‘A estatura de Churchill revelou-se perante a gravidade da ameaça’

Cinquenta anos depois da morte de Churchill, o presidente da secção portuguesa da International Churchill Society defende o legado do estadista.

 

 

Conservador, liberal, rebelde, cáustico e inconformista, Winston Churchill foi tudo isto e mais. Morreu há 50 anos, a 24 de Janeiro de 1965.

 

 
Ao longo de uma carreira política que durou seis décadas, lutou veementemente contra o nazismo e liderou a Inglaterra e a Europa até à vitória na II Guerra Mundial.

 

 

Em entrevista à Renascença, o presidente da secção portuguesa da International Churchill Society, João Carlos Espada, traça o retrato de Churchill como alguém com “uma grande força de vontade, uma grande resistência e sobretudo uma grande fé na tradição ocidental da liberdade, uma convicção que explica a persistência em enfrentar os dois grandes inimigos da sociedade aberta no século XX, o comunismo e o nazismo”.

 

 

 

Diz que é importante recordar Churchill nos dias de hoje. Porquê?

 

 

Churchill teve um papel fundamental no século XX, na defesa das nossas democracias ocidentais, e um papel que podemos mesmo alvitrar que sem ele, em 1940, na chefia do governo britânico, era possível que o resultado não tivesse sido o mesmo. O nazismo estava triunfante no continente europeu, as forças armadas britânicas estavam altamente fragilizadas depois da retirada de Dunkirk. Do ponto de vista estritamente racional era possível pensar que o triunfo do nazismo era inevitável. Foi Churchill que assumiu a responsabilidade da defesa da liberdade ocidental.

 

 
O que teria acontecido à Europa sem Churchill?

 

 

Há um livro muito interessante, publicado em português, que se chama “Cinco Dias em Londres, Maio de 1940”, de John Lukacs, em que ele reconstitui a situação no gabinete de guerra britânico, logo a seguir a Churchill ser nomeado primeiro-ministro. Nessa altura, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Lord Halifax, propõe uma negociação de paz entre a Inglaterra e a Alemanha nazi, e essa proposta poderia ter ido para a frente se não tivesse sido a oposição de Churchill. Ele teve um papel crucial naquele momento, naqueles dias, na escolha da resistência ao nazismo. E tinha passado a década anterior praticamente isolado, criticando o seu próprio governo pelas tentativas de apaziguamento de Hitler e alertando que a única política consistente seria enfrentá-lo.

 

 

E ele nessa posição estava relativamente só…

 

 

Estava relativamente só. Havia um grupo de deputados conservadores que gradualmente foram constituindo uma espécie de gabinete sombra do seu próprio partido, uma situação bastante peculiar, e esse gabinete era dirigido por Churchill. Foram reunindo um conjunto de altos funcionários públicos britânicos, que também é muito peculiar e invulgar, que começaram a dar informações sobre o rearmamento da Alemanha, dados confidenciais que Churchill começa a levar ao parlamento. Em 1939, Churchill é chamado para o Ministério da Marinha pelo primeiro-ministro, Neville Chamberlain, líder da política de apaziguamento, e ao chamá-lo já é um sinal de que o isolamento está a terminar. A imprensa apoia-o abertamente, e passa a ter uma grande popularidade. Quando Churchill é nomeado, um célebre jornal da altura traz em manchete “Winston is Back”.

 

 

 

O livro do autarca de Londres, Boris Johnson, “The Churchill Factor”, pinta o retrato de um homem que por si só pôde fazer a diferença, atribuindo-lhe totalmente o crédito na vitória da II Guerra Mundial. Concorda com este retrato?

 

 

Concordo com o papel crucial que Churchill teve na liderança da resistência britânica, mas não foi ele que fez a resistência sozinho, aliás ele refere-se a isso várias vezes: diz que o “leão” era o povo britânico e que ele apenas “fez o rugido”. Sozinho não teria podido enfrentar Hitler, mas sem a sua liderança decisiva, seria muito difícil haver resistência, porque em Maio de 1940 o próprio gabinete de guerra estava dividido. Churchill foi, de facto, absolutamente decisivo.

 

 

Ele foi visto como um “maverick”, um rebelde, um não conformista, um contra-revolucionário. Esta imagem corresponde à realidade?

 

 

Ele era bastante inconformista, mas não era um contra-revolucionário. A expressão sugere um revolucionário com um sinal político contrário, e na verdade Churchill era contrário a todas as correntes revolucionárias, quaisquer que fossem a cor política. Desde a revolução comunista na Rússia em 1917, Churchill é um crítico acérrimo, um opositor da revolução bolchevique na Rússia, e também, desde a emergência do nazismo, ele é um crítico acérrimo do nazismo.

 

 
Não lhe chamaria um contra-revolucionário. Churchill era um conservador liberal, que tinha muito orgulho na tradição inglesa, no regime parlamentar, na monarquia parlamentar, do governo limitado pela lei, do estado de direito, do governo que presta contas ao parlamento – esse era o ideário político de Churchill, e que definia a Grã-Bretanha há vários séculos.

 

 

E tanto o nazismo como o comunismo traziam propostas muito intrusivas à vida particular de cada cidadão, uma coisa que para os ingleses é muito negativa.

 

 

Há aquela famosa frase: “An Englishman’s home is his castle”, que é muito este espírito de que os modos de vida estão protegidos pela lei, o governo está não acima mas abaixo da lei, incluindo o rei. Quer o nazismo, quer o comunismo apresentaram-se como ideias inovadoras, modernas, e acusavam o sistema parlamentar de ser ultrapassado, envelhecido, incapaz de produzir os resultados que deviam produzir. Eram mensagens de inovação revolucionária, e contra isso Churchill foi sempre imune. Um aspecto importante do posicionamento político dele é a ideia de que a democracia moderna não é uma ruptura com o passado, é o resultado de uma evolução gradual que remonta às origens da civilização ocidental, à tradição grega, romana, ao cristianismo, e portanto, para Churchill, a ideia de que temos de romper com o passado era anátema.

 

 

Num artigo, escreve que Churchill traçou um perfil de Hitler como alguém que vivia com uma raiva latente: não tinha sido aceite na Academia de Belas Artes de Viena, vinha de uma família operária. Era alguém cheio de ressentimentos.

 

 

Hitler era de facto um marginal. Era muito ressentido contra a sociedade estabelecida, contra aquilo que chamamos em tom crítico o “establishment”, ele era claramente contra o “establishment”, porque tinha tido um conjunto de dificuldades na vida. Na Áustria tinha concorrido duas vezes à Academia de Artes e foi recusado. E aqui um “à parte” curioso: Churchill concorreu duas vezes à Academia Militar e só à terceira é que entrou. Mas não ficou ressentido com ninguém.

 

 
Churchill foi tido como um herói. Mas a sua carreira política é frequentemente pontuada por erros – um dos quais a indexação da libra ao padrão ouro, um decisão que teve consequências muito negativas. Como é que ele foi capaz de sobreviver politicamente a estas peripécias?

 

 

Quando hoje recordamos Churchill e o papel insubstituível que ele teve na altura na defesa da liberdade ocidental, com isso não estamos a dizer que Churchill não tenha cometido erros e alguns graves. Ele não era infalível. O ponto interessante é que conseguia recuperar. Tinha uma grande força de vontade, uma grande resistência, e sobretudo uma grande fé na tradição ocidental da liberdade. Logo a seguir à guerra ele faz um discurso importantíssimo em Zurique, em 46, em que faz um apelo à reconciliação entre a França e a Alemanha e à criação de uma comunidade europeia, uma espécie de “Estados Unidos da Europa”. Ele tinha uma grande confiança, uma grande fé e convicção na tradição da liberdade, e via a posição britânica como coluna dorsal dessa tradição. E foi essa convicção e visão que explica a persistência e a decisão de enfrentar os dois grandes inimigos da sociedade aberta no século XX, o comunismo e o nazismo.

 

 

Ao contrário do que é costume atribuir-se aos conservadores, Churchill era sensível às condições sociais dos pobres. Isto demonstra, de alguma maneira, que era um político que extravasava os limites da direita e da esquerda?

 

 

Em 1904 ele abandona a bancada conservadora e junta-se à bancada liberal por duas razões. Uma é o “free trade”, o comércio livre que os conservadores eram contra, tinham a posição proteccionista, que considerava ser uma das principais alavancas para melhorar a condição de vida de todos e em particular dos menos favorecidos, porque permitia aos consumidores terem acesso a produtos mais baratos. A segunda razão, que está particularmente relacionada com a protecção dos mais desfavorecidos, era a chamada questão social.

 

 

Churchill é a favor de uma série de reformas de natureza social. Ele e Lloyd George introduzem os fundamentos do Estado Social nos governos liberais. Em relação a superar um pouco as divisões dos partidos, é um ponto muito interessante. Em Londres há a tradição dos clubes, dos “gentlemen’s clubs”, e ele cria um novo clube, chamado “The Other Club”, que devia ser um ponto de encontro entre pessoas do centro-esquerda e do centro-direita para que pudessem dialogar e reflectir de uma forma mais descomprometida em relação ao clubismo dos partidos tradicionais. Ele procurava promover um diálogo para além das estruturas partidárias, mas não contra.

