O PSD apela a que o António Costa venha dar explicações sobre o caso das viagens pagas pela Galp a três secretários de Estado, no qual o Governo considera não existirem incompatibilidades. “O primeiro-ministro não pode continuar em férias, dizendo que nada dirá”, disse esta sexta-feira o deputado do PSD Fernando Negrão, em conferência de imprensa. “Fazemos um apelo ao primeiro-ministro para que dê explicações aos portugueses.”
O deputado considera que em causa está “uma questão de “ética na governação” e que “uma explicação é fundamental”. “Os portugueses vão perdendo confiança no sistema político”, afirmou, defendendo a necessidade de “resolver as questões éticas até às últimas consequências”.
“O primeiro-ministro tem responsabilidades muito especiais nesta área. Estamos a falar de ética na governação e as responsabilidades primeiras são do primeiro-ministro”, apontou.
O deputado disse ainda que António Costa não pode continuar “em silêncio” e remeter a reação para Augusto Santos Silva, primeiro-ministro em funções, que esta quinta-feira deu este assunto como encerrado, anunciando um código de conduta a aprovar em Conselho de Ministros antes de setembro.
Questionado pelos jornalistas sobre a razão de o PSD não pedir a demissão dos três secretários de Estado, à semelhança do que fez o CDS, Fernando Negrão diz que essa é uma “responsabilidade exclusiva do primeiro-ministro.” “A nomeação dos membros do Governo cabe ao primeiro-ministro e a responsabilidade de uma eventual manutenção no cargo também.”
O deputado social-democrata foi ainda confrontado com a questão de haver deputados do PSD que se deslocaram para ver os jogos em França, segundo uma notícia do “Observador” na quinta-feira. “Temos acompanhado a situação”, respondeu.
Negrão disse que nem ele nem os partidos “são polícias dos deputados”. “Cada um assumirá as responsabilidades perante os eleitores. Não faço ideia de quantos são.” O social-democrata reforça, no entanto, que a situação mais grave não é essa, mas a dos membros do Governo porque “são eles que têm o poder executivo, há uma exigência particular”.
Quanto aos partidos da esquerda, Negrão deixa críticas. “É preciso perguntar ao PCP e ao Bloco de Esquerda o que é aconteceu às bandeiras erguidas sobre promiscuidade entre o grande capital e o poder político. Deixaram cair a bandeira?”.
Ética e corrupção
“A questão ética subsiste”, insiste Fernando Negrão, depois de o Governo ter considerado o caso encerrado. “Estes três secretários de Estado ficam inibidos de ter qualquer tipo de relacionamento com a Galp. Como é que isso é possível?”, questiona, lembrando que têm áreas estratégicas ligadas à empresa, designadamente os Assuntos Fiscais (Rocha Andrade), a Indústria (João Vasconcelos) e a Internacionalização (Jorge Oliveira).
Em particular no caso dos Assuntos Fiscais, o assunto tomou proporções maiores tendo em conta que a Galp é uma empresa à qual o Estado reclama mais de 100 milhões de euros em dívida fiscal.
Embora acredite que “aceitar um convite destes não pressupõe corrupção” e queira acreditar que “foi de boa-fé”, Fernando Negrão considera que “a corrupção é exercida de forma muito sofisticada”. E conclui: “Não descansaremos enquanto a questão não for esclarecida”.
CDS quer ouvir Governo no Parlamento e acusa Costa de se esconder
A presidente do CDS anunciou esta tarde um pedido na comissão permanente do Parlamento para esclarecimentos do Governo sobre as viagens de membros do Executivo pagas pela Galp, acusando o primeiro-ministro socialista de se esconder.
“O CDS pensa que a atitude do primeiro-ministro, até agora, é inadmissível. Não se pode esconder, não dizendo nada, o que significa que se tornou conivente com esta situação. Ficámos a saber que o primeiro-ministro acha que tudo se resolve devolvendo o dinheiro”, afirmou Assunção Cristas, nos Passos Perdidos da Assembleia da República.
A líder centrista garantiu não existirem deputados democratas-cristãos envolvidos e que a própria nunca recebeu convites semelhantes enquanto ministra da Agricultura, criticando a iniciativa do Executivo de criar um código de conduta para membros do Governo e altos funcionários do Estado porque o próprio PS já tem em marcha, na Assembleia da República, um diploma visando a transparência nos cargos públicos, além do código vigente para funcionários do Fisco.
“Para o CDS, o tema das viagens da Galp não está resolvido, não é um assunto encerrado. Entendemos que é um assunto grave, escandaloso. Quando o Governo vem dizer que tudo se resolve com a devolução do dinheiro está a passar um atestado de menoridade a todos e cada um dos portugueses”, frisou, reiterando a necessidade da demissão daqueles governantes.
O ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros Augusto Santos Silva, que lidera o elenco socialista nas férias do primeiro-ministro, considerou esta quinta-feira que o caso “fica encerrado” com o reembolso das despesas efetuadas àquele patrocinador oficial da seleção portuguesa de futebol.
Os secretários de Estado em causa são dos Assuntos Fiscais, Fernando Rocha Andrade, da Indústria, João Vasconcelos, e da Internacionalização, Jorge Costa Oliveira, que assistiram a jogos da seleção nacional de futebol no Euro 2016 a convite da petrolífera portuguesa.
“Se a conduta é reprovável tem de ter consequências políticas, que só podem ser a demissão dos governantes em causa. Se não é reprovável, o Governo que o assuma e explique porque não entende que é reprovável”, aponta Assunção Cristas.
A deputada do CDS ironiza ainda sobre os partidos que apoiam no Parlamento os socialistas, afirmando que “aquilo que certamente os amigos do Governo, PCP e BE, diriam noutras circunstâncias é que este Governo é muito forte com os fracos e muito fraco com os fortes”.
“Ao mesmo tempo que vemos esta proximidade com uma empresa que tem um contencioso de 100 milhões de euros com o Fisco, vemos anúncios de que os fiscais vão estar nas praias atrás de vendedores de bolas de berlim e gelados. Vemos muitas famílias à espera do reembolso do IRS que continua a não chegar às contas bancárias e o mesmo secretário de Estado anunciar que vai aumentar um imposto que atinge toda a classe média, o IMI”, condenou.
Na véspera, o ministro dos Negócios Estrangeiros declarou que os secretários de Estado visados “têm todas as condições” para permanecer nos cargos, acrescentando ter-se tratado de “uma iniciativa de mobilização de apoio público à seleção nacional de futebol no Europeu de 2016”, “que não é primeira vez que se sucede”.
TPT com: AFP//Lusa//JN//Raquel Albuquerque//Tiago Miranda//Expresso//5 de Agosto de 2016