os eventuais blocos. Mariano Rajoy e o PP precisariam assim da abstenção do Ciudadanos (que poderia colocar condições para o fazer) e que todas as outras forças não se unissem contra ele.
Já o PSOE precisa necessariamente do voto a favor do Podemos e de outros pequenos partidos (se não os catalães), pelo menos o Partido Nacionalista Basco, a Izquierda Unida ou a Coligação das Canárias, com quem conseguirá mais facilmente acordos do que o PP.
A política espanhola entra, assim, em águas desconhecidas, com o bipartidismo (PP e PSOE) a obter pouco mais de 50% dos votos nestas eleições (face aos 73% de 2011). Os emergentes Ciudadanos e Podemos entram em força no parlamento, mas ambos com a sensação de que poderiam ser decisivos por si só.
O Ciudadanos foi apontado nas sondagens como o partido com o qual todos teriam e quereriam fazer acordo, enquanto o Podemos chegou a sonhar com um segundo lugar, acima do PSOE, que lhe permitiria obter a liderança de uma aliança de esquerdas.
Os principais analistas em Espanha consideram já a hipótese de eleições antecipadas, na sequência da eventual instabilidade governativa.
Seguir-se-à o exemplo de Portugal?…
JAVIER LIZON/EPA/ KIKO HUESCA / REUTERS/Lusa/Afp/TPT/Obs/22/12/2015