 

 

O que é que o atrai na figura de Churchill e por que dedicou tanto tempo a estudá-lo?

 

 

Quando pela primeira vez visitei [o filósofo] Karl Popper, em Inglaterra, em 1987, em casa dele, ao olhar para a biblioteca percebi que os livros eram muito seleccionados. Ele não era um coleccionador, tinha os livros fundamentais dos grandes autores. E a certa altura, chego a uma estante que está cheia de livros de Churchill e sobre Churchill. Lembro-me perfeitamente que fiquei muito surpreendido e perguntei: “Por que é que tem aqui uma estante cheia de livros sobre o Churchill, ele era basicamente um político”. Eu disse aquilo num tom um bocadinho paternalista, um bocado irreverente, mas saiu-me espontaneamente, porque era um contraste com Platão e Aristóteles.

 

 
Mandou-me sentar e disse: “Você não sabe porquê, então vou ter de lhe explicar”. Então deu-me uma “lecture” que demorou imenso tempo. E disse “você tem de saber que se não fosse este homem nós teríamos perdido a liberdade na Europa”. E depois começou a falar no papel dele e no que ele representava – no fundo, a ideia da sociedade aberta que Karl Popper tinha defendido. A seguir fui fazer o doutoramento aqui em Oxford e, desde essa conversa, fui começando a ler e à procura de coisas sobre Churchill. Começou assim.

 

 

Há hoje alguém, ou houve entretanto, que se possa considerar como o herdeiro político de Winston Churchill?

 

 

Acho que não. Houve vários líderes que consideraram Churchill como referência. O nome que vem imediatamente à memória é o de Margaret Thatcher, ela insistia muito em citar Churchill. Agora, daí a chamar-lhe herdeira dele, não diria isso. Penso que, felizmente, depois da guerra, todos os nossos grandes líderes políticos do Ocidente se reconhecem na tradição de Churchill.

 

 

E como figura é também difícil encontrar alguém com essas características.

 

 

Acho que sim, mas de certa maneira felizmente, porque não tivemos de enfrentar uma situação com a gravidade dos anos 40. O facto de não encontrarmos ninguém com aquela estatura, não diria isso num sentido pejorativo, porque a verdade é que a estatura de Churchill revelou-se perante a gravidade da ameaça. É importante recordar que todos os líderes políticos das democracias reconhecem o papel e o legado de Churchill na defesa destes valores comuns a todas as democracias, o estado de direito, o governo limitado pela lei, isso é um valor adquirido muito importante. Essa memória do papel de Churchill e dos valores que representou e pelos quais se bateu… O importante é não a perder e, sobretudo, que as novas gerações possam ter contacto com essa história da defesa da liberdade.

 

 

Foto: Arquivos do governo britânico

 
Matilde Torres Pereira

 

 

 

 

 

 

 

Churchill: Dezanove factos sobre o estadista que chorava e pintava

Winston Churchill a pintar em Câmara de Lobos, na Madeira.

 

 

Winston Churchill foi um homem de muitas facetas. Além da sua extensa carreira política como primeiro-ministro do Reino Unido, Churchill pintava e escrevia. Ganhou o Nobel da Literatura e foi aclamado como herói de guerra. Conheça o outro lado de uma das figuras mais notáveis do século XX.

 

 

1. HERÓI NOVO

 
Ganhou fama muito novo, aos 25 anos, ao escapar corajosamente de um campo de prisioneiros na África do Sul durante a Guerra dos Bôeres, onde serviu como correspondente de guerra e oficial do exército. Conseguiu escalar uma parede durante a noite e fugir da prisão. Escondeu-se três dias dentro de uma mina e depois conseguiu apanhar um comboio carregado de lã rumo a Moçambique. De lá, apanhou um barco de volta à África do Sul e correu para a frente de batalha, onde foi aclamado como um herói.

 
2. PRIMEIRO-MINISTRO AOS 65

 

 

Já tinha 65 anos quando assumiu o cargo de primeiro-ministro. A guerra energizou-o. Um jornalista norte-americano escreveu, em 1941, “As responsabilidades que agora lhe cabem são maiores que as carregadas por qualquer outro ser humano na terra. Seria de esperar que este peso teria nele um efeito opressor, mas não. A última vez que o vi, parecia vinte anos mais novo do que antes da guerra, e o seu espírito enaltecido transmite-se para o povo”.

 

 

Churchill - Dezanove factos sobre o estadista que chorava e pintava2

Churchill apresenta o seu sinal V para lembrar a Vitória na Europa

 

 
3. UM TELEGRAMA FULCRAL

 

Assim que a Inglaterra declarou guerra à Alemanha, Churchill foi imediatamente chamado a ocupar o seu antigo posto de ministro da Marinha. O anúncio é feito pelo Almirantado à Frota através de um telegrama em que se lia “Winston is back” – “Winston está de volta”.

 

 
4. CONSERVADOR, LIBERAL, CONSERVADOR

 

 

Mudou duas vezes de partido, passando de conservador a liberal ainda antes da I Guerra Mundial e voltando atrás durante os anos 20.

 

 

5. 160.000 QUILÓMETROS

 
Apesar de ter uma saúde frágil, sofrendo várias doenças ao longo da vida, percorreu mais de 160.000 quilometros durante a II Guerra Mundial, sob o nome Colonel Warden. Acabou por morrer com 90 anos.

 
6. “LIFE POD”. E METRALHADORA

 

 

Durante a II Guerra Mundial, Churchill precisou de uma câmara pressurizada, chamada “Life Pod” para voar, devido à sua saúde. Incluía um telefone, um cinzeiro e um sistema de circulação de ar para poder fumar. Quando viajava de barco, levava um bote salva-vidas equipado com uma metralhadora para poder “resistir a captura a qualquer custo”.

 

 

7. O ESTRATEGA COM ERROS

 

 

Tinha uma personalidade contraditória e cometeu vários e alguns graves erros. O marechal Alan Brooke, chefe das Forças Armadas, escreveu no seu diário: “A coisa mais maravilhosa é que três quartos da população mundial imagina que Churchill é um dos maiores estrategas da História e o outro quarto não faz ideia de como ele representa uma ameaça pública! É melhor que o mundo nunca saiba. Sem ele, a Inglaterra estaria perdia, com ele, a Inglaterra esteve vezes sem conta à beira do desastre. Nunca tanto admirei e desprezei um homem simultaneamente. Extremos tão opostos nunca antes foram encontrados no mesmo ser humano”.

 

 

8. O LÍDER QUE CHORAVA

 

 

Sofreu de depressão clínica ao longo da vida, a que chamava “Black Dog” – o “Cão Negro” que o perseguia fielmente. Era sensível, com as emoções à flor da pele, e chorava frequentemente em reuniões em que recebia más notícias. Um destes episódios aconteceu na Casa Branca, em frente ao Presidente dos Estados Unidos. Quando lia os seus discursos na rádio, era frequente ouvir-se a voz embargada do primeiro-ministro, emocionado com as exortações que fazia ao povo britânico.

 

 

9. AMIGO DE ROOSEVELT

 

 

Manteve uma relação próxima com o Presidente norte-americano Franklin Roosevelt, na companhia de quem passou mais de 120 dias e com quem trocou mais de 1.700 cartas e telegramas. Quando os japoneses atacaram Pearl Harbor em 1941, o primeiro pensamento de Winston Churchill foi: “Ganhámos a guerra!”, tal a sua confiança no apoio militar norte-americano.

 

 

Churchill - Dezanove factos sobre o estadista que chorava e pintava3

Churchill no Palácio de Livadia, durante a Conferencia de Yalta, na Crimeia, que decorreu de 4 a 11 de Fevereiro, em 1945, aonde se discutiu e se repartiu a reconstrução da Europa após a Segunda Guerra Mundial. Nesta fotografia está representada a Aliança Militar secreta entre a União Soviética, os Estados Unidos e o Reino Unido.

 

 
10. “OPERAÇÃO IMPENSÁVEL”

 

 

Com receio da ameaça do comunismo após a vitória na guerra, Churchill fez planos para um ataque surpresa contra a União Soviética. Chamado “Operação Impensável”, o plano contemplava o rearmamento de 100.000 antigos soldados nazis e teria espoletado a terceira guerra mundial quase antes do final da segunda.

 

 

11. A CORTINA DE FERRO

 

 

Apesar do termo já ter sido utilizado antes, Churchill foi responsável pela popularização do termo “cortina de ferro”. Num telegrama para o Presidente norte-americano Harry S. Truman, em 1945, em que expressava a sua apreensão sobre as movimentações soviéticas, declarava: “Uma cortina de ferro está corrida ao longo da frente [soviética]. Não sabemos o que se passa por trás dela”. A partir daí, as autoridades ocidentais referir-se-iam continuamente à “cortina de ferro” ao falar sobre a URSS.

 

 

12. ADORADO NAS RUAS, REJEITADO NAS URNAS

 

 

Embora tenha gozado de grande popularidade entre o povo britânico, não foi reeleito depois da II Guerra Mundial. Já foram para isto dadas muitas razões, mas a principal terá sido o desejo, disseminado entre a população, de reformas pós-guerra e a crença de que o homem que tinha liderado a Inglaterra em guerra não era o homem para a liderar em tempos de paz.

 

 

13. O PINTOR NA MADEIRA

 

 

Antes de se tornar primeiro-ministro pela segunda vez, em 1951, Churchill queria retirar-se para algum sítio que fosse “quente, com banhos, confortável e florido” onde pudesse pintar e trabalhar nas suas memórias de guerra. Um amigo sugeriu a Madeira, e recomendou que ficasse no Reid’s Palace Hotel, no Funchal. Reza a lenda que Churchill explorava a ilha de Rolls-Royce, com a mala do carro convertida em bar portátil. O social do hotel não lhe interessava – preferia pintar a vila de Câmara de Lobos, a poucos quilómetros do Reid’s.

 

 

14. O POLÍTICO NOBEL (DA LITERATURA)

 

 

Ganhou o Prémio Nobel da Literatura em 1953. Foi um autor prolífico, e escreveu um romance, duas biografias, três volumes de memórias e ainda vários livros de história sob a assinatura Winston S. Churchill. Ganhou o Prémio Nobel pela sua “mestria da descrição histórica e biográfica, tal como a sua brilhante oratória na defesa dos valores humanos”.

 

 

15. UM DUELO

 

 

Lady Astor, a primeira mulher deputada em Inglaterra, estava constantemente em conflito com Churchill. Durante um debate, declarou que, se se tivesse casado com ele, teria-lhe envenenado o chá. Churchill respondeu: “Se eu fosse casado consigo, Madame, eu beberia-o”.

 

 

Churchill - Dezanove factos sobre o estadista que chorava e pintava4

 
16. NÃO ME TIREM O CHARUTO

 

 
Quando o fotógrafo Yousef Karsh o retratou, retirou o charuto directamente da boca de Churchill, daí a cara de contrariedade no famoso retrato.

 

 

17. A DEFINIÇÃO DE TACTO

 

 

Winston Churchill descreveu o tacto como a “capacidade de dizer alguém para ir para o Inferno de forma a que fiquem entusiasmados com a ideia da viagem”.

 

 

18. “OPERATION HOPE NOT”

 

 

No dia da sua morte, a 24 de Janeiro de 1965, Big Ben tocou as últimas badaladas às 9h45 e depois remeteu-se ao silêncio durante todo o dia. Qualquer coisa como 321.360 pessoas passaram, ao longo de três dias, em Westminster Hall, em Londres, para prestar homenagem ao estadista. As instruções para o funeral de Estado, ordenado pela Rainha Isabel II, chamavam-se “Operation Hope Not”. O número de chefes de Estado representados no funeral – 112 – apenas foi superado 40 anos depois, no funeral do Papa João Paulo II.

 

 

19. O EPITÁFIO

 

 

O epitáfio de Churchill declara: “Estou pronto para conhecer o meu Criador. Se o meu Criador está preparado para a grande provação de me conhecer, é outra história”.

 

 

 

Foto: DR

por Matilde Torres Pereira

 

 

 

A mulher negra mais rica do mundo

Com uma fortuna de 2,8 mil milhões de euros ligada ao petróleo e à moda, Folorunsho Alakija é a mulher negra mais rica do mundo.

 

 
“Posso passar horas e horas a fio a trabalhar sem pensar em mais nada. A minha mãe treinou bem os seus filhos para que conseguissem trabalhar muitas horas por dia sem que nos lembremos sequer de comer. Não que ela quisesse que passássemos fome, nada disso. Mas educou-nos de tal forma que aprendemos, desde cedo, o que significa o empenho e o trabalho árduo.”

 

 
As palavras de Folorunsho Alakija, em entrevista ao jornal “Daily Sun News”, ilustram bem uma filosofia de vida dedicada à carreira e os frutos da mesma estão à vista. É ela a nigeriana de 63 anos que não só é a mulher mais rica em África como substituiu recentemente Oprah Winfrey como a mulher de raça negra mais rica do mundo.

 

 

Dona de dois impérios, um deles ligado ao petróleo (Famfa Oil) e outro à indústria da moda (Supreme Stitches), Folorunsho Alakija já acumula uma fortuna no valor de 2,8 mil milhões de euros, cerca de 254 milhões de euros a mais que o valor do património detido pela empresária e apresentadora de TV norte-americana, segundo informou a revista “Ventures Africa”.

 

 

 

Nuno Cardoso

JN

 

As novas estratégias dos fundamentalistas

Estarão os ataques terroristas na Europa a mudar? Magnus Ranstorp acredita que sim. O director do Centro de Estudos de Ameaças Assimétricas da Faculdade Sueca de Defesa Nacional, e especialista em grupos fundamentalistas islâmicos, como Hezbollah, Hamas, al-Qaeda e Estado Islâmico.

 

 
Os últimos ataques em Paris parecem apontar no mesmo sentido. As bombas foram substituídas por ataques, de estilo militar, dirigidos a grupos específicos (caricaturistas, polícias e judeus). Mas onde vão os fundamentalistas arranjar armas para fazer estes ataques?

 

 
A 9 de Janeiro, após o raid que culminou com a eliminação dos irmãos Said e Chérif Kouachi, os extremistas islâmicos alegadamente responsáveis pelo ataque ao Charlie Hebdo, os agentes da autoridade deparam-se com um arsenal impressionante. Junto aos corpos estava um lança-rockets carregado, dez granadas de fumo, duas metralhadoras Kalashnikov e duas pistolas automáticas.

 

 
No supermercado kosher tomado de assalto pelo seu cúmplice, Amedy Coulibaly, a polícia encontrou uma Kalashnikov, uma pistola militar Skorpion, duas pistolas automáticas Tokarev, duas metralhadoras, um colete à prova de bala e munições. E no apartamento de Gentilly, que lhe servia de esconderijo e de base de operações, havia ainda mais Kalashnikov, as AK47, além de dinamite, gás lacrimogéneo, pistolas, facas e munições.

 

As novas estratégias dos fundamentalistas2

Com o fim do bloco soviético, no início dos anos 90, o mercado negro foi inundado por elevadas quantidades de artilharia pesada. Muita dessas armas foram usadas nos conflitos que abalaram os Balcãs, na mesma década, e outras continuam à venda.

 

 

 

Em 1997, o mercado negro da venda de armas voltou a florescer depois de 500.000 armas terem sido roubadas num depósito do exército albanês.

 

 
Mas nem só do Leste provêem as armas que se compram na Europa. De acordo com documentos da Comissão Europeia, há mais de 500.000 armas desaparecidas dentro do espaço da União Europeia, algumas foram perdidas, outras roubadas.

 

As novas estratégias dos fundamentalistas3

Apesar de haver agora maior vigilância e de ser mais difícil a circulação, há armas a entrar na Europa vindas de África e do Médio Oriente e crê-se que a máfia italiana esteja a passar armamento dos Balcãs para a Europa Ocidental, nomeadamente para França.

 

 
E assim, a Europa confronta-se com uma nova ameaça. Um pequeno grupo, fortemente armado e com treino para-militar, pode fazer quase tantos estragos como uma bomba, como se viu em Mumbai, em Novembro de 2008, aquando do assalto a uma estação de comboios e aos hotéis Taj Mahal e Oberoi onde foram mortas 160 pessoas, ou em 2012 em Toulouse, quando um só homem atacou alvos específicos (judeus e militares), deixando sete mortos.

 

 

Os ataques são muito menos sofisticados, mas igualmente eficazes do ponto de vista dos jihadistas. Objectos do dia a dia-a-dia, como carros ou panelas de pressão, podem transformar-se em armas letais e estão a aterrorizar o Ocidente.

 

Sábado

 

 

 

A guerra colonial na grande estratégia de Salazar

Salazar via a guerra como uma forma de ganhar tempo para melhorar as condições de vida e conquistar o coração e as mentes dos povos coloniais. E apresentava-a como fazendo parte da defesa do Ocidente.

 

 
No quarto texto desta série em que se procura analisar e contrastar alguns dos relatos mais tradicionais sobre o que foi a guerra colonial, analisamos hoje a estratégia seguida por Salazar. Foi uma estratégia que conseguiu sustentar o esforço de uma guerra travada em três frentes mas que estava condenada ao insucesso, pois contrariava a grande estratégia europeia ocidental e norte-americana que, ao não partilhar as suas preocupações e o seu desejo de preservar a África subsaariana sob tutela colonial, seguiu por outros caminhos.

 

 
Nos três artigos anteriores abordámos, sucessivamente, os seguintes temas: 1. Como Salazar preparou a guerra colonial; 2. Angola, 1961: como os independentistas prepararam a guerra; 3. Para haver “capitães” teve que haver generais.

 

 

 
IDENTIDADE E POLÍTICA

 
Num discurso proferido a 12 de Agosto de 1963, Salazar fez questão de colocar claramente a possibilidade e a necessidade do “povo” português, da “metrópole” e do “ultramar”, se pronunciar em “acto solene e público sobre o que pensa da política ultramarina que o Governo tem prosseguido”.

 

 
Salazar apresentou a política ultramarina, confrontada naquele ano de 1963 com uma frente de guerra em Angola e outra na Guiné, como decorrendo do facto de ter sido definida e executada para garantir e por garantir a “própria existência e identidade da Nação”.

 

 

A guerra colonial na grande estratégia de Salazar2

 
Salazar fez ainda questão de sublinhar aqueles que seriam os três elementos essenciais da “política ultramarina”: dois foram enunciados pela negativa, um pela positiva. Proclamou, em primeiro lugar, que a política ultramarina não tinha fundamentos económicos. Declarou depois que a reacção política e militar que a política ultramarina vigente provocara, e tal como protagonizada pelo movimentos de libertação, como a própria existência dessa política ultramarina, não decorriam da natureza autoritária do Estado Novo. Salazar, aliás, e como seria natural, negava que tanto na “metrópole” como no “ultramar” vigorasse qualquer “política de opressão.”

 

 

Por fim, o presidente do Conselho apresentou a política ultramarina, confrontada naquele ano de 1963 com uma frente de guerra em Angola e outra na Guiné, como decorrendo do facto de ter sido definida e executada para garantir e por garantir a “própria existência e identidade da Nação”. Estas razões eram de tal forma ponderosas que o levavam a afirmar que uma eventual alteração de rumo da política ultramarina, como a sua manutenção, teria sempre consequências “decisivas para todos e definitivas para o futuro.”

 

 

Salazar e os demais arquitectos e executantes da política ultramarina entendiam a preservação da integridade, total ou parcial, do estado colonial não tanto como um elemento básico na defesa do chamado interesse nacional, definido política, económica e sociologicamente, mas enquanto fórmula única de afirmação e de salvaguarda da identidade política e cultural portuguesa.

 

 

A guerra colonial na grande estratégia de Salazar3

 

Um mapa que é todo um programa: “Portugal não é um país pequeno”. Estava em todas as escolas do país. E fora organizado por Henrique Galvão, que mais tarde se tornaria um temível opositor de Salazar.

 

 

O recurso ao argumento identitário é relativamente simples de explicar. Desde a década de 1950, depois da sociedade internacional, e especialmente a europeia, ter conhecido um processo de transformação acelerada provocada pela Grande Depressão e pela Segunda Guerra Mundial, e justamente quando acabava de ter início uma etapa, muito incerta, de construção daquele que viria a ser um novo paradigma de organização do sistema internacional designado por Guerra Fria, o discurso identitário oficial português assentou definitivamente no pressuposto segundo o qual a nação portuguesa seria histórica e politicamente uma só “comunidade” mas na qual a dimensão pluricontinental e multirracial era a sua pedra angular, ainda que reconhecidamente “inventada”, “imaginada” e sustentada pela primazia histórica e política do Portugal europeu.

 

 

As razões de uma política foram apresentadas e glosadas nestes termos de forma exaustiva pelos seus responsáveis até ao momento em que Salazar foi forçado a abandonar a presidência do Conselho. Mas já o problema da definição e apresentação da grande estratégia que sustentou a política ultramarina adoptada, com aparência definitiva e imutável depois da revisão constitucional de 1951, e a guerra de contra-insurgência que mais tarde se seguiu, não mereceu ainda a atenção devida.

 

 
Salazar defendeu a política colonial de Portugal com base numa grande visão sobre o que significava o Atlântico para o Ocidente: “se neste mar se criassem bases comunistas, se uma única das nações litorais fosse hostil à nossa concepção de civilização, o Atlântico em vez de uma ligação capital transformava-se numa barreira.”

 

 

No geral, diga-se, as análises dominantes sobre as razões da guerra tendem a centrar-se na vontade e nas idiossincrasias de um homem (ou de uma clique político-militar e económica) que certamente desempenharam um importante papel, mas a ignorar a avaliação necessariamente feita pelos decisores políticos sobre as implicações que a médio-longo prazo o prosseguimento, ou não, de uma política certamente acarretaria.

 

 
A GRANDE ESTRATÉGIA DE SALAZAR

 

 

A grande estratégia de Oliveira Salazar, e do Estado Novo, no que diz respeito às opções de política ultramarina, ou colonial, terá origens mais ou menos longínquas. Podem, por isso, ser identificadas, em alguns dos seus aspectos, ainda durante a vigência da Monarquia Constitucional ou da I República, mas também nos anos em que vigorou a Ditadura Militar ou quando o Estado Novo dava os seus primeiros passos, procurando erguer-se e consolidar-se. No entanto, em termos mais imediatos, as suas origens detectam-se nos anos da Segunda Guerra Mundial, primeiro, na reformulação discreta da política colonial prosseguida no imediato pós-guerra, depois, e, finalmente, nas importantes reformas da política colonial, de política económica e na viragem sofrida pela política externa ocorridas a partir do início da década de 1950 e em finais da década de 1940, respectivamente.

 

 

A guerra colonial na grande estratégia de Salazar4
1961 fora o ano mais difícil de Salazar

 

 

A revisão constitucional de 1951, a aprovação de uma nova Lei Orgânica do Ultramar Português em 1953, a aceitação da ajuda Marshall em 1948 e a adesão à NATO em 1949, além da cedência à administração Truman, no imediato pós-guerra, de autorização para o uso das infra-estruturas militares aéreas e navais localizadas na ilha Terceira, foram acontecimentos que não tendo em mente apenas uma melhoria substancial do enquadramento estratégico em que a política colonial podia ser executada, tinham ainda assim grandes implicações naquele domínio.

 

 

Nas vésperas do deflagrar da guerra em Angola e da vaga independentista que assolou a África subsaariana a partir de 1960, numa entrevista a um jornal francês, Salazar ensaiou uma explicação e uma contextualização ambiciosa e relativamente original não só sobre as implicações da política ultramarina portuguesa já tantas vezes enunciada e em plena execução, mas também sobre as consequências da continuação daquela imensa fatia do continente africano sob domínio político das potências europeias ali instaladas. Segundo o chefe do Governo português apenas com a preservação dessa presença seria possível garantir que “o Atlântico pertence[sse], de facto, ao Ocidente até nova ordem!” Este oceano, que constituía “um indispensável, um formidável traço de união entre a Europa e o continente americano”, podia dessa forma ser preservado como um “ideal instrumento de vigilância que se prolonga[va] até aos dois pólos.”

 

 

O argumento de Salazar era que a política ultramarina portuguesa, de preservação da soberania de Lisboa, além de assentar numa legitimidade histórico-jurídica, na obra de construção de sociedades assentes no princípio do multirracialismo e da elevação material e cultural das populações nativas da África “portuguesa”, também pretendia contribuir para a preservação do continente africano na esfera de influência europeia ocidental.

 

 
No entanto, alertava Salazar, “se neste mar se criassem bases comunistas, se uma única das nações litorais fosse hostil à nossa concepção de civilização, o Atlântico em vez de uma ligação capital transformava-se numa barreira.” Ou seja, a política ultramarina portuguesa, de preservação, ainda que não por tempo ilimitado, da soberania de Lisboa nos territórios ultramarinos, além de assentar naquilo que seria uma indiscutível legitimidade histórico-jurídica, na obra exemplar de construção de sociedades assentes no princípio do multirracialismo e da elevação material e cultural das populações nativas da África “portuguesa”, pretendia contribuir para aquilo que seria a preservação do continente africano na esfera de influência europeia ocidental.

 

 

Ora a capacidade europeia de preservar a sua influência sobre a África subsaariana permitiria ao “velho continente” tentar e conseguir salvaguardar a sua segurança, a sua prosperidade, a sua identidade e a sua autonomia numa conjuntura particularmente adversa porque marcada pelo impacto da Segunda Guerra Mundial e da Guerra Fria. Finalmente, uma África europeia seria a único meio para garantir a segurança do Atlântico e dos três continentes banhados por este oceano, assegurando assim que este e aqueles continuariam a ser “ocidentais”.

 

 
MUDANÇAS NA POLÍTICA COLONIAL

 
Uma vez iniciada em 1961 em Angola a primeira fase do confronto militar contra o domínio colonial português, e alargada essa confrontação em anos subsequentes aos territórios da Guiné e de Moçambique, esta visão estratégica sobre o lugar da África negra e da África portuguesa no contexto estratégico de defesa da Europa e do “ocidente” teve que ser revisto.

 

A guerra colonial na grande estratégia de Salazar5
Os massacres do norte de Angola em 1961 permitiram a Salazar mobilizar o país para uma guerra que em breve teria três frentes

 

 

É verdade que Salazar continuou a sustentar a ideia, tal como muitos dos seus colaboradores políticos e militares, que além de se defender a si próprio, Portugal defendia nas suas províncias ultramarinas os interesses materiais (tanto políticos como económicos) e os princípios morais da Europa e do “Ocidente”. No entanto, e sobretudo no ambiente circunspecto dos gabinetes, o pensamento estratégico português teve, de facto, que ser ajustado à nova realidade e aos novos desafios que, além de militares e africanos, eram também civis e globais.

 

 

Os elementos mais importantes trazidos para o campo da decisão e da reflexão política, tal como determinados por esta nova realidade, foram, sem dúvida, e em primeiro lugar, o reconhecimento de que a guerra, ou as guerras, uma vez que em três anos aquela se alargou a três “províncias ultramarinas”, teriam efeitos políticos, económicos e militares difíceis de antecipar e certamente impossíveis de controlar.

 

 
A partir de 1962 o regime procedeu à transferência de competências e de recursos para os governos das províncias ultramarinas, e tentou uma estratégia de negociação político-diplomática com líderes nacionalistas da África portuguesa, com governos africanos tidos como moderados, com governos “ocidentais” e com o secretário-geral das Nações Unidas.

 

 

Em segundo lugar, e muito embora a guerra tenha sido entendida pela liderança política e militar do Estado Novo como um instrumento eventualmente capaz de forçar os movimentos de libertação a não aceitarem outra solução política para a questão colonial que não fosse aquela determinada pelas autoridades portuguesas, a verdade é que desde 1962, muito por efeito da invasão e ocupação de Goa por tropas da União Indiana, mas também como resultado do impacto político interno e internacional da guerra, o Governo português foi ensaiando mudanças na sua política colonial.

 

 

 

Assim, procedeu à transferência de competências e de recursos para os governos das províncias ultramarinas, e procurou pôr em prática uma estratégia de negociação político-diplomática com líderes nacionalistas da África portuguesa, com governos africanos tidos como moderados, com governos “ocidentais” e com o secretário-geral das Nações Unidas.

 

 

 

Ainda que, no plano político-diplomático, boa parte destas iniciativas não tenham produzido resultados, ou que a estratégia descentralizadora de gestão político-administrativa das colónias tenha ficado aquém daquele que era o desejo dos espíritos mais reformistas do salazarismo metropolitano e ultramarino, a verdade é que as intenções e os factos por elas gerados tiveram um significado que foi não apenas político mas, também, estratégico.

 

 

A guerra era parte de uma estratégia com o intuito de comprar tempo para construir o estado, a nação e o sistema social que Governo e regime garantiam existir antes e após o início do confronto militar em três frentes.

 

 

Ou seja, por um lado o Governo e o regime político que decidiram aceitar a guerra como parte da solução para resolver a questão colonial, nomeadamente entre 1961 e 1968, nunca a pensaram nem encararam como uma matança sem sentido e interminável. Pelo contrário, viram-na sempre como um instrumento, ou meio, usado para atingir objectivos políticos. Ou seja, a guerra era parte de uma estratégia com o intuito de comprar tempo para construir o estado, a nação e o sistema social que Governo e regime garantiam existir antes e após o início do confronto militar em três frentes.

 

 

No entanto, a substituição de Oliveira Salazar por Marcello Caetano, nas suas implicações políticas e estratégicas visíveis a partir de 1969, e a metamorfose sofrida pelas cúpulas da instituição militar, a que se juntaram mudanças em circunstâncias exteriores à questão colonial tal como interpretada pelo estado português, acabaram por inviabilizar a continuidade da estratégia prevalecente até aos primeiros meses do consulado marcelista.

 

 
A PEQUENA ESTRATÉGIA OU A CONQUISTA DOS CORAÇÕES E DAS MENTES

 

 

 

No plano político, e em particular no plano estritamente militar, a estratégia é um processo racional. Seja a grande estratégia, seja a apenas a estratégia enquanto sinónimo de guerra. Ambas, porém, sucumbem, ou podem sucumbir ao imponderável ou ao facto de colidirem com outras formas de pensar estrategicamente e de executar esse pensamento estratégico. A grande estratégia de Salazar sucumbiu às mãos de uma grande estratégia europeia ocidental e norte-americana que não partilhava as suas preocupações e o seu desejo de preservar a África subsaariana sob a soberania europeia, tal como subsistiu até finais da década de 1950, e o oceano Atlântico como um “mar” exclusivamente “ocidental”.

 

A guerra colonial na grande estratégia de Salazar6

Rebeldes desfilam num acampamento em Angola: o ditador acreditou que podia conquistar o coração e as mentes dos povos africanos

 

 
A pequena estratégia, no entanto, foi salvaguardada e executada até 1969 e dependeu em grande medida do facto de ter sido posta em prática um modo de fazer a guerra que por um lado correspondia à quantidade e à qualidade dos recursos humanos e materiais que estado e sociedade portuguesa – na metrópole e no ultramar – dispunham, e que por outro procurou não a derrota militar dos inimigos mas a conquista, ou o controle, dos “corações” e das “mentes” das populações directamente envolvidas nas acções militares de insurgência e de contra-insurgência.

 

 

A pequena estratégia portuguesa beneficiou ainda até 1969 do facto de ter sido capaz de estabelecer a diferença, nos três teatros de operações militares, entre aqueles que possuidores de corações “duros” combatiam pela afirmação da sua identidade e, em última análise, por uma independência política, e aqueles que possuidores de mentes “abertas” transigiriam a partir do momento em que constatassem uma melhoria substancial e continuada da governação.

 

 
A guerra colonial foi, portanto, e por um lado, resultado da elaboração e aplicação de uma grande estratégia delineada após a Segunda Guerra Mundial. No entanto, e por outro lado, a guerra colonial forçou a definição de uma pequena estratégia ajustada aos efeitos não só daquele conflito mas também de uma alteração dos condicionalismos nacionais e internacionais.

 

 

 

 

05/10/2014
Fernando Martins

 

 

 

 

O “moral” das tropas em África

O moral das tropas portuguesas manteve-se sempre em níveis elevados durante toda a guerra colonial, defende historiador Fernando Martins em mais um artigo da série que o Observador tem vindo a editar.

 

 
Por meados da década de 1960, num final de tarde, em Buela, povoação situada no norte de Angola, “bem junto” à fronteira com o Zaire, o aquartelamento onde se encontrava instalada a Companhia de Caçadores 670 foi alvo de um ataque executado por homens da UPA/FNLA. “Após umas curtas rajadas de pistola-metralhadora” choveram “morteiradas, tiros diversos de espingardas automáticas, [e mais] rajadas de pistolas-metralhadoras”. O “aquartelamento” esteve sob flagelação inimiga durante “largos minutos”, especialmente “a zona da parada e do refeitório”, varrida por “fogo intenso e cruzado”.

 

 
“MORTEIRADAS” E “RAJADAS”

 
César Oliveira, autor deste relato e na altura, ao que tudo indica, alferes miliciano, racional ou intuitivamente percebeu que não “podia abandonar e deixar «sem rei nem roque»” os seus “homens, por quem, desde Chaves, me sentia responsável e quase «guardião» da sua própria vida.” Por isso, seminu, “com apenas cuecas e botas”, pegou numa arma automática (a belga FN) e “em algumas granadas de mão”, decidindo-se a atravessar a “parada varrida pelo fogo «inimigo»”, o que fez num momento em que tudo parecia “mais «calmo»”, correndo aos “«ziguezagues» como aprendera, e também ensinara,” para junto dos seus “homens”. Quase a “meio do percurso” sentiu um “ardor intenso na perna esquerda, bem perto do pé”, mas continuou a correr.

 

 

Uma metralhadora pesada Breda, M37, de origem italiana, transformou-se num auxiliar precioso. Foi usada para disparar “sem cessar, às cegas”, porque não se via ninguém, até que o “cano” ficou quase “rubro de tanto metralhar”. Organizou-se depois e como se pode o “contra-ataque à morteirada, disparando a esmo, a torto e a direito, para tudo quanto era lado”.

 

 

O oficial miliciano César Oliveira, futuro deputado do Partido Socialista, era então um estudante universitário precocemente mobilizado, empedernido oposicionista ao salazarismo e crítico convicto daquilo que seria o absurdo da política colonial portuguesa, além de avesso aos princípios da instituição militar em que se vira compulsivamente incorporado talvez um par de anos antes dos acontecimentos aqui relatados. Foi no entanto ele que, nesse dia em Buela, organizou a “defesa” com a ajuda de vários camaradas que nomeia.

 

 

Uma metralhadora pesada Breda, M37, de origem italiana, transformou-se num auxiliar precioso. Foi usada para disparar “sem cessar, às cegas”, porque não se via ninguém, até que o “cano” ficou quase “rubro de tanto metralhar”. Organizou-se depois e como se pode, sob a liderança do capitão Esteves de Almeida, o “contra-ataque à morteirada, disparando a esmo, a torto e a direito, para tudo quanto era lado”.

 

 

O moral das tropas em África2

 

Do ataque resultou, além de um ferimento grave de que foi vítima o 1.º cabo Armando, um ferido ligeiro (justamente o autor do relato). O “ardor forte e intenso” que sentira na perna enquanto atravessara a parada em grande correria e debaixo de fogo fora provocado por um “pequeníssimo” estilhaço de uma granada de morteiro. Iniciado o tratamento dos dois únicos feridos – o mais grave, que sobreviveu, seria evacuado na manhã seguinte –, e depois de se começar a fazer uma primeira avaliação dos estragos causados pelos atacantes, o aquartelamento voltaria a estar sob fogo dos guerrilheiros, embora desta vez ataque tenha sido “menos forte e mais curto”, não provocando sequer baixas. Porém, as munições, especialmente as granadas de morteiro, foram quase todas gastas.

 

 

O QUE É E COMO SE CONQUISTA E PRESERVA O “MORAL” DOS COMBATENTES.

 

 

Este relato, como outros sobre aspectos mais prosaicos da vida deste oficial miliciano, quer durante o cumprimento da sua “comissão” em Angola, quer durante a recruta feita na metrópole, ensina alguma coisa sobre um dos elementos mais importantes, e em certa medida até determinante, para o desfecho de uma batalha, de uma campanha ou de uma guerra: o do moral dos militares. Na sua aparente simplicidade permite-nos perceber que o êxito ou o fracasso de um militar, ou dos militares, em combate são determinados pelo seu estado moral, sendo que um exército só é bem-sucedido, i.e. vencedor, se, para além de bem equipado e bem liderado, possuir um espírito combatente claramente superior ao do(s) inimigo(s).

 

 

 O moral das tropas em África6
O Marechal Foch

 

 
Como deduziu em 1903 o marechal Foch, fazendo uma constatação que lhe parecia óbvia e que se tornaria célebre nos meios militares dedicados à avaliação dos resultados da acção de exércitos treinados e enviados para matar, se a “guerra” era igual ao domínio da força moral, a “vitória” numa guerra decorria da “superioridade moral” dos vencedores e da “depressão moral” dos vencidos.

 

 

Uma avaliação do moral militares resumia-se a criar condições para que estes fossem capazes de criar e preservar a maior quantidade de tempo possível um elevado, ou pelo menos razoável, espírito de combate.

 

 
Note-se, porém, que o termo “moral” foi usado pelo marechal tal como fora utilizado por muitos dos seus antecessores, por alguns dos seus contemporâneos e por aqueles que vieram depois dele, em análises várias que foram sendo feitas sobre a guerra e o espírito combatente (ou de combate) dos militares. Não dizia respeito a uma realidade com claras ou óbvias conotações éticas, ou seja enquanto interpretando a acção e os objectivos dos beligerantes como encarnação do bem e/ ou do mal. “Moral” tinha aqui um sentido essencialmente emocional e/ou psicológico que permitia que, por exemplo, os militares em combate não se rendessem a uma espécie de instinto natural de sobrevivência ou de auto-preservação.

 

 

Como deduziu em 1903 o marechal Foch, fazendo uma constatação que se tornaria célebre nos meios militares dedicados à avaliação dos resultados da acção de exércitos treinados e enviados para matar, se a “guerra” era igual ao domínio da força moral, a “vitória” numa guerra decorria da “superioridade moral” dos vencedores e da “depressão moral” dos vencidos.

 

 
Por outro lado, uma avaliação sobre o moral das forças armadas não buscava nem conhecer nem, sobretudo, atingir um nível moral irrepreensível capaz de fazer com que a generalidade, senão mesmo a totalidade, dos militares se comportassem como heróis no campo batalha, fosse numa frente guerra descrita como “convencional”, fosse numa outra definida como “irregular”. Uma avaliação do moral militares resumia-se a criar condições para que estes fossem capazes de criar e preservar a maior quantidade de tempo possível um elevado, ou pelo menos razoável, espírito de combate.

 

 

O moral dos militares é importante, para não dizer essencial, numa guerra. Mas é-o ainda para a população civil que directa ou indirectamente sustenta uma guerra e paga um preço mais ou menos elevado pela existência de um conflito militar.

 

 
QUATRO FACTORES DE MORAL MILITAR

 

 

No que diz respeito às Forças Armadas a questão da sustentação do moral dos combatentes tem sido explicado à luz de quatro variáveis. Em primeiro lugar, tem-se defendido que um bom estado moral do militar depende do primado dos pequenos grupos de combatentes na organização militar para a guerra na frente, nomeadamente através da sua criação, consolidação e preservação.

 

 

Esta explicação, porém, tem as suas limitações, em especial pelo facto de muitos exércitos terem conseguido preservar um bom estado moral e, portanto, disponibilidade para continuar a lutar, a matar e a morrer mesmo em situações e/ou organizações em que os pequenos grupos não são a forma dominante de organização, ou em que os pequenos grupos são dizimados rapidamente como consequência da intensidade e violência dos combates.

 

 

Esta e outras limitações encontradas no modelo do pequeno grupo enquanto sustentáculo moral de forças militares, fizeram com que historiadores e outros estudiosos deste fenómeno tivessem identificado a “ideologia” como o cimento da “motivação em combate.” Ou seja, aquilo que a lealdade de um pequeno grupo não podia garantir era no fim de contas garantido pela forma como um conjunto mais ou menos tosco ou sofisticado de ideias políticas era inculcado em tropas mobilizadas para combaterem.

 

O moral das tropas em África3

 
No entanto, e só por si, a doutrinação ideológica, tal como solidariedade entre combatentes organizados em pequenas unidades militares (pelotão, companhia ou mesmo batalhão, no caso da infantaria), não explica por si só as razões pelas quais alguns exércitos possuem e conseguem preservar um elevado moral ou espírito de combate.

 

 
Uma variável igualmente considerada enquanto elemento de sustentação da motivação em combate assenta fundamentalmente em factores “negativos”, entre os quais se destaca o grau, a natureza e a eficácia das punições impostas aos combatentes.

 

 
É verdade que fornecer formação política (patriótica ou nacionalista) é importante quando se envia um militar para a frente de combate, da mesma que deve ser inculcado o sentido de dever que o faz aceitar a mobilização ou até oferecer-se como voluntário. No entanto, enquanto elemento capaz de criar e sustentar um elevado moral em combate, a doutrinação e a formação política-ideológica é um elemento necessário mas não suficiente.

 

 

A terceira variável igualmente considerada enquanto elemento de sustentação da motivação em combate assenta fundamentalmente em factores “negativos”, entre os quais se destaca o grau, a natureza e a eficácia das punições impostas aos combatentes. No entanto, aquilo que se sabe é que as forças militares que sofreram um maior número relativo ou absoluto de punições de militares em resultado, por exemplo, de deserções ou motins, não foram aqueles que maior ou melhor moral apresentaram na frente de batalha ou na retaguarda.

 

 
A doutrinação ideológica, tal como solidariedade entre combatentes organizados em pequenas unidades militares (pelotão, companhia ou mesmo batalhão, no caso da infantaria), não explica por si só as razões pelas quais alguns exércitos possuem e conseguem preservar um elevado moral ou espírito de combate.

 

 

Resta, portanto, um quarto elemento explicativo da menor ou maior capacidade que um militar, ou um corpo de militares, apresenta para enfrentar as provações criadas pela guerra, sobretudo nos mementos em que o contacto com o inimigo acontece, aconteceu ou é iminente.

 

 

A determinação de lutar e a capacidade de criar e preservar combatentes com um moral elevado decorre, fundamentalmente, da qualidade do treino, ou da formação militar, recebido antes, durante e após a presença dos militares na frente, seja qual for a natureza desta.

 

 
E porquê? Porque o treino militar contraria, em primeiro lugar, um dos aspectos que mais contribui para a erosão do moral: a rotina excessiva, para não dizer a monotonia. Depois distingue o militar do civil, gerando orgulho profissional e/ou corporativo. Em terceiro lugar porque cria coesão numa unidade (i.e., o chamado “espírito de corpo”). Em quarto lugar, bom treino militar e treino militar bem calibrado garantem que praças, sargentos e oficiais assimilam melhor o pensamento táctico, facto que tende a tornar instintiva a sua aplicação.

 

O moral das tropas em África4

 
Por fim, o treino permite ainda que os militares enfrentem com maiores possibilidades de sucesso, ao ponto de as ultrapassarem, os desafios e as dificuldades decorrentes da introdução de tecnologias inovadoras. Isto significa que a importância do treino militar é fundamentalmente psicológica, porque geradora de processos que criam não apenas rotinas mas, também, a autoconfiança necessária para, por exemplo, enfrentar com êxito o factor surpresa que é, de longe, o maior factor destruição da coesão colectiva e do espírito de combate.

 

 
A narrativa da acção militar com que se deu início a este texto demonstra claramente ser razoável, ainda que não o ideal, o estado de espírito, ou o moral, dos militares portugueses que em Buela enfrentaram com êxito a acção militar levada a cabo pela UPA/FNLA num fim de tarde após a conclusão de um jogo de futebol entre os militares destacados naquele aquartelamento.

 

 

Noutras passagens das suas memórias relativas aos anos que passou em Angola, César Oliveira relata a excessiva monotonia do quotidiano dos militares destacados no extremo norte daquela “província”, da mesma forma que dá conta da inexistência de outros confrontos com forças inimigas.

 

 

Nomeadamente, o factor surpresa, mesmo descontando a debilidade relativa, do ponto de vista militar, dos atacantes, não impediu uma reacção pronta e eficaz. E tal foi possível graças ao treino militar recebido durante a recruta e à rotina de treino adoptada em Buela.

 

 
É verdade que noutras passagens das suas memórias relativas aos anos que passou em Angola, César Oliveira relata a excessiva monotonia do quotidiano dos militares destacados no extremo norte daquela “província”, da mesma forma que dá conta da inexistência de outros confrontos com forças inimigas. Também refere a sua oposição, como de alguns outros oficiais, às escolhas políticas e ao discurso ideológico que sustentavam a bondade e a legitimidade da guerra em curso desde 1961, e não se exime de dar conta dos expedientes que abundantemente usou para escapar aos seus deveres militares em Buela. Nomeadamente encontrando pretextos relativos ao seu alegadamente deficiente estado de saúde, facto que lhe permitia descolar-se a Luanda e lá permanecer muito mais vezes e durante muito mais tempo do que seria normal.

 

 
Até ao momento em que o regime nascido em 1933 foi derrubado na sequência de um golpe militar a 25 de Abril de 1974, o moral das Forças Armadas portuguesas mantinha-se em níveis aceitáveis que permitiam considerar realista a continuação do esforço militar nas colónias por mais alguns anos.

 

 
Sucede, no entanto, que este aparente, ou real desleixo, é um procedimento normal nos conflitos militares, por ser uma forma de preservação de equilíbrios essenciais ao funcionamento, por exemplo, de uma unidade militar (o chamado “live and let live system” existente em todas as Forças Armadas).

 

 

A “MORAL” DAS “TROPAS” OU PORQUE (NUNCA) ESTIVERAM AS FORÇAS ARMADAS PORTUGUESAS À BEIRA DE UMA DERROTA MILITAR…

 

 

Se extrapolarmos a experiência de um oficial miliciano tal como a relatada por César Oliveira e a cruzarmos depois com as considerações mais teóricas – independentemente das respectivas bases de sustentação empírica – sobre o que é o moral dos militares e como se consegue obtê-lo e preservá-lo, parece óbvio que até ao momento em que o regime nascido em 1933 foi derrubado na sequência de um golpe militar a 25 de Abril de 1974, o moral das Forças Armadas portuguesas mantinha-se em níveis aceitáveis que permitiam considerar realista a continuação do esforço militar nas colónias por mais alguns anos.

 

O moral das tropas em África5

 

É verdade, no entanto, que o moral tropas era superior nas chamadas forças especiais do que no exército regular e entre as tropas recrutadas em África do que nas oriundas da metrópole (de qualquer modo na Primavera de 1974 era cada vez menor o número de militares mobilizados e colocados na frente oriundos do Portugal metropolitano, do mesmo que cabia cada vez mais às tropas especiais executarem a quase totalidade das operações militares de risco).

 

 
Apesar de a contestação político-ideológica à guerra parecer estar a crescer, os dados sobre o número de “desertores”, de “faltosos”, de auto-mutiliações ou de “motins” não eram alarmantes

 

 
Sabemos muito pouco, e provavelmente nunca se saberá muito mais, sobre qual era o estado espírito dos homens que compunham as milícias civis recrutadas e treinadas localmente. Mas sabemos, por exemplo, que apesar de a contestação político-ideológica à guerra parecer estar a crescer, restando apenas saber se essa contestação poderia ser travada e até invertida, tanto em alguns sectores do Exército português como em alguns sectores da sociedade portuguesa nas colónias como na metrópole, a verdade é que os dados sobre o número de “desertores”, de “faltosos”, de auto-mutiliações ou de “motins” não eram alarmantes embora fossem sempre motivo de atenção e preocupação por parte dos serviços de informação e acção psicológica, tanto civis como militares.

 

 

Isto significa, portanto, que sendo o problema do “moral” e/ou do espírito de combate uma preocupação das chefias civis e militares, a verdade é que como consequência do treino militar ministrado, mais do que como resultado de qualquer outra variável, e olhando para os dados globais disponíveis em torno do grau de coesão das Forças Armadas, o seu moral podia ter sofrido alguma erosão, mas essa erosão não só podia ser revertida – embora nunca saberemos se o poderia ter sido ou não.

 

 

Só após o golpe que depôs o regime autoritário português é que se assistiu, ainda que não se saiba a que ritmo, ao descalabro do moral das Forças Armadas portuguesas.

 

 
Nesse sentido, só após o golpe que depôs o regime autoritário português é que se assistiu, ainda que não se saiba a que ritmo, ao descalabro do moral das Forças Armadas portuguesas. Ou seja, foram as mudanças políticas ocorridas após o 25 de Abril que destruíram o moral das Forças Armadas e as próprias Forças Armadas, e não uma crise profunda e generalizada nas Forças Armadas que conduziu ao derrube do poder político vigente até madrugada do dia 25 de Abril de 1974.

 

 

 

25/10/2014
Fernando Martins

 

 

 

 

Israel: Tempestade desenterra Duas Mil Moedas do Século X

Cerca de duas mil moedas datadas do século X foram descobertas por mergulhadores na costa mediterrânica de Israel, naquele que terá sido o maior tesouro alguma vez recuperado do local.

 

 

As moedas foram descobertas por acaso e, numa primeira fase, pensava-se que fossem brinquedos de criança atirados ao mar. Uma série de testes posteriores, porém, provaram a sua antiguidade e importância.

 
As moedas pesam nove quilos – todas juntas – e foram encontradas no porto antigo de Caesarea, que data da era dos romanos. “Numa primeira fase, pensou-se que fossem moedas de brincar, de um qualquer jogo. Só depois [os mergulhadores] perceberam que as moedas eram verdadeiras”, explicou Kobi Sharvit, director de arqueologia marinha da Autoridade das Antiguidades de Israel.

 
De acordo com a Autoridade das Antiguidades de Israel, as moedas foram desenterradas por uma tempestade e são agora da propriedade do estado israelita – os mergulhadores ficarão sem ver um cêntimo.

 
Ainda segundo a entidade, as moedas circularam no Califado de Fatímida, que governou grande parte do Médio Oriente e Norte de África entre 909 e 1171. “O barco [de onde as moedas se perderam] terá naufragado a caminho do Egipto, com os impostos que terão sido recolhidos”, concluiu Sharvit.

 
Uma outra teoria revela que o dinheiro pertencia a um barco mercante que fazia comércio com as cidades costeiras e o porto do Mar Mediterrâneo, e que ali afundou.

 

 

 

18/02/2015

 

SAPO

 

 

 

Quem é o Juiz Carlos Alexandre, o homem que deteve Ricardo Salgado?

Chamam-lhe “superjuiz”. E a razão é simples: neste País, não há grande processo de criminalidade económica e financeira que não lhe passe pelas mãos.

 

 

Nos últimos anos, os chamados crimes de “colarinho branco” que maior notoriedade pública registaram contam com as intervenções do juiz Carlos Alexandre.

 

 

É este o homem que, esta manhã, se responsabilizou por interrogar o antigo presidente do BES, no âmbito do processo conhecido por Monte Branco. As suspeitas sobre Ricardo Salgado dirão respeito, sobretudo, tal como avançou o Negócios, às transferências de 14 milhões de euros que o antigo banqueiro recebeu do construtor José Guilherme.

 

 

Como magistrado judicial responsável pelo Tribunal Central de Investigação Criminal, Carlos Alexandre trabalha a par e passo com o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) e o seu nome ficará associado a casos de grande impacto público, como o já referido Monte Branco, mas também as operações Furacão, Portucale, Face Oculta, BPN ou Remédio Santo.

 
ADMIRADO E ODIADO

 

No mundo da advocacia, há quem o admire, mas também quem o odeie. Se alguns dos actores da Justiça que lidam ou já lidaram com Carlos Alexandre lhe chamam “Mourinho da Justiça”, por causa da sua obstinação, há porém quem prefira, de forma pejorativa, designá-lo como o “Garzón português”, acusando-o de gostar de protagonismo.

 

 

O juiz espanhol Baltazar Garzón, conhecido mundialmente pelo arrojo em desafiar os mais poderosos, teve também a seu cargo a responsabilidade de conduzir processos relacionados com crimes de “colarinho branco”. Foi o caso da investigação das suspeitas de lavagem de dinheiro que penderam, na última década, sobre o grupo financeiro espanhol BBVA.

 

 

Afinal, no caso de Carlos Alexandre, foram as suas intervenções nos casos mais mediáticos de criminalidade económica e financeira as causas directas do seu protagonismo público. Ele que se iniciou no mundo do Direito e da Justiça depois de completar a licenciatura na Faculdade de Direito de Lisboa, onde se cruzou, por exemplo, com os socialistas António Costa e Eduardo Cabrita.

 

 

Passou depois pela Polícia Judiciária Militar, mas optou por seguir a carreira da magistratura judicial, tendo desempenhado funções, nomeadamente, nas varas mistas de Sintra. Chegou ao Tribunal Central de Investigação Criminal, o conhecido “Ticão”, em 2004. Era então titular a juíza Fátima Mata-Mouros. Dois anos depois passou a responsável máximo daquele tribunal.

 

 

CATÓLICO, SPORTINGUISTA, NATURAL DE MAÇÃO

 

 

Sportinguista assumido, Carlos Alexandre é também um católico devoto que gosta de regressar às origens. Participa sempre nas comemorações da Páscoa, em Mação, a localidade da Beira Baixa onde nasceu há 52 anos. Filho de um carteiro e de uma operária fabril, estudou na Telescola e nas férias chegou a ajudar o pai nas obras.

 

 

Pese embora o acusem de procurar protagonismo, a verdade é que foram raras as vezes em que se expôs na comunicação social. Indirectamente, através de um amigo e conterrâneo, o antigo assessor do Partido Socialista António Colaço, foi possível ver, há dois anos, no blogue Ânimo, Carlos Alexandre na celebração pascal de Mação. Mais do que o lado do devoto, ganharam força as afirmações do magistrado judicial, então transcritas no “Diário de Notícias”.

 

 

“No contexto de uma diligência que se procurava tomar contacto com documentação, foi-nos dito por uma pessoa com importância na praça que estava ali a mando de alguém para acompanhar aquele acto, porque quando o dinheiro falava, a verdade calava. Comigo a verdade falará sempre mais alto”, sentenciou o juiz.

 

 

O juiz Carlos Alexandre foi o 48º Mais Poderoso do ‘ranking’ do Negócios em 2013. Leia aqui o que se escreveu sobre e conheça a sua rede de amigos e inimigos.

 

 

 

24/07/2014

João Maltez

 

 

 

 

Liga Árabe sublinha ‘necessidade urgente’ de força militar árabe contra terroristas

Nabil al-Arabi necessitava de força militar para combater terrorismo, conforme disse na reunião com os ministros dos Negócios Estrangeiros dos países-membros da Liga Árabe.

 
O secretário-geral da Liga Árabe, Nabil al-Arabi, sublinhou existir “uma necessidade urgente de uma força militar árabe” para combater “os grupos terroristas”.

 
Al-Arabi falava durante a reunião extraordinária dos ministros dos Negócios Estrangeiros dos países-membros da Liga Árabe, na sede da organização no Cairo.

 
A 03 de março, o secretário-geral adjunto tinha anunciado que a criação de uma força militar árabe ia ser avaliada durante a cimeira anual da Liga, prevista a 28 e 29 de março em Charm el-Cheikh, estância balnear egípcia no mar Vermelho.

 
O presidente do Egito, Abdel Fattah al-Sissi, apelou recentemente para a criação desta “força árabe comum”, numa altura em que os combatentes do movimento extremista Estado Islâmico (EI) alargaram a influência à Líbia e multiplicam as suas ações violentas no Iraque e na Síria.

 
“Existe uma necessidade urgente de uma força militar árabe comum, que seja multifuncional (…) capaz de intervir rapidamente na luta contra o terrorismo e atividades terroristas, ou de ajudar em operações de manutenção da paz”, afirmou Al-Arabi.

 
O líder da organização pan-árabe sublinhou também a importância da “cooperação nos domínios ligados à proteção da segurança e troca de informações entre países árabes”.

 
No final de fevereiro, o presidente Sissi indicou, numa entrevista à cadeia Al-Arabiya, que a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos, o Kuwait e a Jordânia podiam participar em tal iniciativa.

 
O Egito realizou em 16 de fevereiro ataques aéreos na Líbia contra posições do EI, que tinha decapitado 12 cristãos, maioritariamente egípcios.

 
O governo egípcio exigiu, em seguida, uma intervenção militar internacional na Líbia, mas este apelo foi recebido com algumas reservas pelas potências ocidentais.

 

 

 

09/03/2015 – Agência LUSA
FOTO: JULIEN WARNAND/EPA

 

 

 

 

Dos relógios às lentes de contacto. Dentro de 10 a 15 anos, a Internet vai estar em todo o lado

Michio Kaku é professor de Física Teórica e coautor da Teoria das Cordas.

 

 

O Físico Michio Kaku disse que dentro de 10 a 15 anos a internet vai estar em todo o lado e que os cidadãos vão “piscar os olhos e ter o infinito conhecimento” do que estão a comprar.

 
O físico e futurista norte-americano, Michio Kaku, considerou, em entrevista à agência Lusa, que dentro de 10 a 15 anos a Internet vai estar em todo o lado, desde os relógios de pulso até às lentes de contacto.

 
A nona conferência QSP Summit, que se realiza a 12 de março na Exponor, Matosinhos, vai contar este ano com a participação do físico Michio Kaku, que estará pela primeira vez em Portugal, numa edição dedicada ao tema “The Future Trends”.

 
Kaku, que é professor de Física Teórica, coautor da Teoria das Cordas e com uma vasta obra publicada, onde se inclui “Mundos Paralelos” ou mais recentemente “O Futuro da Mente”, irá abordar na conferência o tema do consumidor do futuro. “Quando formos às compras, a Internet estará em todo o lugar, incluindo nas nossas lentes de contacto”, disse.

 
“Iremos piscar os olhos e teremos o infinito conhecimento do que estamos a comprar, saberemos qual é a margem de lucro do que estamos a adquirir, qual o melhor preço”, adiantou, acrescentando que este futuro não está muito distante.

 
“Atualmente já temos Internet nos nossos óculos, dentro de 10, 15 anos, a Internet vai estar em todo o lado, incluindo nos nossos relógios de pulso, lentes de contacto” e até mesmo num papel de parede inteligente, “onde poderemos aceder aos computadores” aceder a um médico através da inteligência artificial “quase de borla”.

 
“É nisto que os cientistas estão a trabalhar agora: no conhecimento infinito em qualquer lado, a qualquer hora”, explicou. No futuro, adiantou, através de umas lentes de contacto as pessoas poderão obter informação sobre tudo sobre os produtos que querem comprar, sem serem enganadas, e a isso chama-se “capitalismo perfeito”.

 
O capitalismo assenta na oferta e na procura, “mas é imperfeito, as pessoas não sabem quem as engana, quem tem os produtos mais baratos”, mas no futuro, através de um simples ‘scann’ das lentes, essa informação estará disponível a todos os consumidores, disse.

 
Isso permitirá ainda identificar as pessoas com quem fala ou comunicar em qualquer língua, já através de umas lentes de contacto as pessoas terão acesso à biografia do interlocutor ou a um tradutor instantâneo. Na conferência, Kaku também fará uma palestra sobre o livro “O Futuro da Mente”.

 
Questionado sobre de onde partiu a sua inspiração para este tema, o físico norte-americano explicou: “Nós, os físicos, somos pessoas curiosas e sempre fomos curiosos pela mente, porque faz observações, experiências”.

 
E atualmente, “temos máquinas de ressonância magnética suficientemente sensíveis que conseguem captar pensamentos dentro de um cérebro ativo”, prosseguiu, o que poderá permitir, no futuro, tirar uma fotografia aos nossos sonhos.

 
“As primeiras fotografias de sonhos estão a ser feitas pelos cientistas, pelo que no futuro, será possível acordar, carregar no botão e ver os sonhos que teve na noite anterior”, mas ainda levará tempo, disse.

 
Questionado sobre se um dia será possível aos cientistas descodificar a mente humana, Michio Kaku lembrou que atualmente estão a ser estudas duas coisas: o mapa do corpo, de todos os genes, e o mapa do cérebro.

 
O próximo grande “‘crash program’ [uma aposta intensiva] da ciência”, envolvendo muitos milhões de dólares, será o “mapeamento do cérebro”, acrescentou.

 
Por um lado, os políticos querem uma cura para as doenças mentais, por outro os cientistas são curiosos e querem saber o que nos faz pensar, daí a aposta nesta área, explicou Michio Kaku.

 
Os resultados destas investigações terão “aplicações comerciais e a primeira memória de um animal foi gravada no ano passado. Sabemos agora que podemos gravar memórias e transferi-las [como se fosse um ficheiro]”, disse.

 
“E isso vai ser muito útil para os pacientes com a doença de Alzheimer, muito em breve vamos ter milhões de pessoas a sofrer de Alzheimer e vamos ter a capacidade” de ter a informação das suas memórias armazenada, numa espécie de ‘pacemaker’ do cérebro, em que as pessoas “podem carregar num botão e, bingo, ficam a saber quem são e onde vivem”, explicou.

 
“E talvez um dia, os estudantes possam carregar num botão e aprendam matemática”, exclamou.

 
Atualmente, é possível gravar memórias de ratos, mas os cientistas já estão a experimentar em primatas. O passo seguinte são os doentes com Alzheimer. As inscrições para o QSP Summit, onde Michio Kaku participa, já estão esgotadas, de acordo com a organização.

 

 

07/03/2015 – Agência LUSA

 

FOTO: JORGE ZAPATA/EPA